26 março, 2025

PAPA-MUSEUS


 “Papa-museus” 

Alguma vez se sentiu cansado e frustrado depois visitar um museu?

Quem não?

Se é um “papa-museus” como eu, percebe certamente a que me refiro. Querer ver tudo em pouco tempo, rentabilizando ao máximo as visitas, exige boa condição física e intelectual, mas encerra com essa sensação.

Há pequenos museus e há museus megalómanos, e alguns ainda têm a própria arquitectura do espaço, que acrescenta obrigatóriamente muito interesse e atenção.

 O Museu do Louvre em Paris, é o museu mais visitado do mundo. A relevância arquitetónica do edifício e o seu espólio, implicam milhões de visitantes por ano; o seu acervo é de aproximadamente 38 mil objectos artísticos realizados desde a pré-história até o século XIX.

Quanto tempo seria necessário para ver todas as obras de arte do Museu do Louvre, com olhos de ver?

O Museu conhecendo esta problemática, já possui diversos percursos para que o visitante possa seleccionar o que mais lhe interessa e simplificar a sua visita.

Sabendo que nós, os seres humanos, apenas temos até 90 minutos seguidos de concentração (estou a ser optimista), o que nos restará depois de uma visita ao Louvre? Chegamos a um ponto e esgotamos a nossa capacidade.

As obras de arte estão nos museus, os livros nas bibliotecas…

Ninguém vai a uma biblioteca e lê todos os livros, porque um livro demora horas ou dias para ser lido. Para ver com olhos de ver uma obra de arte é algo semelhante. Reparem, quem fez uma pintura ou uma escultura demorou dois meses, um ano, dois? E nós demoramos menos de dois minutos para ver essa obra. Considero que é até ofensivo para o autor, porque não nos damos tempo para observar e interpretar a mensagem do mesmo, e muito menos elaborar a nossa interpretação. A superficialidade com que, muitas vezes, observamos as obras de arte, contrasta com o tempo que levamos para apreciá-las e com o tempo que os seus criadores dedicaram para produzi-las.

Talvez isto explique a nossa sensação de cansaço e frustração pela nossa falta de capacidade para absorver tanta informação.

As entradas nos museus raramente são gratuitas e a maioria das vezes, pretendemos aproveitar uma viagem, um passeio para visitar vários museus em pouco tempo. O que fazer?

1 - Deve preparar-se em casa, consultando informação sobre o que irá visitar. A internet é uma ajuda preciosa.

2- Utilize o áudio guia, para obter informação fidedigna e libertar o olhar durante a visita.

3 – Se for acompanhado, tente realizar o seu percurso autónomamente, porque irá ser mais proveitosa, utilizando o seu ritmo e tempo, consoante as suas preferências. Se tiver que ser acompanhado, escolha o amigo certo.

4 - Se entrar preparado, poderá considerar a hipótese de investir mais tempo nas obras mais significativas ou naquelas que mais lhe interessam, atendendo sempre à sua limitação em termos de concentração.

5 – Se tiver que dividir a atenção entre as obras de arte expostas e as características do espaço, por vezes peças de arquitectura únicas e muito especiais, e se permitirem recolha de imagens, não hesite em fotografar, para mais tarde poder rever a visita, activar a memória e melhorar a sua pesquisa posterior, se for necessária.

Na verdade, no final, se lembrarmos 10% do que vimos, já é muito. Acredito que uma boa visita é quando o impacto do trabalho que vimos permanece connosco por muito tempo. Ter o tal amigo por perto pode ser muito útil para trocar opiniões. Quando podemos mencionar algo para os amigos e conectá-lo com a nossa vida quotidiana, interiorizamos melhor o conhecimento, tornando-o mais significativo. Esse é o tipo de impacto que um artista quer ter.

Tente parar e reflectir sobre o impacto do que viu, o que significa para a sua vida quotidiana e na sua relação com o mundo – tenho o hábito de escrever sobre o que vi. O convite à reflexão após a visita torna-se um ponto crucial, pois a arte não é apenas para ser vista, mas para ser sentida e interiorizada.

Se lhe for possível, revisite obras especiais – a emoção talvez seja ainda maior. Além disso, a sugestão de revisitar obras especiais e reflectir sobre o impacto delas nas suas vidas é fundamental para criar uma conexão mais profunda com a arte.

Já repeti diversas vezes Vieira da Silva, Amadeo, Graça Morais, Batarda, Armanda Passos, Almada Negreiros, Chichorro, Nadir Afonso, Aurélia de Sousa, Cruzeiro Seixas,… aqui no nosso Portugal, enriquecendo-me cada vez mais nas novas visitas.

Partilho convosco uma obra muito especial, que merece muito tempo para observação, porque as mensagens e interpretações são inesgotáveis: “Tentações de Santo Antão” de Bosch exposto no Museu de Arte Antiga em Lisboa - é uma obra complexa e cheia de simbolismo, que realmente merece tempo e atenção para ser plenamente apreciada.

Publicado em NVR, 26|03|2025

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