07 agosto, 2024

As cenas do Sena

 


As cenas do Sena

Tivemos oportunidade de assistir, em directo e gratuitamente, ao melhor e maior espectáculo do mundo concebido pelo Homem: A cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos Paris 2024. Foi mais emocionante estar lá a presenciar, mas sem dúvida os telespectadores receberam via TV, quase tudo para poderem ver do sofá. Se contarmos o número de espectadores presenciais ultrapassa em muito a lotação de um estádio, e Paris acolheu este evento de braços abertos, transformando a cidade num mega-estádio. A ideia do desfile no rio Sena e mostrar ao mundo os valores da cultura francesa, foi genial. Não há outra palavra para definir o conceito. Mostraram Paris aos atletas, mostraram os atletas a Paris e ao mundo, e em segurança. Excelente.

Quando me apercebi, estava a fotografar as imagens transmitidas na televisão, isso significa que me entreguei ao evento, com Paris no coração, resultado da ampliação de um imaginário olímpico, nunca visto anteriormente.

A cerimónia rejeitou a vulgaridade e cada detalhe constituiu uma surpresa e uma referência ao conhecimento da Cidade Luz, não esquecendo uma pitada de humor saudável e de irreverência. Paris passou a ser um teatro de céu aberto, onde a Liberdade, Igualdade e Fraternidade foram os valores que uniram as pontes do Sena com o resto do Mundo, demonstrando o vigor de Paris de Haussmann, de Eiffel e de outros eixos da sua história. A História, os valores, a arquitectura e todo o glamour parisiense, foram a plataforma estrutural dos atletas medalhados que concluíram o percurso da chama Olímpica – Zidaine, Nadal, Nadia Comaneci, Carl Lewis, e muitos outros… para-olímpicos e quase no final, um atleta de 101 anos, Charles Coste, do ciclismo, o mais velho campeão Olímpico francês ainda vivo, medalha de ouro em Londres 1948 passou a chama a Teddy Riner e Marie José Perec que acenderam à Pira Olímpica dando origem a imagens únicas, içada num balão como homenagem ao primeiro balão de hidrogénio da história, construído por Jacques Charles, nos Jardim das Tulherias em 1783.

Nada foi referido ao acaso, cada detalhe foi uma fonte potencial de informação e de inspiração – a fasquia elevou-se.

A representação da “Festin des Dieux” por drag queens, confundiu padres e bispos franceses, já pensando que era a Última Ceia (e se fosse? ambas são representações fictícias concebidas pela imaginação do autor), provocando-lhes uma azia descabida. O Papa Francisco penso que nem reagiu, porque felizmente sabe contar, e percebeu pelo menos que, atendendo ao número de personagens, não seria a Última Ceia…. Enfim, Paris é tudo isto, inclusivamente motivar o questionamento. Porém… os narradores televisivos poderiam aqui ter um papel mais assertivo na partilha de conhecimento, para não confundirem mitologia com cristianismo.

Momentos de maior destaque:

1 - Os Gojira, a primeira banda de heavy metal a participar neste tipo de espectáculo, e as muitas Marias Antonietas decapitadas nas janelas do edifício Conciergerie segurando a sua própria cabeça, enquanto aparecia a palavra “liberdade”, a primeira do lema da França, que é “Liberdade, Fraternidade e Igualdade”.– para mim é a imagem preferida.

2 - As dez estátuas de mulheres, grandes francesas da História que vão ficar para sempre nas margens do Sena.

3 - O atleta, ou atletas personificados pelo “mascarado” ou “encapuzado” sem rosto, que percorreu os telhados de Paris segurando a tocha, transmitido em paralelo, e que ia apresentando espaços icónicos de Paris. Quem era ele, ou eles? Homens e mulheres desconhecidas… pela mobilidade, pareciam ser atletas de Parkour, personificando o “mascarado”, o apelido carinhoso do próprio personagem principal de “O Fantasma da Ópera”. Não era Arno Dorian, O Homem da Máscara de Ferro, Fantomas e Arsène Lupin, era, na verdade o Fantasma da Ópera.

4 - O cavalo metalizado que corre sobre o Rio Sena, da Ponte D'Austerlitz à Ponte D'Iéna, propagando o espírito olímpico, foi um apelo à paz e à solidariedade. Um “cavalo de metal”, com 1,80m de comprimento, foi a "encarnação" de Sequana. Na religião galo-romana, Sequana era a deusa do rio Sena e da resistência. O cavalo foi equipado com um sistema de flutuação criado especificamente para as necessidades da cerimónia de abertura, pelos arquitetos navais de Quiberon, na Bretanha. O mecanismo transcreveu os movimentos do galope de um cavalo com a maior precisão possível. E finalmente a evocação a Joana D’Arc, mártir, padroeira e protectora da França, aquela a que muitos chamaram erradamente amazóna.

5 – A construção das medalhas, feitas a partir de materiais da Torre Eiffel.

Para finalizar, uma nota para aqueles que encontraram defeitos em tudo, que odiaram, que pretendiam ver uma espectáculo tradicional, que nem fazem contas ao número de participantes. Interpretaram a Última Ceia, quando não era, que acharam ofensivo a Mona Lisa a boiar no Sena e as Marias Antonietas à janela, que não gostaram da Celine Dion, não gostaram do Zidaine, e também não gostaram de tudo…. Bom, na verdade, a maioria dos críticos ferozes, odeiam a tolerância, a inclusão, a diferença e o grande problema é o ideal de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, sempre actual e que lhes provoca muitas comichões.

Publicado em NVR 7/08/2024

4 comentários:

Anónimo disse...

Muito bem. É sempre um prazer ler o que escreves.

Anónimo disse...

Muito bem ,é sempre um grande prazer ler o que escreves!
ADOREI.

Anabela Quelhas disse...

Grata pela mensagem.

Anabela Quelhas disse...

Grata pela mensagem