10 julho, 2024

PORTUGAL x FRANÇA


PORTUGAL x FRANÇA

Lá dentro esperam pelo directo do Euro 2024…

Eu sou mais piscina ao pôr-do-sol, olhar o Douro, refrescar-me neste calor saboroso, viver a vida boa e mansa em boa companhia. 

Uns fazem apostas, outros pintam-se de verde e vermelho, alguns rezam, evocando Deus como se ele não tivesse mais o que fazer. Colocam faixas, agitam bandeiras, partilham da fé do Paulo Futre, recordam Dani e o Pauleta que passam na TV, matam o calor com cerveja gelada e o ar condicionado. Estão ansiosos e risonhos sentados pelos vários sofás do salão. Um plasma gigante numa das paredes absorve o olhar esperançado de todos.

Boio e olho o céu imenso, deixo-me abraçar pela água, relaxada, livre, descomprimindo destes meses de stress, como se o umbigo do mundo fosse aqui. Sabe bem ultrapassar barreiras e viver o hoje. Desocupar o cérebro, fazer um refresh na minha memória selectiva e deixar apenas a pele activa e sensitiva.

Acompanha-se a contagem decrescente com a chegada do CR7 ao estádio, oiço dizer. Splash, splash, splash em direção à pequena cascata com água mais fresca.

Os 50 mil adeptos estão do outro lado, nas bancadas, por aqui posso contar apenas os socalcos das margens deste rio, que assistem aos meus mergulhos numa piscina só para nós.

Portugal já está no relvado a aquecer.

Iremos ver ou não? eu sou mais água mergulhada, corpo refrescado, alma acariciada, silêncio e sorrisos. Chamam por nós, do outro lado do vidro panorâmico.

Ah, Oui, nous allons!

Cantam-se os hinos de Portugal e França e o jogo começa.

Os comentadores do sofá iniciam as suas apreciações, retirando-me a atenção do plasma. A cerveja roda e os petiscos tentam acalmar os mais nervosos, entretendo as mandíbulas. Alguns levantam-se e passam em frente ao plasma por segundos, dirigindo-se ao wc, porque a bexiga aperta. O CR7, ora é elogiado, ora é criticado. Entre herói e bandido assim se manifesta a ingratidão e o desespero tuga. 

Eu a escrever sobre futebol é coisa inédita. Aproveito todo este tempo, em que nada acontece e faço-o no telemóvel.

Assisto pela TV a estes campeonatos, precisamente porque o resto do ano, futebol é apenas 22 jogadores a correr atrás de uma bola, incapazes de atrair a minha atenção. Sobre vencedores e vencidos não faço distinção porque todos são atletas de alta competição capazes de gerar grande alegria ou grande tristeza, a multidões.

Reconheço e exalto não só as qualidades dos atletas assim como o esforço, dedicação e entrega total, todos os dias, para que depois possam jogar futebol para estádios cheios. Acordam cedo, sacrificam o convívio com família e amigos, e centram-se no seu foco, anos e anos, aguentando sucessos e derrotas sem desistir.

No final perdemos. Diogo Costa não resiste aos penáltis e João Felix, coitado, carregará para sempre a derrota de Portugal – a maré de sorte terminou. Os meus companheiros, já com a tensão arterial completamente desorganizada, e a tristeza a dominar as emoções fortes, inicialmente preparados para festejar a victória numa grande ceia, com o Douro nocturno como testemunho, perdem o apetite, vão saindo, cabisbaixos, dobrando as faixas e não combinando nada para os próximos jogos. Dirigem-se a casa, para repousar um sonho “Inderalmente” desenhado, sobre uma almofada de tristeza e frustração; mesmo assim, em nome de todos, registo um enorme “OBRIGADO” a esta equipa que deu tudo para ganhar, e perdeu.

Publicado em NVR, 10/07/2024


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