28 fevereiro, 2013

AVEIRO, cidade escondida




A noite ainda não abriu...



"A noite ainda não se abriu e o dia ainda não fechou, mas o céu alaranjou em tons inigualávelmente quentes que faz morrer de inveja a paleta dos pintores e algo nos vai fazendo adivinhar o que vem a seguir. 
Olho todo o céu que já nem sei se é céu ou abobada celeste exuberante, vestida em tons de fogo – cor de laranjéee, cor de mamão, cor de cajú, cor de pitanga, cor de goiaba, cor de acácia rubra e ainda cor de chama, de fogo, de fogueira. … A pele humedece, o céu desta cidade parece que me esmaga e a tudo que me envolve, encurtando distancias verticais, ficando cada vez mais terreno… quase se toca com a mão.
De repente só existe céu.
Não existe terra, não existe mar… existe céu, aquele céu grande forrado cada vez mais a cetim fogo.
As energias pesam sem se verem, parece que Ele estará para desarrumar o céu, num de repente sem plano nem organização e sem avisar ninguém, dirigindo todo processo no pleno da sua omnipotência.
Começa uma leve corrente de ar rasteira e depois outra e … bruscamente todos os móveis do Grande Arquitecto mudam de sitio ao mesmo tempo por alguém descuidado que os deixa cair da levitação celestial e a trovoada tropical começa com toda a pujança"…


In “Ensaios de escrita, um projecto sempre adiado”, Anabela Quelhas

23 fevereiro, 2013

22 fevereiro, 2013

13 fevereiro, 2013

Sofro de distância


“Sofrer de distância, é talvez das enfermidades que mais padeço. Alguém me diagnosticou, mas não soube medicar, apesar da vasta experiência. Aliás salvo erro inclui-se na mesma maleita incurável desde os tempos que são tempos de distância. Falta o cheiro de terra vermelha, falta o olhar daquele céu, falta a linha do horizonte a nos cegar, falta o cacimbo e os mangais, falta ritmo de batuque para adormecer, falta a falta de tudo e mais a falta dos sábados intermináveis de nada fazer e tudo abarcar. Ausências, distancias… qual milongo pode curar tamanha sintomatologia? Te falei de reincarnação… reincarnação no mesmo lugar da Lua é que eu quero, outras nem pensar. Quero brincar na areia, quero corimbar, quero ver-te da minha janela estendida em malhas de crescer sem parar. Quero repousar à sombra de jacarandás e sonhar que sou uma onça pintada, que sou uma palanca negra, que sou uma formiga salélé…, sei lá, o que mais sempre habitou nas imaginações que sofrem de distância.
Sofro de distância. Olho o olhar do outro lado do espelho e vejo como sofro.”
In Ensaios de escrita um projecto sempre adiado, Anabela Quelhas

04 fevereiro, 2013