22 fevereiro, 2023

REPENSAR A GUERRA

 


Repensar a guerra

 

Estou sempre do lado das minorias e dos mais fracos, porém, simpatizo também com aquilo a que se chama diálogo, negociação, diplomacia e estratégia.

Sobre a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que virou indignação mundial, confesso que nunca esperei que se voltasse a repetir os mesmos erros do passado, e que já teríamos ultrapassado o conceito de guerra tradicional, a apreciação de quem é mais forte, de quem tem menos armas…. quem matou mais pessoas e quem tem mais pessoas para morrer. Pensei que as experiências ao longo do século XX e o terrorismo do século XXI, tinham colocado os humanos noutro patamar, possuía a esperança que tivesse havido mudança de mentalidades. Na verdade, não sou ninguém para opinar sobre quem tem razão, para apresentar argumentos sociais, políticos, económicos e históricos, porque até questiono o significado de razão e a sua utilidade. Considero que todos têm razão e ninguém tem razão. Sei que é uma luta entre um David e um Golias, sem Bíblia e sem calhaus, sendo fácil adivinhar que uma guerra nunca será um meio de encontrar soluções.

A reflexão que quero aqui trazer hoje, é sobre as visitas de Zelensky para angariar apoios. Ele parece uma estrela rock a angariar fundos para fome em África, todos os países o acolhem com simpatia e admiração e fazem promessas: armas e armas, tanques e leopards, armamento, tecnologia de guerra… e dizem que apoiam a Ucrânia até ao fim.

Promessa perigosa.

O que é esse fim? Como se define esse fim? Significa o quê? recrutar “carne para canhão” nos países europeus?

Alguém está disponível para mandar os filhos para a guerra da Ucrânia? Ir até ao fim, nunca ceder, nunca desistir é um orgulho idiota que passará pelo que referi, fornecer exércitos feitos de jovens, os nossos jovens. 

Nós, portugueses, não estaremos fartos de guerra? Tivemos uma guerra colonial com 3 grandes frentes africanas, que afectou directamente toda a população portuguesa. Isto foi há 50 anos – perguntem aos vossos pais e avós para saberem como foi.

O serviço militar era obrigatório e os jovens quando chegavam aos 20 anos, lá iam eles, quisessem ou não. Sabiam como iam, mas não sabiam como regressariam. Os que voltavam, poderiam voltar dentro de uma urna, numa cadeira de rodas, sem uma perna, ou voltavam, afectados psicologicamente para a vida toda. Nunca voltavam os mesmos, voltavam silenciosos, demasiado silenciosos e maduros. É isto o que querem? Querem despedir-se dos vossos filhos para sempre? Lembrem-se da descolonização, criticada por muitos, pouco entendida por outros, e lembrem-se que os nossos mancebos não queriam ir para a guerra, porque numa guerra há uma grande probabilidade de morrer.

Lembro os murais no ano de 1974 onde constava, NEM MAIS UM SOLDADO PARA A GUINÉ! que expressava o protesto contra essa guerra, o desagrado e a recusa em “alimentá-la”. Esta frase significa tanto… quem se lembra dela?

Para ganhar poupando vidas é preciso saber perder, despir orgulhos, acreditar na diplomacia que nem sempre estará alinhada pela justiça. Por vezes ser humilhado pode salvar vidas, para viver em paz e combater a falência humana.

Quando tomarem posição sobre esta ou outra guerra, interroguem-se sempre: “Se for o meu filho a ir para a guerra, mantenho a minha retórica? “

Pensem que aos almoços de Domingo serão menos à mesa. Sobrarão pratos e cadeiras. Já não existem aerogramas, nem correio, porém, na guerra não existe rede para telemóvel. Quando estiverem a fritar batatas, equacionarão, para quê, para quem, se ele(a) não está cá?! e então irão ver o álbum de fotografias de quando ele(a) era pequeno(a) com muita frequência, e mesmo sendo ateus, rezarão orações inventadas para ele(a) voltar rápido e pelo próprio pé. Viverão muitas horas em silêncio, de olhos fechados a recordar momentos e quando estiverem no meio de uma multidão, sentir-se-ão incrivelmente sós.  Iniciar-se-á um ciclo de alerta, passarão a ter sono leve e de poucas horas, sempre preocupados com o telemóvel que poderá tocar.

Nesta guerra e em todas as guerras é preciso repensar tudo. Os heróis só servem para fazer estátuas e os cemitérios estão cheios deles.

Publicado em NVR 22/02/2023


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