17 dezembro, 2025

Parque de estacionamento localizado junto ao Antigo Seminário.


 Parque de estacionamento localizado junto ao Antigo Seminário.

A arquitectura é uma arte que deve expressar a cultura e conhecimento da época em que é construída.

No tecido urbano histórico ou antigo, em alguns casos, poucos, faz sentido intervir arquitectónicamente por semelhança, utilizando a colagem ou o “pastiche” - obra que imita ou se inspira em estilos, formas e elementos de épocas anteriores, criando algo novo, mas com fortes referências ao passado.

Devemos considerar que também existe a integração por ruptura – a obra nova não tenta imitar ou mimetizar o contexto existente, mas afirma-se como uma peça distinta e contrastante, criando um diálogo visual através do contraste, não da harmonia superficial, unindo elementos de diferentes épocas ou estilos, mas deixando claro que são entidades separadas e contemporâneas.

Em todas as cidades, o ideal é que estas fossem pensadas com critério e lógica realistas, para que os parques de estacionamento, fossem invisíveis, pois são parentes pobres da forma e função das cidades antigas, mas de grande utilidade. Desperdiçou-se a oportunidade de ampliar o parque subterrâneo da Av. Carvalho Araújo, receia-se a construção de um parque subterrâneo ao longo da avenida 1.º de Maio, e por fim aparece este parque que constitui uma intervenção difícil e muito susceptível à critica. Do lado esquerdo existe o Antigo Seminário e do outro um edifício vulgar da “arquitectura a metro” dos anos 60/70, que naquela época, e infelizmente parece ter sido aceite pacificamente, apesar de ter em frente duas peças arquitectónicas do Estado Novo, belíssimas.

O Antigo Seminário com menos de 100 anos, segue um desenho clássico aplicado a grandes edifícios, utilizando um grande pátio interior, para organização da planta, assume timidamente alguns apontamentos de neogótico nos seus alçados, nunca ultrapassando o limite da sobriedade, talvez se identifique nas franjas do Ecleticismo. Nessa época o movimento da arquitectura moderna já começava a ter expressão no Mundo e até já tinha ocorrido o primeiro CIAM (Congresso Internacional da Arquitectura Moderna 1928), mas ainda não se praticava em Vila Real.

O autor do projecto do estacionamento, optou por utilizar uma linguagem contemporânea, não ofuscando o edifício do Antigo Seminário, através de uma volumetria cubista básica, que faz a transição entre as construções adjacentes, assumindo uma integração por ruptura, e bem, sem fazer grande espalhafato, mas assumindo a diferença de uma forma quanto a mim, bastante tímida e cautelosa. Teve ainda a preocupação de criar alçados onde predomina uma certa “transparência”, tentanto não subtrair importância ao edifício do lado esquerdo e à sua História.

Quando a arquitectura se assume em ruptura, deveria valer, por si só, como obra de arte de referência no mundo da arquitectura, ousada e original, capaz de criar o desejo de ser vista e revisitada.

Neste caso, infelizmente, nunca ninguém virá a Vila Real de propósito para ver o edifício de estacionamento, porque não se distinguem elementos capazes e mobilizadores. Nem a ideia dos alçados, que referi, criarem transparências, é inovadora (existe em várias cidades). Num primeiro olhar, esta intervenção nem é excelente, nem é fraquinha – talvez possua encantos escondidos. Não me indigna, nem me encanta, eu teria sido mais ousada e irreverente, para provocar “o ver de novo”, o amor ou o ódio, e nunca a indiferença, e certamente aproveitaria a cobertura, abrindo-a aos utentes.

A História da Arquitectura é este o caminho que nos indica. Vejam as grandes catedrais que unem vários estilos no mesmo edifício. Queriam o quê? Um parque de estacionamento com “cara” de Seminário, ou com um “lifting” que o aproximasse do modesto Hotel Miraneve? 

Publicado em NVR 17|12|2025


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