20 janeiro, 2008

Estranha contabilidade

As escolhas envolvem um processo de decisão que implica sempre perdas.
Impossível evitar isto.
Quando eu decido caminhar no campo, tenho a oportunidade de ver flores, ouvir os passarinhos, respirar ar puro, … isto forma o meu ganho.
Mas como decidi caminhar no campo, recusando a outra opção que seria caminhar numa cidade, eu perdi a cidade. Com esta decisão eu perdi o fervilhar urbano, o café na esplanada, o grito do pregão …. Isto são as perdas.
Se tivesse optado por passear na cidade, as perdas inverter-se-iam com os ganhos.
(A contradança de perdas e ganhos. Parece balancete de contabilista.)
O problemático é nem sempre ganharmos e não podermos evitar as perdas. Estas estão sempre garantidas.
Se eu tenho dois caminhos à minha frente e me decido por um, estou a rejeitar o outro, ou estou a decidir não seguir o outro. E, ao seguir esse caminho deixo de ter a possibilidade de avaliar no final, se a minha decisão foi correcta, pois passo a ignorar tudo que me aconteceria pelo outro caminho, e assim deixo de ter termo de comparação, para avaliar correctamente, o mais e o menos.
Se perdi alguma coisa, não sou feliz.
E se não perder? Será que sou feliz?
Para não perder basta-me não escolher?
Mas posso perder na mesma.
A recusa de decidir e a recusa em fazer opções, não afecta o que nos rodeia: o tempo não pára, nem o mundo. Tudo continua a acontecer e apenas nos limitamos a deixar o universo, e a força que provoca o movimento do tempo, a decidir por nós. Porque mesmo que eu não escolha um caminho, eu estou num caminho, diferente de todos os outros, dentro da máquina do tempo que não pára de girar . ... e ... ainda existe tudo o resto que está fora desse caminho.
Não decidir é mais cómodo, desresponsabiliza-nos. Entramos na onda determinista, o que tiver que acontecer acontecerá e daí lavamos as nossas mãos. Sentimo-nos confortáveis, úterinamente protegidos, pelo menos por algum tempo, pois não tivemos que fazer escolhas, nem rejeições, e isso de certa forma anima-nos... mas as pangeias cá continuam a habitar dentro de nós, martirizando-nos com as perdas efectuadas, sem a nossa escolha, numa contabildade infinitesimal que nos afecta muito mais: o
desespero de não podermos escolher, de não podermos decidir, de nos retirarem a capacidade de sermos donos de nós.


2 comentários:

Anónimo disse...

Estranha mesmo, e não és economista!!!!
Sempre a rasgar!
T. P.

Anónimo disse...

AI! que coisa... odeio ficar com uma lagrima presa no canto do olho...





chata.