31 março, 2024

VELIKO TORNOVO


 

O espetáculo funciona o ano todo, independente do clima e pode ser assistido no auditório localizado atrás da Catedral "Rozhdestvo Bogorodichno" e no seu terraço.

É uma atração deslumbrante e emblemática da cidade.

Visitei de dia a muralha e à noite assisti do terraço – música Pink Floyd e lazers perfeitamente sincronizados. O 1º espectáculo foi criado em 1985, e os espectaculos são diversos, conforme o momento ou a música utilizada.

Diário de viagem.

30 março, 2024

COLINA DAS CRUZES


Na colina das cruzes.

Desconcertante, enigmático e deprimente.
Šiauliai
Lituânia

28 março, 2024

A família Van Loon

 


A família Van Loon

É uma pintura desconhecida da maioria das pessoas, porque não é famosa, porque não consta nos livros de arte. Encontrei-a por mero acaso e interessei-me pelo seu significado. Foi pintada no século XVII por Jan Miense Molenaar - pintor holandês e a sua obra revela influências de Van Ostade e de Franz Hals, de quem foi discípulo; é autor de retratos e sobretudo de cenas de género urbano e campestre.

Se a pintura e o autor não são famosos, o que me atrai nesta obra?

Esta obra está exposta no Museu Van Loon e representa a família do mesmo nome.

Merece atenção sobre o que representa e como é representado.

Atentem aos pormenores.

Estão representadas 4 gerações da família Van Loon, com uma ordem cronológica, no lado direito os mais velhos e à esquerda os mais novos.

Curiosamente quando o pintor criou esta obra, os avós, os mais velhos, já tinham falecido. O pintor fez uma espécie de “montagem”, copiando retratos já existentes deste casal. O avô é representado pousando a mão sobre uma caveira, ficando assim registada a morte, localizado à direita.

Esta obra associa os vários membros da família aos 5 sentidos responsáveis pela captação de informações do meio..

Ora, observem, da direita para a esquerda, a avó está com uns óculos numa mão e a outra mão pousada sobre um livro, significando a VISÂO.

Seguem-se os pais que tocam instrumentos musicais, um cravo e um alaude, evocando a AUDIÇÃO.

Depois surgem dois jovens supostamente namorados, e que não devem nada à beleza, em que o rapaz pega numa flor e dá a cheirar à outra figura. Aqui temos o sentido do OLFACTO.

No lado esquerdo temos as crianças. Duas brincam com um gato, e o rapaz com ar maroto, segura o gato pelo rabo que acabou de arranhar uma das meninas, cuja expressão é de dor na pele agredida – o TACTO.

E finalmente as outras duas crianças, comem frutas variadas deliciando-se com o seu sabor – o PALADAR.

Outro pormenor, o ponto de fuga da perspectiva do pavimento, separa a vida da morte.

Esta obra está exposta no Museu Van Loon, em Amesterdão e certamente conterá outros pormenores que não consigo descodificar.

A pintura barroca tinha como característica focar as naturezas mortas, a vida familiar e paisagens pitorescas, em que alguns adicionavam pormenores interpretativos, como os 5 sentidos do ser humano, enriquecendo o tema principal. Na época a representação dos cinco sentidos era muito apreciada, e curiosamente a “visão”, era considerada como o mais importante dos sentidos, aqui, atribuída à avó. 

Os sentidos nem sempre têm fácil representação e é curioso observar obras desta época  e forma que estes tomavam na composição pictórica.

Anabela Quelhas - art teacher


27 março, 2024

50 anos de "maus hábitos"

50 anos de “maus hábitos”


Foram 50 anos de “maus hábitos” e isto desassossega-me.

A maioria dos portugueses já nasceu e cresceu em cima de uma almofada de cetim, ergonómica e perfumada chamada democracia, convertendo, inconscientemente, conquistas em hábitos, como se as conquistas democráticas fossem um dado adquirido desde sempre, não concebendo piores condições de vida, nem uma sociedade claustrofóbica, sem respeitar homens e mulheres, e quem pensa diferente. Parece que se esqueceu tudo e não se aprendeu nada. Esqueceu-se de que muitos já experimentaram outro regime político, esqueceu-se a miséria, o analfabetismo, as prisões e as desigualdades sociais. Também não se aprendeu que a democracia é um ideal, algo que se constrói, e que cada um tem o direito de ambicionar uma vida melhor, permitindo-se usar um dos pilares da democracia que é a possibilidade de protesto e de luta, por uma sociedade cada vez melhor e mais justa para todos.

O desconhecimento das conquistas e a não valorização dos principais pilares da democracia levou àquilo que denomino por “maus hábitos”, onde até o acto de votar parece ser um verdadeiro aborrecimento para alguns ou que transformam o protesto em opção política, enveredando por caminhos esconsos.

A malta que hoje tem problemas, e que são muitos - emprego, saúde, habitação, educação e segurança - pensa que antes era melhor, e não era! Aceita a abordagem desses protestos através de discursos mal-intencionados, ideologicamente carregados por intenções que podem corroer os pilares da democracia.

Foram 50 anos de “maus hábitos”. Destacar os defeitos e esquecer as qualidades deste exercício da democracia é má pedagogia.

Vemos a Europa aqui ao lado, deslumbramo-nos com tudo, temos a justa ambição de viver melhor e lutamos por isso, porém, no processo não pode valer tudo.

Há um “vírus” mundial que ataca e, infelizmente, ataca onde calha, que se chama corrupção, mais visível nuns do que noutros, mas sempre condenável, sempre a colocar calhaus no caminho da democracia e da cidadania. Condeno, desprezo quem faz, mas quero evidenciar que os críticos mais ferozes, depois vai-se a ver, andam a meter cunhas para arranjar trabalho para os filhos, andam a meter cunhas ao médico, ao vereador, ao professor, ao polícia, ao fiscal, tentam safar-se da multa do estacionamento, abusam do SNS, não declaram todo o seu rendimento, inventam despesas para o IRS, criam fontes de receita clandestinas, recebem subsídios para isto e para aquilo, as grandes superfícies de alimentação inventam pontos e talões de descontos, publicitam produtos sem IVA e outras “engenharias” financeiras.

Há também uma vaga de fundo de egoísmo, estruturada na falta de solidariedade, onde cada um se quer afogar num mar de individualismo extremo, desprezando o outro, o seu conforto e os seus direitos. Esta vaga segue redes sociais, e partilha de opiniões que subestimam os valores conquistados em Abril de 74. Não querem Estado, mas não sobrevivem sem ele.

- Desde que eu esteja bem, os outros que se lixem!

Hoje é urgente repensar tudo e valorizar o que temos. A democracia tem que se tratar como um filho, valorizando as qualidades, e superar defeitos sem fazer grande estardalhaço e sem tomar medidas radicais que o poderão prejudicar e bloquear definitivamente. É preciso responsabilizá-lo pelas suas decisões, entre as quais votar de forma consciente e informada.

É preciso lembrar ou dar a conhecer, que vivemos todos muito melhor do que há 50 anos. Alguns desconhecem esta realidade. Os mais jovens que perguntem à família, como viviam, como se divertiam, como eram os cuidados de saúde, se passaram fome, se tiveram bodas de casamento, se viram alguém descalço, se iam a festivais e a discotecas, se tinham roupa de marca, se jantavam com os amigos, se tinham telefone, se tinham médico de família ou hospital, se os avós tinham férias, se existiam Mcdonald’s e centros comerciais, se todos frequentavam a escola e quantos acediam à universidade, se tinham quarto de banho, se tinham cidades de chão limpo… tanta pergunta que haverá a fazer. Façam-nas! Perguntem o que eram as calças de costura no rabo aberta que usavam as crianças – esta é a imagem icónica do “antes”. Preparem as lousas para substituir os tablets!

A alternância democrática é saudável e é preciso reflectir para que não se ultrapasse o intervalo democrático da alternância.

Um partido não soube ser oposição, não conseguiu segurar o seu eleitorado, nem recorrendo ao baú cheio de mofo e teias de aranha; o outro não soube ler correctamente a narrativa de sucessivos protestos, deixando-se seduzir por uma maioria enganadora; o PR fala, fala, mas tem uma família que também não aprendeu nada e não se aguenta à bomboca. Sobram os activistas ambientais, aqueles que continuam a tomar banho quentinho com água aquecida numa caldeira a gasóleo, a mascar chiclete, a consumir tofu embalado em plástico, a calçar sapatilhas contrafeitas  e a viajar nos aviões low coats, e que agora não fazem mais nada além de borrar tudo de tinta verde. Triste! Cartão vermelho para todos. É urgente regar e adubar os cravos e já agora pensem no ridículo da bola interromper um programa sobre eleições.

Após 3 dias das eleições, ainda se desconhece os valores totais das votações e já vem a herdeira de Belmiro de Azevedo apresentar os lucros Sonae de 2023, proferindo que os resultados eleitorais são como um “grito de mudança” e logo contesta o pagamento de imposto sobre lucro excessivo. Com 357 milhões de lucro (nem faço ideia o que isso é), contesta 1,3 milhões de euros de pagamento de imposto sobre o lucro excessivo, representando 0,36%. Eu consultei a tabela de IRS onde me insiro e constato que a taxa menor é de 5,9% para quem ganha uns míseros 935€ mensais.

Para quem é ingénuo ou perdeu o Norte neste mar difícil da democracia, feito de calmarias, tempestades e armadilhas, aqui está um bom retrato sobre uma das grandes mudanças que significa votar à direita.

Publicado em NVR em27/03/2024


25 março, 2024

como se tudo no mundo fosse alquimia

 


Era a tarde mais longa de todas as tardes que me acontecia

Não esperava por ti, porque eras alguém que eu não conhecia

Era tarde, tão tarde, tardando o beijo, que não acontecia

Quando nós nos olhámos esquecemos o beijo que a boca pedia

 

E na tarde ficámos unidos ardendo na luz que morria

Em nós dois nessa tarde em que tanto tardou o sol amanhecia

Era tarde de mais para haver outra noite, para haver outro dia


Abraçados nós dois, como se tudo no mundo fosse alquimia

 

Meu amor, meu amor

Minha estrela da tarde

Que o luar te amanheça e o meu corpo te guarde

Meu amor, meu amor

Eu não tenho a certeza

Se tu és a alegria ou se és a tristeza

Meu amor, meu amor

Eu não tenho a certeza


Foi a noite mais bela de todas as noites que se viveram

Foram noites e noites que numa só noite nos aconteceram

Era o dia da noite de todas as noites que nos precederam

Era a noite mais clara daqueles que à noite amando se deram

 

Eu não sei, meu amor, se o que digo é ternura, se é riso, se é pranto

É por ti que adormeço e acordo embalada num canto

Essa tarde em que construímos um sonho de profundo encanto

Essa tarde, essa noite que temos saudade sem mágoa nem espanto

 

Meu amor, nunca é tarde nem cedo para quem se quer tanto!


Poema adaptado de José Carlos Ary dos Santos (AQCD)

24 março, 2024

LQB

 


Pintura AQ 

23 março, 2024

22 março, 2024

TRENCADIS

 

O trencadís (do catalão trencat, em português: quebrado) é uma técnica decorativa que consiste na criação de uma espécie de mosaico com pedaços irregulares de cerâmica ou outros materiais de fácil fragmentação, normalmente usada na decoração de superfícies verticais exteriores. Esta técnica foi muito utilizada durante o modernismo catalão, tendo os seus arquitetos e artesãos atingido um grande grau de destreza na sua conceção e execução. A utilização do trencadís foi particularmente advogada pelo arquiteto Antoni Gaudí e pelos seus discípulos, em especial Josep Maria Jujol, sendo uma das mais marcantes características das suas obras. Atualmente, a utilização de trencadís é um dos sinais distintivos das obras do arquiteto valenciano Santiago Calatrava, que usa sobretudo trencadís branco para revestir o exterior das suas obras, como a Cidade das Artes e das Ciências em Valência.

As vantagens do trencadís incluem a rápida aplicação, a grande espontaneidade de desenho e o facto de permitir a utilização de restos de materiais que de outra forma não seriam aproveitáveis. No Parque Güell, por exemplo, Jujol usou essencialmente pedaços de mosaico, louça e garrafas (incluindo o seu próprio serviço de jantar), mas também materiais pouco usuais como um fragmento de uma boneca, e diz-se que por indicação de Gaudí os operários tinham por hábito recolher os pedaços de cerâmica e vidro que encontrassem no lixo a caminho da obra, tendo-se igualmente tornado costume para os barceloneses empilhar junto ao parque a cerâmica, louça e porcelana que se partia para ser reciclada na construção.

  para Anabela Quelhas art teacher


ANTECIPANDO





 Rebelo Hotel

Cais de Gaia 380, Vila Nova de Gaia


14 março, 2024

Albert Einstein


 Albert Einstein 

Nos anos 60/70 vi pela primeira vez uma foto de Albert Einstein… essa, exactamente, que o leitor imagina, aquela da língua de fora. Pareceu-me um velho doido a fazer uma careta debochada, e despertou-me curiosidade para tentar ler alguma coisa acerca do cientista, que eu pensava ser um senhor vestindo fato com gravata, super-focado na sua Teoria da Relatividade.

A foto não foi obtida no seu laboratório, foi tirada no dia 14 de Março de 1951, quando saía de uma festa realizada num clube privado frequentado por ex-alunos, professores e pesquisadores da Universidade de Princeton, em Nova Jersey, no 72.º aniversário do físico.

Parece que Einstein já estava cansado de ser alvo de vários fotógrafos, e ao retirar-se, o fotógrafo Arthur Sasse tentou registar um último sorriso do físico que fez uma das caretas mais famosas da História, enquadrando um bigode branco e cabelos da mesma cor e desalinhados.

Einstein que tinha uma personalidade multifacetada e com sentido de humor, gostou do registo, pediu várias cópias da foto à agência de notícias, para oferecer aos amigos, assinadas pelo próprio. Einstein morreu após quatro anos. Uma das fotos foi leiloada em 2017 por 125 mil dólares. As fotos viraram cartões postais e posters para decorar as paredes dos quartos dos jovens, lado a lado com as imagens icónicas das estrelas pop, Mick Jagger, Jimi Hendrix e Madona, numa mistura geracional sem grande sentido, apenas com a irreverência em comum.

  • A vida de Einstein foi muito mais complexa do que por vezes imaginamos. Ao celebrar a data do seu aniversário, partilho aqui algumas curiosidades:
  • Só começou a falar aos 3 anos.
  • Apesar dos pais se preocuparem com as suas capacidades cognitivas, Einstein escreveu o seu primeiro artigo científico aos 15 ou 16 anos.
  • Era bom aluno a Física e mediano a Matemática, algo que não se entende muito bem.
  • Licenciou-se e durante 10 anos não conseguiu arranjar trabalho na sua área e foi trabalhar num escritório, como examinador de patentes.
  • O filósofo francês Henri Bergson foi um dos seus grandes inimigos.
  • Quando ganhou um Nobel, em 1921, não foi premiado pela Teoria da Relatividade, mas pelos seus serviços relacionados com a Física Teórica.
  • Quando Adolf Hitler subiu ao poder, Albert Einstein, que era judeu e vivia em Berlim, ficou desempregado; receando a perseguição nazista, fugiu para os Estados Unidos e nunca regressou à Alemanha.
  •  Einstein chegou a ter dupla nacionalidade.
  • Em criança detestava as aulas de violino, porém, em adulto, de madrugada, tocava violino com frequência, enquanto pensava nas suas teorias. O seu violino chamava-se Lina.
  • Era pacifista, porém, os seus estudos sobre matéria e energia foram utilizados pelo governo americano para criação da bomba atómica.
  •  Refletiu muito sobre os temas de educação, dando vários conselhos sobre como se deve educar os jovens. Contra o ensino estruturado na memorização, considerava a curiosidade e a imaginação muito mais úteis na formação académica.
  • Em 1952 foi convidado para ser presidente de Israel, e recusou.
  •  Considerava que a monogamia não era natural.
  •  O cérebro de Albert Einstein foi roubado por um patologista que participou da sua autópsia.
Publicado em NVR, 13/03/2024
 

08 março, 2024

ESTRELA NOVAIS



 Na minha breve passagem pelo TUP, teatro Universitário do Porto, onde não aqueci lugar, no final da década de 70, porque de facto desagrada-me a ansiedade implícita na representação, conheci Estrela de Novais da Seiva Trupe. Um pouco mais velha do que nós (grupo do TUP), já tinha um grande destaque entre os amantes da arte de representar. Era uma jovem discreta, lindíssima com um sorriso maravilhoso. Possuía uma beleza extraordinária, com luz própria da juventude, e inesquecível. Nessa época eu achava que ela era a mulher mais bela do mundo artístico da cidade do Porto, segura e determinada. Quando subia ao palco, tornava-se poderosa, com uma colocação de voz fabulosa. Sempre a acompanhei pela comunicação social e penso que nunca mais me cruzei com ela, depois da década de 80. Mais tarde apareceu nas novelas, já madura, mas ainda denunciando a sua voz coloquial, que a destacava em cima do palco.

Hoje estou triste com o seu desaparecimento. Adeus Estrela.

Descer ao ponto mais baixo da dignidade


 

06 março, 2024

ROCK DA LIBERDADE


 LETRA: António Pedro de Vasconcelos

https://www.youtube.com/watch?v=KtjZNllPBzo

Era mãe, esposa e dona-de-casa

          

            Era mãe, esposa e dona-de-casa 

Era mãe, esposa, dona-de-casa e mais nada. Obedecia e anulava-se num compromisso sem sentido, com a vida e com os outros.

Mãe doce e bondosa, sobre a qual cabia toda a responsabilidade do mundo na educação dos filhos; esposa dedicada, propriedade do marido, fêmea sempre disponível para este, sempre, sempre submissa e dominada, entre marido e mulher não metas a colher… com sorte não era agredida e sempre se colocava no nível inferior, se possível sem opinião e invisível; dona-de-casa, dona entre aspas, porque realizava todas as tarefas de casa para bem servir o marido e os filhos, na verdade, não era dona de nada, nem do seu próprio nariz, porque se o marido a agredisse, havia sempre uma justa causa a favor dele.

Este era o retrato da maioria das mulheres antes do 25 de Abril. A mulher ficava sempre num plano inferior na sociedade e na família.

Se os filhos fossem problemáticos, a culpa era da mãe, se os filhos fossem inteligentes, puxavam ao pai.

A mulher vivia oprimida e com uma atitude de absoluto conformismo, porque a alternativa era ficar solteira, a trabalhar para os pais ou para um irmão, contribuindo para a sua fortuna. Fazer formação e trabalhar, eram situações muito condicionadas e exploradoras da condição feminina. Era difícil ser autónoma e independente, porque as leis não a protegiam, nem a consideravam. Não constituir família era estar à margem da sociedade que tinha como modelo “Deus, Pátria e família”, lema do Estado Novo.

            A mulher não tinha direito de voto, a mulher não tinha possibilidade de exercer nenhum cargo político. As raparigas tinham acesso limitado à educação e a certas profissões.

Para parecer que se contrariava a discriminação das mulheres, exaltava-se a função da mulher casada: o governo doméstico, no meio dos tachos e das panelas, mas a autoridade pertencia inequivocamente ao homem, denominado chefe de família.

O divórcio era proibido, todas as crianças nascidas de uma nova relação, posterior ao casamento, eram consideradas ilegítimas. A mulher ou dava à criança, filha de outro, o nome do “marido” ou recorriam aos próprios pais para registarem os seus filhos, para lhes dar nome. Era completamente inviável dar o seu nome e o do marido/companheiro actual gerando situações confrangedoras e humilhantes sobretudo para a mulher.

Às mulheres era vedado o acesso a algumas profissões, até se dizia à boca solta, as profissões para os homens e as profissões para as mulheres. A engenharia era para os homens, as letras eram para as mulheres, como se o raciocínio fosse privilégio dos homens. Todas as profissões que exigiam grandes responsabilidades eram para os homens. A magistratura, a diplomacia e a política são apenas alguns dos exemplos de sectores profissionais a que a mulher não podia aceder. Perante as mesmas profissões a mulher era sempre discriminada ao nível salarial e de promoção profissional.

As profissões que exigiam ausência da mulher por algum tempo junto da família, hospedeiras de bordo e enfermeiras, eram vedadas às mulheres casadas. As mulheres casadas não podiam mexer no património do casal e não podiam viajar para o estrangeiro sem ter autorização escrita do marido. As professoras tinham que pedir autorização ao Estado para casar, exibindo prova de que o possível marido, teria um ordenado superior ao delas. No mundo laboral, o marido poderia impedir que a sua esposa trabalhasse e exigir o despedimento desta.

Os namoros tinham que ser autorizados pelo pai das raparigas. Educação sexual não existia, falar sobre sexo era proibido ou feito às escondidas, uma rapariga não chegar virgem ao casamento era o desastre total e uma desonra, um rapaz chegar virgem ao casamento seria motivo de gozo e falta de masculinidade.

O corpo escondia-se e desconhecia-se, inserido numa falsa moral moldada sempre contra a mulher.

Em tudo descrito, havia excepções devido à permissividade de alguns homens ou cumplicidade e companheirismo, por parte de outros na luta pela igualdade.

Como nota final e considerando o Dia Internacional da Mulher em ano em que se comemora os 50 anos pós-abril, refiro a obra “Novas cartas portuguesas” publicada em 1972 pelas escritoras portuguesas Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa e imediatamente confiscada pela censura. As autoras ficaram conhecidas internacionalmente como “as três Marias” e esta obra revelou ao mundo a existência de situações de grande discriminação em Portugal, relacionadas com a repressão da ditadura, a cumplicidade da Igreja, e a condição da mulher (casamento, maternidade, sexualidade feminina).

Era mãe, esposa e dona-de-casa, era tudo isso e mais nada. Obedecia e calava.

Em 1975, depois da revolução, os direitos das mulheres ficaram consagrados na Constituição da República. A luta continua.

Fotografia – Eduardo Gageiro

Publicado em NVR, 06/03/2024



02 março, 2024

ANTECIPANDO

 URH Hotel Spa Zen Balagares




Avenida de los Balagares, 34, 33400 Overo, Espanha