28 maio, 2009

II - Os princípios do conhecimento pertinente (2b)

A inteligência geral
O desenvolvimento de aptidões gerais da mente permite melhor desenvolvimento das competências particulares ou especializadas.
Quanto mais poderosa é a inteligência geral, maior é sua faculdade para tratar de problemas especiais. A compreensão de dados particulares também necessita da activação da inteligência geral, que opera e organiza a mobilização dos conhecimentos de conjunto de cada caso particular.
A educação deve favorecer a aptidão natural da mente em formular e problemas essenciais e, de forma abrangente, estimular o uso total da inteligência geral. Este uso total pede o livre exercício da curiosidade, a faculdade mais expandida e a mais viva durante a infância e a adolescência, que com freqüência a instrução extingue e que, ao contrário, se trata de estimular, caso esteja adormecida, despertar.
A educação do futuro, em sua missão de promover a inteligência geral dos indivíduos, deve ao mesmo tempo utilizar os conhecimentos existentes, superar as antinomias decorrentes do progresso nos conhecimentos especializados e identificar a falsa racionalidade.
A antinomia - para Morin, nos dias actuais, os sistemas de ensino comportam antinomias - contradições - criando e alimentando disjunções entre as ciências e as humanidades, assim como a separação das ciências em disciplinas hiperespecializadas, fechadas em si mesmas. Os problemas fundamentais da humanidade e os problemas globais estão ausentes das ciências disciplinares; o enfraquecimento da percepção global conduz ao enfraquecimento da responsabilidade (cada um passa a responder somente por sua tarefa especializada), assim como ao enfraquecimento da solidariedade (as pessoas não sentem mais os vínculos com seus concidadãos).

Os problemas essenciais
Disjunção e especialização fechada - hiper-especialização impede tanto a percepção do global (que ela fragmenta em parcelas) quanto do essencial (que ela dissolve).
Redução e disjunção - o princípio da redução (limitar o conhecimento do todo ao conhecimento de suas partes) leva naturalmente a restringir o complexo ao simples. Aplica às complexidades vivas e humanas a lógica mecânica e determinista da máquina artificial. Como a nossa educação sempre nos ensinou a separar, compartimentar, isolar, e não unir os conhecimentos, o conjunto deles constitui um quebra-cabeças ininteligível.
A inteligência compartimentada, parcelada, mecanicista, reducionista, enfim - disjuntiva - rompe o complexo do mundo em fragmentos disjuntos, fracciona os problemas, separa o que está unido, torna unidimensional o multidimensional.
É uma inteligência míope que acaba por ser normalmente cega. Reduz as possibilidades de julgamento correctivo ou da visão a longo prazo. Assim, quanto mais a crise progride, mais progride a incapacidade de pensar a crise; quanto mais os problemas se tornam multidimensionais, maior a incapacidade de pensar sua multidimensionalidade; quanto mais os problemas se tornam planetários, mais eles se tornam impensáveis.
A falsa racionalidade - ou seja, a racionalização abstracta, triunfa hoje em dia, por toda a parte, na forma do pensamento tecnocráta - incapaz de compreender o vivo e o humano aos quais se aplica, acreditando-se ser o único racional.
O século XX viveu sob o domínio da pseudo-racionalidade que presumia ser a única racionalidade, mas atrofiou a compreensão, a reflexão e a visão a longo prazo. Sua insuficiência para lidar com os problemas mais graves constituiu um dos mais graves problemas para a humanidade. Daí, o paradoxo:
- o século XX produziu avanços gigantescos em todas as áreas do conhecimento científico, assim como no campo da técnica. Ao mesmo tempo, produziu nova cegueira para os problemas globais, fundamentais e complexos, gerando inúmeros erros e ilusões.
(cont.)

1 comentário:

Pena disse...

Estimada Amiga:
Edgar Morin foi um vulto gigantesco do pensamento na sua época.
Dele conheço somente a obra notável, uma autêntica Bíblia humana, "O Paradigma Perdido", penso eu.
Do teu fabuloso texto, destaco pela importância subjacente ao racionalismo e preciosismo admiráveis, o que a seguir refiro, sem comentar:
"...A falsa racionalidade - ou seja, a racionalização abstracta, triunfa hoje em dia, por toda a parte, na forma do pensamento tecnocráta - incapaz de compreender o vivo e o humano aos quais se aplica, acreditando-se ser o único racional.
O século XX viveu sob o domínio da pseudo-racionalidade que presumia ser a única racionalidade, mas atrofiou a compreensão, a reflexão e a visão a longo prazo. Sua insuficiência para lidar com os problemas mais graves constituiu um dos mais graves problemas para a humanidade. Daí, o paradoxo:..."

A sua pseudo-raciolanidade causou-me imensos problemas, sim, Amiga admirável Anabela?
Sempre a estimar-te a respeitar-te.
Beijinhos amigos pela tua gigante significação genial...

pena