10 novembro, 2021

HIKIKOMORI

 


HIKIKOMORI

            O termo hikikomori é japonês e significa pessoas isoladas do mundo, os eremitas do século XXI.

            Nunca a Terra esteve tão conectada como agora. Juntar velhos amigos espalhados pelo mundo, nunca foi tão fácil como agora, basta acertar a hora para todos estarem acordados e on line.  Mesmo assim há pessoas isoladas no seu quarto que preferem não arriscar a passear no parque num dia cheio de sol; preferem afundar-se nessa conectividade que o mundo digital oferece, e enganando-se, afloram no mundo do isolamento.

            São os emails, as redes sociais, os twitters, os blogues, os canais que ligam as pessoas de todo o mundo, que redesenham o mundo contemporâneo. Já não existem momentos da família, horas de refeições, nem tempos de lazer...  em qualquer momento o nosso telemóvel dá sinal que alguém se conectou connosco em tempo real. Este exagero ou facilidade em invadir o nosso mundo privado e o nosso tempo, tem o reverso da medalha. Ele pode ser tão absorvente, que nos agarra e não nos larga mais. Em vez de conversar com pessoas de carne e osso, conversa-se através da web, com milhares de pixéis coloridos. Um cabo, onde circulam as conversas, dá ligação a todo o mundo em segundos e tem capacidade para gerar uma verdadeira obsessão no utilizador, para estar sempre conectado, desligando-o do mundo real e do contacto social.

            Os hikikomori mergulharam no digital e passaram a ser realmente sozinhos, permanecendo em casa, de preferência no quarto, por tempo indeterminado. Esta é uma vida que pode ser camuflada, porque efectivamente vivemos na era do conhecimento que circula na net, e os equipamentos digitais já fazem parte da nossa vida... passar 5 ou 6 horas por dia a trabalhar no computador por exigências de algumas profissões, parece normal, e agora, em tempo de pandemia, as pessoas aceitam trabalhar a qualquer hora, esticando essas 5/6 horas para 8, 10, 12 horas e depois, em atitude nada saudável, ainda somar o lazer que recorre também ao mundo digital, já se desvia do aceitável.

            Numa fase inicial, a maioria dos hikikomori não têm consciência que o são. Acontece com frequência na faixa etária juvenil e quando os pais se mostram preocupados, acabam por ser acusados de pais analógicos, cotas ultrapassados, incapazes de entender os nativos digitais.

            O alarme está dado.     

            No Japão, meio milhão de pessoas vivem isoladas. Não vivem sós, mas vivem isoladas, sem ter essa percepção de viver uma espécie de fobia solitária, sem pedir ajuda.

            Há poucos estudos sobre esta doença. Do que se conhece, parece ser uma doença urbana, porém, mais localizada nas zonas urbanas, com poucas atividades culturais e sociais, situações que favorecem a vida enquadrada entre quatro paredes. Normalmente são pessoas que já passaram pela consulta psiquiátrica, abandonaram os estudos e tendem para a auto-mutilação, apresentando transtorno obsessivo-compulsivo. Depressão, esquizofrenia e ideias suicidas são muito mais predominantes nesse grupo.

            Os hikikomori, numa fase já tardia, estão agudamente cientes da sua própria dor. O sentimento de culpa por submeter a família aos seus caprichos, atormenta-os, mas não lhes dá impulso para assumir o problema e contrariá-lo. São reclusos das suas próprias casas.

            A condição de hikikomori requer intervenção activa e rápida, invés de se considerar como um estilo de vida, que não é.

Publicado em NVR, 10/11/2021

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