14 maio, 2025

O copo da ganância

 


O copo da ganância 

Estou saturada de campanhas eleitorais, do Senhor Almirante, do fumo branco do Vaticano, os resquícios do apagão, de almoços de família, então escrever o quê?

A antiguidade cada vez mais me inspira para reflectir e escrever. Partilho com o leitor o enigma do copo de vinho inventado por Pitágoras.

Pitágoras viveu entre o século V e VI antes de Cristo e para além de matemático, foi também filosofo. A maioria de nós ainda se lembrará da importância do seu teorema sobre o cálculo das medidas dos lados de um triângulo rectângulo - o quadrado da hipotenusa é igual à soma dos quadrados de cada cateto.

Pitágoras pretendendo ensinar aos seus discípulos a virtude da moderação, evocou um copo especial, que ficou conhecido por copo de Pitágoras, que denunciava a ganância das pessoas, ou mais precisamente, a falta de moderação e equilíbrio no consumo de vinho dos seus contemporâneos.

A ganância é uma forte vontade de obter aquilo que se admira, para si próprio, de uma forma insaciável - dinheiro, bens, poder ou uma vantagem qualquer que lhe convém. Esse desejo de acumular algo valioso, de forma excessiva ou desmedida, excedendo o necessário ou justo, leva o ganancioso a atitudes egoístas, impulsivas ou até anti-éticas. É um sentimento individualista em detrimento do bem comum, em que se desprezam as consequências para si ou para os outros, levando à degradação de valores morais do ser humano. Os seus autores cegos pela ambição podem recorrer a meios ilícitos para alcançar os seus objetivos - corrupção, a manipulação de pessoas e situações, competição doentia, fraudes e violência.

Este sentimento condenável também se pode aplicar a situações mais simples, como beber ou comer.

Voltando a Pitágoras, este terá inventado um copo e utilizou-o para ensinar aos seus discípulos, de forma divertida, a importância da moderação no consumo de vinho, com um dispositivo clássico da hidrodinâmica – a ética e a física de mãos dadas.

O copo de Pitágoras ou cálice da justiça é um dispositivo que utiliza o princípio do sifão. Funciona normalmente desde que o líquido não exceda um determinado nível. Acima desse nível o copo perde líquido, graças ao princípio dos vasos comunicantes. Dentro do copo há um tubo em forma de U que liga a base à borda. Quando o líquido ultrapassa um certo nível, começa a fluir através deste tubo, causando um efeito sifão que drena todo o conteúdo do copo, prevenindo o excesso de consumo.

A origem desta informação encontra-se no livro “Diálogos dos mortos” de Luciano de Samósata, com uma narrativa um pouco satírica numa outra situação, em que Pitágoras oferece ajuda a Eupalinos de Mégara, engenheiro e arquitecto, com uma solução para um problema que o afectava na construção de um aqueduto, pois os seus operários embebedavam-se e iam atrasando a conclusão dessa obra.

A imagem é elucidativa.

Eu diria, provérbio antigo: quem tudo quer, tudo perde.

Publicado em NVR 14|05|2025

 

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