06 abril, 2018

a coisa aqui está preta



a coisa aqui está preta

               
Um caso, o Brasil.
                Quando era jovem achava que o Brasil seria o sítio ideal para eu viver, já que não poderia viver na terra onde nasci. O Brasil parecia-me bem, pelo calor, pela língua, pela gastronomia, por Jorge Amado, por Chico Buarque de Holanda, por Augusto Boal, por Óscar Niemeyer, pelo movimento Tropicalismo, pela praia, pela fruta tropical, pelo Carnaval, pela Amazónia, por Manaus, por Pélé, por Brasília, pelo Rei, pelo samba, pelo forró, pelo chorinho, pelo artesanato, pelas telenovelas, pela água de côco, pelas redes para dormir, por Juscelino Kubitschek, pelas sandálias prateadas de salto alto, pelos batuques, pelas baianas, pelos terreiros, pelo Zé Carioca, pelo sotaque doce, por Salvador da Baía, pela simpatia de alguns malandros, pela garota de Ipanema, pelos candomblés, pelos bolos de fubá, pela Gabriela, pelo Mundinho e pelo Tuísca, pela capoeira, pelo Sr. do Bonfim, pelos discursos dirigidos ao povo de Sucupira… achava que o “design” daquele país encaixava como um puzzle em Angola, o que reforçava a meu favor a divisão da Pangeia.

…. E o meu pai, afirmava: Brasil nem pensar!
                                               … dizia: O Carnaval do Rio é o espectáculo mais perigoso do mundo, são assassinadas (não sei quantas)??? pessoas por dia!

                Mesmo assim, achava que o meu pai tinha prazer em me contrariar.
                Ao Brasil só lhe encontrava um defeito: o mar ter nascer do sol e não ter pôr-do-sol, pois um pôr-de-sol sobre o oceano é o melhor e maior espectáculo do mundo. Dura poucos minutos, mas mesmo assim, é o top.
                Percebi quem era o tal Militar João Figueiredo, a ditadura, o tempo dos coronéis, os jagunços, a violência gratuita, as clivagens e as desigualdades sociais, a corrupção, os cartéis da droga, os índices de analfabetos, as favelas, a desvalorização da vida, o desconforto das denúncias do PT, o desmatamento da Amazónia, o Collor de Mello, o Michel Temer, os milhões de pobres…
                … encantei-me com a Rosa de Hiroshima de Ney  e dos seus Secos e Molhados, gargalhei com o Caco Antibes e Ribamar, trauteei os Mamonas Assassinas, Gabriel o Pensador, admirei Lula e Dilma, surpreendi-me com Millor Fernandes, descobri Augusto Cury e a “Saga de um pensador”.
                Percebo todos os dias a manipulação da opinião pública através dos media, vivo sempre na dúvida e preocupada em separar a mentira da verdade, ou a quase verdade da inverdade incompleta. Não é tarefa fácil.
                Um caso, o Brasil, com o melhor e com o pior – uma situação explosiva num país, onde se jogam inúmeros interesses. Aparecem na TV comentários lúcidos, esclarecedores e coerentes, outros que denunciam pouca cautela para com a situação

“Aqui na terra tão jogando futebol
Tem muito samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias chove, noutros dias bate o sol
Mas o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta
Muita mutreta pra levar a situação
Que a gente vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai tomando que também sem a cachaça
Ninguém segura esse rojão (…)
(Meu caro amigo – Chico Buarque)

Escrito às 21h de 6/04/2018, preocupada, aguardando os acontecimentos.

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