03 fevereiro, 2021

ENTROPIA PSICOLÓGICA


 

Entropia psicológica

              Quando era jovem, surpreendi-me, quando me pediram para desenhar um triângulo equilátero e eu desenhei-o, com um vértice voltado para cima, completamente estável, apoiando um dos lados, no plano horizontal inferior. A análise desse acto espontâneo serviu para alguém me alertar, que estava despreparada para a mudança e para a instabilidade, e isso seria o que iria enfrentar no resto da minha vida. Talvez tenha sido uma das grandes lições de vida – um acto simples, que revolucionou o meu interior. Sou grata até hoje, a quem despoletou aquele meu desconforto interior, abalando todas as minhas certezas e todo o meu guião de vida, que eu entendia como bem planeado e infalível.

              Naquela época apesar de já ter sofrido algumas reviravoltas na vida, continuava a aspirar pela estabilidade e continuava sem preparo para enfrentar incertezas. A família protege-nos, criamos rotinas, desenvolvemos crenças e valores, mas, na verdade somos uma bolha de ilusão e de falsa estabilidade. O mundo encontra-se em permanente mudança e é necessário e urgente saber transformar a incerteza em equilíbrio mental, para não afundarmos na entropia psicológica, nestes dias feios da pandemia.

              E o que é a entropia psicológica?

              Entropia é um conceito com origem na termodinâmica, segundo o qual, os sistemas tendem a derivar para um estado de caos e desordem. Na psicologia, este conceito relaciona-se com quantidade de incerteza e desordem que existe dentro de um sistema e como somos capazes de encontrar equilíbrio no caos que nos afecta.

              A nossa mente possui algo de fabuloso, que é ser dotada de mecanismos, capazes de reagir contra a entropia. É o nosso instinto de defesa, que conserva a nossa identidade e o que nós somos, porém, o nosso mapa estratégico sobre o mundo e os nossos modelos cognitivos são insuficientes para nos antecipar e nos preparar para o que vai acontecer a seguir. E quanto mais violento e imprevisível é o que vem a seguir, mais facilmente nos aproximamos do caos da entropia, porque ficamos sem referências, sem tecto, e perdemos o sentido crítico para avaliarmos correctamente as situações.

              Só temos dois caminhos, ou cair no poço e afundar, ou tentar ficar à superfície, contrariando o processo, reorganizando o nosso interior e procurar novos pontos de equilíbrio, num contexto de tolerância da incerteza – é o triângulo com o vértice direccionado para a parte inferior, com equilíbrio estudado e tentado em continuidade.

              Toda a aprendizagem se faz nesta tentativa de equilibrar o triângulo invertido. Converter a dor em força, alinhando estruturas colapsadas, flexibilizando conceitos estáticos, transformando angústias e ansiedades em certezas provisórias, abrir a mente a novos paradigmas e apelar constantemente à nossa criatividade e renovação. Esta dialéctica de crescimento confere-nos maior riqueza interior e uma melhor adaptação ao mundo que não para, tornando-nos flexíveis e tolerantes. Chama-se a isto evolução consciente.

              Resistir à mudança é alimentar a nossa entropia psicológica, que está sempre preparada para nos acolher em estado depressivo, fechando-nos para a vida, retendo-nos no maior pântano de nós. Aprenda a compreender a incerteza e a viver bem com ela. O seu bem-estar depende dessa gestão equilibrada entre aquilo que somos e o que o mundo nos oferece.

Publicado em VR, 3/02/2021

1 comentário:

R, Figueiredo disse...

Mais um para a colecção. bj