28 maio, 2021

PROJECTO MOSE

 


Projecto Mose

              Veneza é Veneza e eu pretendo lá voltar, para conhecer com mais detalhe os pequenos canais e observar melhor, um pouco fora dos principais percursos turísticos, a vida dos venezianos.

              Ontem passou um programa na TV sobre o eterno problema de Veneza, denominado, subida das marés provocando inundações e obrigando os turistas a passear de galochas. Percebi que há um projecto de engenharia que tentar salvar Veneza da submersão, já que, desde 1987 afundou 30 cm, ou seja, mais de 1cm por ano.

              Curiosamente o projecto de engenharia denomina-se “Mose”, associando-o a um protagonista religioso do Velho Testamento, chamado Moisés. Dizem que o profeta dividiu a água do Mar Vermelho permitindo a fuga do povo hebreu da perseguição do governo egípcio.

              Anteriormente os projetos para salvar Veneza baseavam-se em soluções aplicadas aos edifícios - solidificar as fundações das construções com betão armado ou tentar elevá-las do subsolo. Actualmente o projecto Mose inverte o problema com outra perspectiva sobre a solução. O projecto já esta feito e a fase da execução está concluída - um sistema de barragens e comportas metálicas, já tão utilizadas em outras situações menos complexas. Uma enorme barragem, formada por várias comportas são o sistema “simplificado” a aplicar permite não mexer na cidade e sim, mexer na água, daí o nome bíblico. A resolução de problemas encontra-se por vezes na desconstrução do mesmo e da sua envolvente, porque nem sempre as melhores soluções são as mais óbvias.

              São dezenas de barreiras móveis com trinta metros de comprimento e trezentas toneladas cada, estrategicamente posicionadas nas três aberturas que ligam a Lagoa de Veneza ao Mar Adriático. Este projecto de engenharia civil é tão fantástico, que o seu conceito e estratégia têm inspirado outras equipas de engenheiros, preocupados em resolver problemas relacionados com a água, tanto em Londres como em Amesterdão.

              Segundo o livro do Êxodo o profeta levantou os braços e conseguiu dividir as águas do Mar Vermelho para o seu povo atravessar. Hoje dizem que não foi o Mar Vermelho e sim o delta do Rio Nilo, explicando o investigador do Centro Nacional para a Pesquisa Atmosférica norte-americano, Carl Drews que, "... a descrição da separação das águas tem por base leis da física", atribuídas à acção do vento. “...um vento de leste a soprar a uma velocidade de um pouco mais de cem quilómetros por hora, durante oito horas, teria permitido afastar as águas (com 1,8 metros de profundidade). Uma faixa de terra lamacenta entre 3,2 e 4 quilómetros de comprimento e 4,8 quilómetros de largura teria ficado a descoberto durante quatro horas, com duas paredes de água de ambos os lados. Assim que o vento parasse, o caminho teria ficado alagado.”

              Em Veneza não existe o tal vento, portanto foi necessário o recurso da engenharia civil, certamente mais eficaz e duradouro.

              Para conter as marés de tempestades, a instalação de 78 comportas metálicas submersas deverá impedir as três entradas da laguna de Veneza. Elas são retrácteis e, quando necessário, sobem até à superfície para evitar que a água do Mar Adriático inunde a cidade. Este é o maior projecto de infraestruturas da Itália, para dividir o mar e salvar Veneza.

              A barreira referida foi testada pela primeira vez em 2020, já com efeitos positivos – Mose impediu as inundações da tempestade Alex.

              Como estamos em Viana do Castelo, Espinho, Figueira da Foz, Lisboa e Vila Franca de Xira? Esperamos tranquilamente até 2050?

Publicado em NVR 26/05/2021

22 maio, 2021

O CASAMENTO WILDE


"O CASAMENTO WILDE"

Realizador: Damian Harris,

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20 maio, 2021

LIVROS

 

LIVROS         

            Ainda não sabia ler e já via a História da Carochinha, num livro de tecido da Majora Editora e como tinha imagens, as letras sempre se posicionavam direitas. Foi assim que os livros começaram a fazer parte da minha vida.

            Entrei para o mundo da leitura através da ilustração, fui devoradora dos livros de banda desenhada, naquela época em que diziam que a banda desenhada escrita em brasileiro não era aconselhada, porque passaríamos a escrever mal o português. Como naquela época eu falava Lusumbundu ou Angolês, não foi um factor determinante na minha formação.  Fui fã do casal Maga Patalógica / Mancha Negra, do Peninha e do Biquinho e obviamente do Super-Homem.

            O livro sempre foi uma companhia e um cúmplice do meu relaxamento.  Tenho a mania de ler em vários lugares e sempre que viajo, preocupo-me com o que quero ler, para colocar de imediato, o livro na mala, evitando esquecimento de última hora. Nunca consegui adormecer sem ser aconchegada entre as palavras escritas, que formam a ante-câmara dos braços de Morfeu. E confesso, sou daquelas que fico a segurar o livro após adormecer até as minhas tendinites reclamarem. Também dobro as folhas no canto superior. Que escândalo! é verdade. Sou uma leitora desorganizada que nem sempre tem um marcador de livro junto de si.

            Tive uma fase de deslumbramento, quando na entrada na idade adulta descobri a escrita de Simone de Beauvoir e do surrealista de Boris Vian, aquilo era outro nível! Éramos 3 amigos, que em qualquer lado, nos sentávamos a ler e depois passávamos horas a trocar opiniões sobre o que liamos, construindo uma leitura mais reflexiva.

            Pertenço àquele grupo um pouco “disléxico” que quando pega pela primeira vez num livro, o abre no fim e começa a folhear do fim para o princípio. Assino com o livro na horizontal e por vezes escrevo a data em que terminei a leitura, na última página.

            Tenho uma amiga que escrevinha tudo o que lê e já me disse, que antes de morrer, quer destruir todos os seus livros devido à escrita paralela e comentada, que certamente revelará muito de si.

            Raramente escrevo nas margens dos livros, recentemente sublinho algumas frases quando as palavras se harmonizam de forma poética e criativa; curiosamente são sempre autores portugueses. A propósito, na poesia, só leio autores lusófonos. Só as palavras portuguesas me emocionam.

            Gosto de cheirar um livro novo, mas confesso que já não o faço, num livro já lido por outra pessoa, imaginando a pegada de outro leitor, entre linhas, alterando o odor original. Detesto quem molha o dedo com saliva para folhear. Não gosto de ler um livro duas vezes, para mim, a leitura deve progredir para um final desconhecido. Também não gosto de badanas... são manias.

            Não gosto de livros de autores orientais, porque tenho imensa dificuldade em memorizar os nomes das personagens.

            Conforme avanço na idade, começo a apreciar um livro com letras maiores!!! Letras gordas, como dizem, não cansam a vista.      

            Tenho livros especiais – o de tecido, os sensoriais, o de braille, o livro objecto, o livro musical, o livro das letras 3D, o livro espelho, o livro xadrez, o livro reflexos, o livro do tempo, os pop up books, os string books, e flipbooks (lamento vão informar-se na web), o livro das horas, o livro quadro, os livros sem bonecos, os livros de ilustração cientifica, os livros de arquitectura, os livros de fotografia, os livros de animais, os de humor, os livros de filosofia... tenho um livro com as dimensões de 4X4X4 sobre o Mar e tenho um, ainda mais minúsculo, um mini dicionário de Francês-Português. Depois tenho todos os livros do Lobo Antunes e do Jorge Amado... porque sim!  e um diário com poucas folhas escritas, que parece um livro secreto com chave e aloquete.

            O aspecto gráfico do livro é muito importante. Tenho um livro que é uma obra de arte das artes gráficas. Não é propriamente um livro... é o catálogo da exposição “Fernando Pessoa - Plural como o Universo", que ocorreu na Fundação Calouste Gulbenkian em 2012. É um prazer apreciar a composição gráfica de cada página.

            Gosto de livros em papel mate. E gosto de livros assinados pelo autor. A mais bonita assinatura que tenho, pertence a Ondjaki, que assinou desenhando uma flor, tão feminina e tão carinhosamente dedicada a mim.

            Quando era criança, tinha os livros para colorir, há alguns anos criaram os moleskines, tão bonitinhos.

            Já escrevi um livro e já ensinei a fazer um livro gigante, onde cada folha era um lençol, permitindo às crianças deitarem-se dentro dele.

            Os livros para além de servirem para ler podem ter outras utilidades. Quando um livro já não nos interessa, ou já está ultrapassado, podemos reutilizá-lo como um volume objecto. Há dias a perna de uma cama partiu, e a enciclopédia britânica deu-me muito jeito para calçar a cama enquanto o carpinteiro não a veio restaurar. As páginas amarelas, dão para fazer cartuxos para as castanhas assadas no S. Martinho e para fazer verdadeiras esculturas com aproveitamento do livro aberto ou para fazer art quilling. Lembro-me de uma peixeira que vendia sardinhas e embrulhava-as nas ditas páginas com números de telefone.

            Há livros amaldiçoados – não descansei enquanto não li o livro de São Cipriano, passando rapidamente da expectativa juvenil à decepção. Antigamente havia livros proibidos, porque poderiam pôr em causa o regime político – convinha manter um povo ignorante e adormecido.

            Maio costumava ser o mês da feira do livro. Quando vivia no Porto aguardava com muita ansiedade esta feira, localizada no Palácio de Cristal, na Boavista ou nos Aliados. Passava por lá várias vezes, o dinheiro não abundava e escolhia criteriosamente o que comprava e lia compulsivamente. Até forrava as capas com plástico. Hoje compro livros ao longo do ano, e vão ficando em fila de espera até surgir a oportunidade da leitura.

            Há dias li “O vício dos livros” de Afonso Cruz, onde refere que Gabriela Cabal, pensa que os livros afastam a morte, ou seja, se estivermos a ler, a morte entretém-se a ver o que estamos a ler e distrai-se. Estou com sorte porque tenho sempre livros a meio, cuja conclusão vai sendo adiada Segundo esta teoria isso irá favorecer a minha longevidade. Lendo, vivemos mais do que uma vez, porque vivemos a vida descrita de cada personagem.

            Como trabalho numa biblioteca já encontrei várias coisas no interior dos livros – lembretes, poemas de amor, amores-perfeitos e papoilas meio secos, uma fita azul bebé, uma folha dobrada da publicidade de um supermercado, o recibo de compra, um cartão de cidadão, um desenho infantil...

            Um livro nunca se empresta, porque normalmente há dificuldades de retorno. Prefiro dar, do que emprestar. Odeio perceber que me falta um livro, e já nem sei a quem emprestei. Gosto que me ofereçam cheques para adquirir livros.

            Aprecio filas duplas de livros em estantes. O reencontro é sempre agradável. Tenho livros organizados por alturas, por épocas, por assuntos, por autores e finalmente livros desorganizados... daqui se conclui que os meus livros habitam o caos. Depois tenho os livros em PDF, uns legais outros clandestinos, recolhidos na ilusão que iria aliviar a minha bagagem nas férias... só teria que levar o tablet... descobrir que enjoo a ler num tablet, e não me consigo aconchegar às palavras digitais – inquieta-me que o tablet possa escorregar das minhas mãos e partir as palavras.

Publicados em NVR 19/05/2021


18 maio, 2021

DRESS A GIRL


Estou neste projecto desde Outubro de 2018. 

Vestir meninas e meninos carenciados por esse mundo fora é o objectivo.

Isto funciona porque é uma cadeia e faço parte dela.

Uns opinam, têm intenção de.... e nós fazemos ou arranjamos condições para se fazer.

Ver aqui

13 maio, 2021

URIAH HEEP

 


Hoje alguém me recordou esta música. Grata. 

12 maio, 2021

O FATO QUE NUNCA VESTIMOS

 




momentos simbólicos e marcantes

há 4 anos numa data com significado, entretanto já saiu o segundo volume e o terceiro está pronto para sair.

11 maio, 2021

ESCRAVIDÃO

 


ESCRAVIDÃO

          A escravidão existe desde há milhares de anos. Constituía uma prática comum e banal, o ser humano assumir propriedade sobre outro ser humano, este último, denominado por escravo. Este, ou era transacionado como um bem material, uma mercadoria em melhor ou pior estado, ou era usufruído por ser um prisioneiro de guerra. O proprietário poderia vender, comprar, agredir, trocar e dispor essencialmente como mão-de-obra completamente gratuita. As transações faziam-se como se de um animal se tratasse, apreciando a idade e a saúde através dos dentes, da musculatura, das mãos e dos pés. Os velhos eram velhos, transportavam doenças, sofriam de artrite e nada valiam – aliás, o período de validade de um escravo africano que trabalhava nas plantações das Américas era de 5 anos, aos 30 anos estavam “gastos”. As mulheres eram duplamente usadas, no trabalho e na reprodução.

          O comércio de escravos, uniu continentes; África era o grande abastecedor do mundo, não só através dos colonizadores, mas também de bolsas de comunidades negras onde era praticada e explorada em continuidade.

          A escravidão era algo aceite pela sociedade, todos pareciam viver bem com isso, excepto os escravos, obviamente. O facto de serem pagãos facilitava o acto de contrição das religiões mais humanistas, tornando a escravidão      mais justa perante Deus. Pensavam eles. No século XV, a Igreja Católica condenou a escravidão – algo apenas teórico, sem efeitos práticos, visto que no Brasil até ao século XIX, a Ordem dos Beneditinos era uma das maiores proprietárias de escravos.

          Em Portugal, no século XV atingiu-se o auge desta prática.

          Portugal foi o primeiro país abolir a escravatura. Quando aprendi isso na escola, fiquei toda orgulhosa, porque no meu espírito infantil, não cabia o conceito de se ser dono de alguém, porém, esqueceram-se de me informar que Portugal foi um dos grandes países do atlântico a fazer comércio global de escravos vindos de África e que entre 1450 e 1900, terá traficado cerca de 11 milhões de pessoas.

          Escravatura...

          A abolição da escravatura foi iniciada de forma muito rudimentar pelo Marquês de Pombal e só se concluiu, de facto, a meio do século XIX.

          Todos os relatos que nos chegaram até aos nossos dias são epopeias de sofrimento, sadismo, horror e desumanização, completamente inconcebíveis na contemporaneidade (será?), muitas vezes associando escravidão com Inquisição.

          Transcrevo para múltiplas refexões:

[O padre encarregue do processo ainda lamenta não ter chegado mais cedo ao local do crime. "Conheço muito bem as manhas dos escravos” – diz ele nos autos – “eles fecham a boca para deixarem de respirar e morrerem. Se tivesse chegado mais cedo, chegava-lhe fogo à boca, ela era obrigada a respirar e não morria.”][1]

          Outras formas de escravatura surgiram e evoluíram. Homens e mulheres, rapazes e raparigas, vivem situações de grande  vulnerabilidade, são vítimas de tráfico humano, servidão, trabalho forçado, trabalho infantil, casamento forçado, exploração sexual, exploração para pagamento de dívida, bem como outras formas de exploração - crimes que indignam e envergonham a nossa condição de seres humanos.

          E o problema não é dos outros... é de cada um de nós! Cada um, quando nasce, conquista a oportunidade de viver uma vida segura e livre. É impensável que um ser humano possa negar a outro humano esses direitos básicos utilizando o medo, a ignorância e a clandestinidade, para explorar, enganar, limitar as suas acções física e psicológica.

          Em Portugal, entre 2014 e 2015, o Observatório do Tráfico de Seres Humanos, do Ministério da Administração Interna, sinalizou 193 presumíveis escravos e deu conta de 40 condenações de traficantes. E o que foi feito?

“POR QUE LUTAMOS CONTRA A ESCRAVIDÃO MODERNA

No Walk Free, lutamos para que os silenciados recuperem as suas vozes. Há quem diga que o problema é muito difícil, que existem questões mais urgentes ou que este é um desafio a ser resolvido pelos governos. Acreditamos que nada é mais importante do que a vida humana. Podemos e devemos fazer tudo ao nosso alcance para acabar com a escravidão moderna.”[2]

          Este mês, fomos desagradavelmente “surpreendidos” por mais um foco que denuncia práticas de escravatura em Odemira. Quantos outros haverá? E nós preocupados, com proteção de dados, liberdades individuais, audiências, futebol.... a Cimeira Social Europeia a realizar no fim de semana no Porto, irá ignorar esta problemática?



[1] https://rr.sapo.pt/2017/03/25/pais/a-ultima-escrava-portuguesa-morreu-em-lisboa-nos-anos-1930/noticia/79112/

[2]https://www.walkfree.org/

levei-te flores




 levei-te flores.

amarelas.

a cor que nos ilumina através dos raios solares oferecendo-nos energia e vida. A cor do ouro, da eterna juventude e do poder divino.

a cor da minha saudade.

levei-te flores singelas para junto do sítio onde repousas.

numa dimensão qualquer do tempo e do espaço, sorris.

07 maio, 2021

ESPLANADA, nome feminino

 


ESPLANADA, nome feminino

1. Terreno descoberto. 2. Planura, planície. 3. Chapada. 4. [Fortificação]  Terreno plano, largo e descoberto, na frente de fortificações ou de um edifício. 5. Lugar ao ar livre com mesas e cadeiras onde se come ou se tomam bebidas, refrigerantes, café, etc.

Consultei o dicionário e seleccionei o 5. 

O que nos diz a História sobre esplanadas? Estar na esplanada parece ser hábito recente, com menos de 100 anos. Antes, os cafés e restaurantes dispunham apenas do seu espaço limitado, definido no seu interior; espaço fechado, pouco arejado por vezes, protegido do sol, da chuva, do vento e do arejamento, onde a iluminação artificial reinava, assim como o frúfrú dos cetins, tafetás e organzas das toilettes das senhoras, cujos odores se misturavam numa orgia sem fim, entre o mofo, o perfume, a nafetalina, a gordura da cozinha, o tabaco, o café, o sabão e a cera.

Só após a 2ª Guerra Mundial e perante os consumidores teimosos e desejosos de sol e de paz, é que os serviços de restauração foram abandonando o conceito conservador e bafiento do espaço fechado, mal arejado, tantas vezes o espelho do país politicamente fechado e sombrio, como era o nosso - um país de grande território, mas fechado à inovação e à autonomia, sombrio, porque triste, desconfiado e ”orgulhosamente só”. Todos temos a memória dos pequenos tascos, que para além de fechados, pequenos, sombrios também tresandavam a vinho, porém, onde era frequente comer-se um escabeche delicioso. Os consumidores foram exigindo novos espaços mais adaptados às estações do ano, beneficiando do clima maravilhoso que tem o nosso país, permitindo mais de seis meses de temperatura agradável para "esplanada" – algo mais assertivo com a cultura mediterrânica, que por muitos anos esteve arrumada na gaveta. Aqui, o sol tisnava a pele dos trabalhadores das encostas do Douro, nas grandes cidades europeias, usufruía-se do sol em qualquer recanto. Pensando bem, o que faltava, na verdade, era tempo de lazer e ultrapassar a barreira do recato. Esta forma de viver a vida, saindo do interior de quatro paredes, foi retratada por vários pintores, em registos famosos. Cadeiras fora do café em fila estreita, em passeio esguio já as havia desde o século anterior, especialmente numa Lisboa envergonhada e amordaçada, mas esplanadas é algo de coração maior, de espaço amplo de rua e múltiplo que cabe, repartindo-se, em muitos sorrisos.

Um dia o país sombrio colapsou, os retornados e refugiados invadiram-no desejando sol e replicar um pouco a qualidade do lazer que traziam das colónias tropicais… e bem mais tarde, surgem os turistas, muitos deles provenientes do norte da Europa, com sol rafado todo o ano e muito disputado entre todos.

 Esta liberdade de se estar, olhar à volta sem barreiras, de namorar os recantos da cidade, de ver e ser visto, de deixar a manhã espreguiçar-se no sabor de uma torrada, deixar a tarde correr sem tempo, mergulhar na luz dourada dos finais do dia e transitar para a noite tépida, até os amigos se lembrarem que têm que ir para casa, é dar mais sentido à vida, e mais significado aos pequenos prazeres.   

A pandemia retirou-nos esse prazer. Nunca tínhamos percebido que sentar numa esplanada e soltar o olhar, enquanto se tomava um café ou se saboreavam umas batatas fritas, que seria um prazer tão grande. Só agora percebemos este pequeno grande prazer que fazia parte das nossas vidas. Teremos esse prazer de volta e deveremos cuidar-nos para que permaneça.

Não me interessa se ainda corre um arzinho fresco, se tenho ou não um guarda-sol a proteger-me, vou sentar-me nas esplanadas que frequentava e todas as outras que irei conhecer, vou semicerrar o olhar e tentarei confessar-lhes o meu amor. 

Oublicado em NVR, 5/05/2021

06 maio, 2021

Escada

 

O gozo da matemática e da geometria. Já desenhei algo parecido. Tudo tem que bater certinho, caso contrário parece obra do arquitecto do Asterix.


A RAPARIGA DINAMARQUESA

 



A rapariga dinamarquesa
Realizador: Tom Hopper
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02 maio, 2021