07 janeiro, 2007

Diário (cont3)

Sempre a paisagem magnífica, grande mas não desproporcionada, uma cor de amarelo queimado em tudo…
"E agora a casa…".
Passamos pela entrada principal mas ele achou melhor irmos pela entrada de serviço. Começamos a subir e por entre a vegetação comecei a descortinar planos vários de paredes e de coberturas lá em cima.
Os avisos sucediam-se:
"no visitors… no trespassing… no hunting… closed until May…"
Entramos num páteo de serviço, onde estavam vários automóveis.
Saí, vi e fiz umas fotografias, mas não tive coragem de avançar.
Senti que já tinha compreendido Taliesin e estava emocionalmente extenuado.
Sentei-me no carro e disse ao homem:
"é melhor não abusar".
Cá em baixo a água corria, no topo de um muro por grandes tubos de grés colocados em fiada…Eu estava realmente extenuado.
Vimos mais uma "farm" de Mr. Wright, despedi-me de tudo aquilo e voltamos para a aldeia. O homem tinha tomado conta de mim à meia-hora e deixou-me exactamente duas horas depois.
Quando me deixou eu estava longe de mim e longe de tudo.
Resolvi sair da aldeia e avançar pelo campo.
Tomei uma estrada poeirenta onde passava de vez em quando um carro.
Então chorei como uma criança… Taliesin não me saia (nem me sairá) dos olhos; até a cor do pó da estrada me lembrava Taliesin. Avancei pela estrada não sei até onde. Não podia pensar concretamente. Qualquer coisa se apoderara de mim. Sentei-me algures. Descansei.
Lágrimas várias: Notre Dame, Chartres, Cordova, Capela de Miguel Ângelo, - "olhos que nunca se molham mas vêm quando olham…" (Afº. Lopes Vieira).
Tinha razão o poeta:
"olhos que nunca se molham não vêm quando olham".
Naquelas duas horas eu tinha sofrido, estou certo, um dos maiores choques, talvez o maior da minha vida de arquitecto.
Taliesin, disse já, é mais do que um edifício, uma paisagem; mas acrescento agora, Taliesin é também uma vida e uma filosofia. Eu compreendi Wright e o seu chapéu, compreendi as suas formas e o seu amor à terra, o seu pensamento e o sentido das suas coisas… .
E ao sentir toda aquela vida de criação, tomei também contacto com outra realidade: a da morte do Homem no lugar do seu sonho.
Porque exactamente Taliesin impressionou-me pelo que possue de total, de cósmico, pelo que existe ali para além da pedra, da madeira, deste ou daquele requinte da forma.
Tudo se esquece ali de acidental da vida de Wright: os seus caprichos formalistas, a sua vaidade, o custo das suas obras, os seus automóveis, as suas pequenas coisas do dia a dia; tudo esquece a quem vir Taliesin como eu tive a oportunidade de ver e Taliesin aparece então com a força de uma rocha, a beleza de uma flor ou a calma de um lago.
Taliesin além de me fazer chorar durante as primeiras reacções obrigou-me a pensar muito. Um dia ouvi o Sr. Giedion dizer com um sorriso, a propósito da "famigerada" integração das artes, que "Mr. Wright afirma não existir para ele tal problema porque ele é pintor, escultor e arquitecto". Estou convencido que a integração das artes pela qual a entendem os funcionalistas é coisa estúpida (O Harvard Graduete´s Center é mais uma prova evidente) e estou convencidissimo de que Wright resolveu o problema como foi resolvido aliás nos velhos tempos, onde começa a arquitectura e acaba a escultura ou a pintura nos edifícos de Wright?

2 comentários:

Pena disse...

O meu forte não é arquitectura, apesar de ligado aos encantos das Artes, quando me surpreendem com a sua magestosa beleza. Taliesin existe verdadeiramente? Ou existe, apenas na tua prodigiosa mente criativa e pensadora?
"...onde começa a arquitectura e acaba a escultura ou a pintura nos edifícios de Wright." Confesso que tento situar-me a muito custo nesta linguagem que não me é estranha, mas profundamente significativa à fantasia dos talentos e, quem sabe dos génios incompreendidos. Não sou nada disto, mas tu resolveste escrever sobre ele(s), serás...????? Torna-se imperioso e urgente que te revejas a ti própria? Eu tenho uma opinião...
Wright seria...?
Quando achares oportuno, clarifica-me, por favor. Tenho imensas questões a pôr-te sobre este enigmático lugar e enigmático criador da Arte, Mr. Wright, sem esquecer as "Farms" que deveriam ser de fascínio e maravilha e que não constavam dos meus parcos conhecimentos artísticos ou de concepção artística, colocando-me imensamente curioso e atento.
Fico na expectativa.

Pena disse...

O meu forte não é arquitectura, apesar de ligado aos encantos das Artes, quando me surpreendem com a sua magestosa beleza. Taliesin existe verdadeiramente? Ou existe, apenas na tua prodigiosa mente criativa e pensadora?
"...onde começa a arquitectura e acaba a escultura ou a pintura nos edifícios de Wright." Confesso que tento situar-me a muito custo nesta linguagem que não me é estranha, mas profundamente significativa à fantasia dos talentos e, quem sabe dos génios incompreendidos. Não sou nada disto, mas tu resolveste escrever sobre ele(s), serás...????? Torna-se imperioso e urgente que te revejas a ti própria? Eu tenho uma opinião...
Wright seria...?
Quando achares oportuno, clarifica-me, por favor. Tenho imensas questões a pôr-te sobre este enigmático lugar e enigmático criador da Arte, Mr. Wright, sem esquecer as "Farms" que deveriam ser de fascínio e maravilha e que não constavam dos meus parcos conhecimentos artísticos ou de concepção artística, colocando-me imensamente curioso e atento.
Fico na expectativa.