28 julho, 2021

LIVRO DAS FREGUESIAS

 


LIVRO DAS FREGUESIAS

          Passo pelo escritório do jornal para adquirir o livro das freguesias e deparo-me com um grande calhamaço, que o distinto Dr. Ribeiro Aires concebeu.

          Grande Livro penso eu, com letras maiúsculas.

          Por coincidência, enquanto pago o livro, o autor fala ao telemóvel com uma colaboradora do jornal, que lhe diz quem está com ela. Do telemóvel oiço a voz do meu amigo, dizendo que colocou lá uma foto minha.

          - Ui, espero que seja com cara de sábado, porque a de segunda-feira não presta. Respondi sorrindo.

          Saio do Pioledo e subo a avenida D. Dinis, que me presentei-a sempre com boas recordações do nª 18. Vou com o livro pesado numa das mãos tentando equilibrar a minha artrose da anca e sinto as sapatilhas a colarem-se ao chão.

          Penso nas brincadeiras que vivi no nº 18, penso de novo nas freguesias, as sapatilhas continuam a colar-se ao chão... ainda me vejo em criança no Largo que vem a seguir, ao qual eu chamava Largo do Diogo do Cão. Um largo moderno, sobre o qual nem todos os cidadãos entendem a sua assimetria, porque rompe com as regras tradicionais herdadas do urbanismo renascentista. Gosto desse largo e considero que lhe falta apenas uma pequena intervenção para reforçar a sua identidade. Tenho uma, na ideia.  

          .... continuam a colar-se, tento ver se pisei alguma pastilha elástica, confirmo que as sapatilhas não são as que comprei no chinês, ... recordo quando ia para junto da Escola Industrial ver as corridas dos cavalos na festa de Santo António. Nhac, nhac, fazem as sapatilhas.

.... nhac, nhac, nhac, nhac, não é pastilha elástica, mas é a exsudação das árvores (hoje estou a falar bonito!) composta de uma goma, que se deposita no chão, tornando-o brilhante e bom para caçar a mosquitada. Nhac, Nhac,. Nhac, Nhac, isto é o som da senhora Quelhas a subir a avenida, nhac, nhac, já imaginando que irei entrar no carro e as sapatilhas se colarão aos pedais, nhac, nhac. Sinto-me capaz de converter-me numa super-heroína e saltar para a parede, tipo Mulher-Mosca, a prima do Homem-Aranha.

          Nhac, nhac, sim, voltando ao livro das freguesias, grande trabalho de atualização, feito com rigor e critério, explicados logo no início. É o livro que obrigatoriamente estará sempre por perto, para consulta, para confirmação de dados e para fundamentar e referenciar em muitos outros livros.  Gostei do Pare! é impossível não referir Miguel Torga, e como é impossível, o melhor é abraçar com toda a força esta ideia de Reino Maravilhoso.

          Passo a citar uma expressão a propósito, inserida num relato da vida de Cícero:

          À mulher de César não basta ser honesta, deve parecê-lo (Vidas Paralelas de Plutarco). Não nos basta ser Reino Maravilhoso, é urgente parecê-lo. Chegou a hora, de aproveitar esta onda cultural que caracteriza o século XXI, a euforia da saída do confinamento, associando todas as potencialidades do mundo digital, e de facto parecê-lo. Tanta coisa que há a fazer, porém, está tudo neste livro!

Publicado em NVR 28/077/2021

21 julho, 2021

FUGIR A SALTO

Fugir a salto

O Estado Novo sempre condicionou a emigração, primeiro para evitar a saída de mão-de-obra e mais tarde para impedir a redução do número de soldados, necessários para a guerra nas colónias. Acabou o Estado Novo e a guerra, mas a história de Portugal é uma história feita de partidas e de regressos e eles continuam a partir, por vezes são os próprios governantes que aconselham...

 

              Hoje os mais jovens ignoram completamente o que era isto de ir a salto para outro país. Há dias vi-me na necessidade de explicar isto muito rapidamente a dois alunos.

              O que seria isto de fugir a SALTO?

              A fuga para França na década de 60, devia-se à obrigatoriedade de fazer serviço militar, com grande probabilidade de ir para a guerra nas ex-colónias ou para procurar uma vida melhor.

              Essas fugas denominadas por emigração clandestina ou a “salto” envolveram milhares de portugueses e nem sempre terminaram bem. Assunto proibido até ao 25 de Abril e agora passados quase 60 anos, parece algo surreal para os mais jovens, que nem sabem o que é uma fronteira e muito menos a dificuldade em sair de um país com as “portas fechadas”. Perguntaram-me se iam de avião, de comboio ou de carro e ficaram absolutamente surpresos quando lhes expliquei que iam a pé, por caminhos escondidos para não serem bloqueados pelos guardas fronteiriços. Quem fosse apanhado ia preso e quem fugisse, alvejado. 

              - E eles sabiam o caminho? Iam pelo GPS?

              - Claro que não, seguiam vagas indicações daqueles que já o tinham feito ou daqueles que conheciam os trilhos e forneciam informações se lhe pagassem, os passadores.

              Fugia-se à miséria rural e urbana, fugia-se à probabilidade de morrer na guerra colonial, fugia-se à fome, fugia-se por incapacidade de matar sem saber porquê.

              A maioria era formada por homens, mas também fugiam mulheres e crianças, umas ao colo e outras pelo seu pé, pisando neve e gelo, atravessando rios, enfrentando ventos e tempestades. Muitos eram analfabetos e pouco experientes, desconheciam a língua francesa, tendo muitos problemas de integração e outros eram enganados na travessia da fronteira e de Espanha. Alguns, desapareceram, nunca chegando ao destino, não se sabe quantos. Muitos passaram fome, pouco dormiam e quando dormiam era ao relento, sempre alerta para não serem apanhados. Juntavam 10 ou 20 contos para pagar aos passadores que orientavam o salto da fronteira e não sobrava mais nada.[i] Outros até pediam dinheiro a algum familiar.

              Levavam uma trouxa ou uma pequena mala e caminhavam durante dias ao frio e à chuva, muitos dizem que foram 5 dias, utilizando o comboio, outros 30 dias, outros dizem 45, dependia da sorte e da rota que tomavam, estes últimos sempre a pé.

              Existem relatos impressionantes.

              - Fomos numa carrinha, escondidos atrás de fardos de palha, dormíamos em palheiros agrícolas, só andávamos de noite... demorámos 12 dias a chegar a Paris

              - Eu fui com os meus pais, tinha seis anos, o meu pai levava a minha irmã de dois anos ao colo e a minha mãe levava o meu irmão na barriga. Ainda hoje sinto a água gelada a travessar o rio, e depois ficar com as botas e as meias molhadas. A minha mãe chorava, queria voltar.

              - Atiraram sobre nós, em Portugal governava o Salazar e em Espanha governava o Franco, ninguém podia sair, porém, conseguimos passar para o lado da França e aí fomos ajudados pelos franceses.

              Há pessoas que foram detidas em Espanha e entregues à polícia portuguesa.

              Por vezes a humildade e a vergonha impedem que estas estórias sejam públicas. Preferem recordar o sucesso em vez das dificuldades, esquecendo-se de que os seus testemunhos de heróis resilientes são necessários para informar e esclarecer as novas gerações, que pensam que tudo se resolve de carro, de avião e de uber, com vouchers comprados na web.

              Deixar tudo para trás e ir ao desconhecido para salvar os que ficaram, converte-os em heróis ensinando-nos a ser menos críticos e mais solidários em relação aos refugiados que apenas tentam sobreviver.



[i] Naquela época ganhava-se 7 escudos por um dia de trabalho.

Publicado em NVR em 21/07/2021

TENHO PREGUIÇA


 

17 julho, 2021

AUTO


BIENAL DE ARTE DE GAIA

JULHO 2021

16 julho, 2021

PARABÉNS, DOUTOR

 PARABÉNS, DOUTOR      


            Na quinta-feira passada tive o prazer de assistir à apresentação de mais um livro do meu estimado amigo Caseiro Marques. Ainda não li o livro, apenas apreciei a capa.

            - Gostei da capa, Teresa. Está muito bem, comentei com a sua companheira, enquanto ele assinava o seu livro para me oferecer.

            - É uma gravura que ele tinha no escritório. Esteve lá sempre. Não se lembra?

            Rebobinei a memória e de facto lembro-me dessa imagem pendurada no seu escritório localizado na Travessa da Portela, a imagem da Justiça personificada pela mulher a levantar a balança. Explicando isto melhor, pensava eu que seria a imagem da deusa grega Thémis  filha do Céu e da Terra, esposa de Zeus, o deus supremo, criadora de leis que organizavam os homens e guardiã dos juramentos dos mesmos. Mas afinal confirmando detalhes, agora em casa, descubro que quando a figura feminina tem os olhos vendados, representa a deusa romana Justitia. A venda nos olhos não significa que a justiça seja cega, mas que trata todos de igual forma.

            Quero registar aqui o meu apreço pela sua postura perante a vida. A sua avontade de escrever e partilhar o que escreve, revel o seu lado erudito e simultaneamente altruísta. E ele escreve. E agora que tem tempo, ainda escreve mais. A sua vida provavelmente ainda faz mais sentido, porque nos revela o que é, o que sente e o que o afecta. Ele não espera que a vida aconteça, ela faz acontecer.

            Conheço o Dr. Caseiro Marques há muito tempo, não como advogado, porque felizmente não precisei, mas temos cultivado uma bela amizade. Somos muito diferentes, mas temos desenhado convergências que nos aproximam, e uma delas é a escrita, para além das beldroegas que me oferece todos os anos e de que ambos gostamos de juntar à sopa.

            Foi ele que me convidou para escrever neste jornal, convertendo um passatempo num exercício regular, disciplinado e em liberdade, que muito me tem ajudado a evoluir no mundo da escrita.

            Politicamente não somos próximos, evito o assunto, mas após de ponderados os assuntos mais importantes da vida, descubro que ambos somos humanistas, apesar de ele acreditar em Deus e eu ainda não acreditar. Respeito o seu lado e ele respeita o meu.

            Tem sentido de humor, não é homem cinzento, gosto do seu apego a Carapito, é inteligente e astuto, gosta de rir, tem orgulho em ser fuzileiro e aprecio o seu encantamento genuíno pelo seu neto Francisco. Organiza uns passeios culturais entre gente próxima, de uma comunidade semi-rural, tendo-me permitido participar e com quem tenho aprendido e conhecido pessoas simples e sãs, como eu gosto.

            Tenho em memória uma bela visita a Aranjuez, à Corunha, a Segóvia e já saboreamos ao final dum dia quente madrileno, na Plaza Maior uns simples huevos com jamón, deliciosos.

            - O que é isso que vai pedir?

            - Ovos com presunto e batatas fritas.

            - E isso é bom?

            - Vai-me saber pela vida, a melhor ementa do mundo...

            Na quinta-feira no final da sessão, vira-se para mim e uma amiga comum, lembrando-se de uma pequena viagem que fizemos no sábado anterior para visitar a casa de Júlio Dinis...

            - Vós sois umas andarilhas, na próxima vez também quero ir convosco. Já disse à minha mulher. Convosco, ela deixa-me ir.

            Parabéns, doutor, continue assim.

Publicado em NVR, 14/07/2021

11 julho, 2021

LABIRINTO DA CASA DA PRELADA

 


LABIRINTO DA CASA DA PRELADA

A casa da prelada situa-se na cidade do Porto e foi projetada pelo arquitecto italiano Nicolao Nasoni. O Jardim da casa possui um dos maiores labirintos da Península Ibérica. Este labirinto é o único existe na cidade, construído no século XVIII. O Traçado do labirinto faz-se através de bucho e percorre-lo é ter a noção do vazio e do cheio, da organização e do caos, a promessa e a ameaça e finalmente o lugar da recompensa, ou seja, no centro situa-se uma grande araucária-de-norfolk com 30m de altura.

Este labirinto é ornamental, fazendo parte da composição de uma grande jardim e também tem função lúdica, da descoberta, evocando o Labirinto de Creta.  AQ


10 julho, 2021

07 julho, 2021

REFLEXÃO VADIA

 

REFLEXÃO VADIA 

            Continuo enfastiada com o melodrama do ministro Cabrita, preocupada com o avanço da COVID, gosto de políticos independentes, veremos se irei continuar a apreciar Rui Moreira e sou fã métodos nitidamente intimidatórios do Juiz Carlos Alexandre... que querem, aprecio o estilo! Mas não me apetece escrever sobre isso.

            Na semana passada escrevi sobre esta mania recente das mulheres assumirem os seus cabelos brancos e agora vou escrever sobre os paradigmas masculinos, nesta reflexão vadia.

            Há muitos, muitos anos, um actor de cinema apareceu no ecrã para representar “Nove semanas e meia”. Usava uma barba mal feita de 3 dias. Actor despojado com estilo largadão, que fez suspirar as mulheres jovens. Homens novos, ficam bem com barba, sem barba, com bigode, com barba de 3 dias. O ar juvenil é que lhes confere alguma beleza. Este queria ir além disso, exteriorizando rebeldia com meia dúzia de pêlos a jogar à sueca sobre o seu rosto.

            A barba de 3 dias virou moda, não por parecer bem, mas, porque os homens são tremendamente preguiçosos e juntaram o útil ao supostamente agradável.

            45% dos homens preferem a barba por fazer – a preguiça soma e segue, sempre são 10 minutos que se poupam logo de manhã.

            Ao longo dos anos, a moda foi acertando a barba aos homens. Nas fotos antigas, os nossos bisavós aparecem com uma longa barba, símbolo de respeito e dignidade. Folheando os álbuns da família irão aparecer os homens de bigodinho fino ou estilo victoriano (os galãs, tipo Clark Gable), os homens de bigode revirado para cima ou guiador de bicicleta (bigode para vaidoso e excêntrico, tipo Salvador Dali), os barbudos dos anos 60 e 70 (os revolucionários, tipo Che), os bigodes farfalhudos, ou chevro, ou piaçaba (os pingamores canastrões, tipo Mastroianni), o bigode ferradura (para homens que nunca riem, tipo Charles Bronson), as super patilhas (suíça em forma de costeleta, tipo Ramalho Eanes,) o bigode âncora (com mosca, pêra e bigode, tipo Johnny Depp) e finalmente a barba da preguiça, que alguns acham muito charmosa - confessem a vossa ignorância sobre a arte pilosa facial!

            Uma barba de preguiça depois dos 50 anos, começa a branquear e envelhece. Há muitas décadas, um homem assim, nesse estado, só era possível e tolerável quando estava doente no hospital. Um homem de barba feita apresenta um ar muito mais jovem e saudável do que um barbudo.

            Diziam que beijar um homem sem bigode é como olhar para um jardim sem flores... Claro que isto é uma fake, uma teoria inventada por um homem com bigode.

            A empresa Gillette questionou várias mulheres e parece que as mulheres consideram os homens barbudos pouco atraentes ... claro que questionário de empresa que vende lâminas de barbear tinha que terminar assim, porém, há que considerar que toda a mulher gosta de um beijo bem dado, do tipo desentupidor de pia, ou seja, um beijo picante... mas, nunca confunda picante, com picante, ou seja, o picante fogoso, não quer dizer que de facto pica e arranha, provocando danos à cútis feminina. 

            A barba pode disfarçar a feiura e um bigode farfalhudo disfarça a cremalheira. Homens de corta palha exagerado, usem bigode!

            Uma barba pode ser o armazém dos restos da refeição, o microclima das bactérias, o habitat dos virús, o viveiro de ácaros e o paraíso dos fungos. É difícil realizar uma higienização adequada do rosto fora de casa e durante a rotina de trabalho, por isso em tempos COVID é fácil perceber que o corte e raspagem da barba é o mais indicado.

            A barba serve para disfarçar as rugas de expressão e as rugas da idade. Será que interessa esconder as rugas, se depois a calvice não engana e o perímetro do abdómen excede os 102 cm???

            A revista Super Interessante, na secção Ciência Maluca, refere que ter barba faz bem a saúde porque protege o portador de alergias e tosse e ainda é um protector solar. Os investigadores chegam à conclusão que o bigode serve como uma barreira de proteção contra as bactérias trazidas pela poeira, ou seja, faz um prolongamento dos pelos do interior do nariz, que tem a mesma função... lembrem-se disto antes de dar um chocho a um bigodudo!!!! Shlep!

            A Ciência Maluca assegura que, se a barba for longa e cobrir parte do pescoço, as inflamações na garganta podem durar menos tempo, porque a barba deixa a região mais aquecida. E eu acrescento que os cantores poderão evitar o cachecol para proteger as cordas vocais, se tiverem barba.

            NÃO SE ENTUSIASMEM!

            Um estudo europeu revela que a barba de um homem tem mais bactérias do que o pêlo de um cão que não toma banho diariamente.

Publicado em NVR - 07/07/2021

02 julho, 2021