30 junho, 2024

Quando a obra de Cargaleiro foi a minha inspiração.


 Quando a obra de Cargaleiro foi a minha inspiração.

28 junho, 2024

CIRCUITO INTERNACIONAL DE VILA REAL

 Faz-me falta a música dos motores


Republico texto de 8/10/2007

https://estiradorsemrima.blogspot.com/2007/10/faz-me-falta-msica-dos-motores.html

Camaro lindo

Republico um texto de 11/07/2015.

https://estiradorsemrima.blogspot.com/2015/07/camaro-lindo.html



hoje é mais sentada num sítio confortável, com muito gelo no copo à sombra e ou a ver na televisão... nunca vi as contas do evento, se dá lucro ou prejuízo, e neste momento isso já não me interessa muito, porque a identidade de uma região constrói-se  e nem sempre é gratuita. São emoções que  ficam para a vida na memória colectiva.

Circuito Internacional de Vila Real.


27 junho, 2024

26 junho, 2024

Há dias tristes que não deviam existir.

 

Há dias tristes que não deviam existir.

Conheci-o já eu tinha 12 anos, em Coimbra, porque foi assim que os desencontros da vida decidiram.

Homem sóbrio, discreto, frugal, bonito, inteligente, informado, modesto, altruísta, humanista, com sentido de humor e nunca perdeu uma certa ingenuidade, apesar da vida longa.

Até ao final da vida partilhou o seu conhecimento científico de forma simples e informal, com rigor e detalhe, revelando o seu gigante mundo de saber e boa memória.

Recordo-me dele em diversas circunstâncias, Coimbra, Bragança, Viseu e finalmente em Vila Real.

Médico de profissão, formado em Coimbra e na Suíça. Não hesitava em socorrer quem lhe pedisse ajuda. Salvou vidas, muitas. Casos que pareciam impossíveis e perdidos, ele puxou-os para a cura, conferindo-lhes muitos anos de vida. Poderia exercer a sua profissão nos melhores hospitais do mundo, mas ele tendia sempre para trás do Marão, para tratar pessoas com poucos recursos.

Possuía mãos grandes, e bem desenhadas, eu seria capaz de as identificar em qualquer lado, ágeis e de grande precisão. Treinava o bisturi na linha recta. Achava-se feio, quando era um homem elegante, belo, distinto e cavalheiro.

Tinha um orgulho desmedido das suas origens e um amor eterno pelo sítio onde nasceu, a aldeia de Justes.

Sobreviveu à maior perda que se poderá ter na vida, um filho.

Era um homem de afectos, penso que o seu maior afecto seria o seu amor e dedicação pelo ser humano e a forma de o tratar através da medicina. À noite era incapaz de se deitar sem ir ao hospital visitar os seus pacientes e logo de manhã, voltava. Aparecia discretamente, silencioso à porta do quarto ou enfermaria, falava baixo, revelava tranquilidade e isso dava aos pacientes um conforto e segurança enormes.

Também gostava de cães e plantas, sabia imenso sobre botânica e mineralogia.

Ele foi um dos meus primos mais velhos e apesar da diferença de idades e da minha pouca experiência na época, confiou-me a concepção arquitectónica da sua casa, que tentava harmonizar uma quinta na margem esquerda do rio Corgo, com todas as árvores e arbustos autóctones ou que habitavam na sua imaginação. Foi projecto que nasceu e cresceu com muita conversa entre os dois, reflexões e opiniões diversas sobre tudo; eu sempre admirando a sua sabedoria multifacetada, ele corajosamente entregando-se à minha criatividade e aos traços que iam nascendo no meu estirador.

Fez-me perder o receio de tocar no seu cão enorme, mastim espanhol, que quando o visitava, tentava meter a cabeça enorme na janela da minha 4L, para me lamber, e não cabia.

Adorava andar em obras e tinha bom gosto. Partilhava por vezes uma velharia ou outra, que lhe vinham ter às mãos, revelando a sua sensibilidade e conhecimentos artísticos. 

Andar com ele de automóvel, parecia que andávamos sempre em veículo de emergência.

Nos piores momentos da minha vida, foi sempre uma plataforma de apoio e conforto, que nunca esquecerei e lhe serei eternamente grata. Fez de otorrino, obstetra, ortopedista, internista, psicólogo, nas horas que calhava… Nos últimos anos lia o que eu escrevia neste jornal e telefonava-me por vezes a elogiar ou comentar: “Quando te leio, parece que estás a falar comigo. Escreves como falas.”

Visitava-o, a conversa agigantava-se, adorava que eu partilhasse peripécias da aldeia onde nasceu ou situações que lhe fizessem recordar a sua infância e a nossa família. A risada nascia e crescia. Falávamos também de pessoas antigas, descodificávamos a nossa genealogia, os tios, os primos, os avós e bisavós. Dizia-me sempre que o meu pai era apaixonado pela minha mãe e que se recordava deles a namorar.

Eu baralhava sempre o dia do seu aniversário, porque eu e outros familiares nascemos em Março, e normalmente lembrava-me sempre com um dia de atraso. Imperdoável.

Finalmente um elogio à sua companheira, que nos últimos anos de vida, se excedeu sempre em carinho, protecção, paciência e zelo.

            Há dias tristes que não deviam existir.

Escolheste o dia dos médicos para nos deixar. Vou ter saudades tuas, até sempre, Otílio. (18/06/2024)

Publicado em NVR- 26/06/2024

RIP  (Requiescat in pace) - Otílio Palheiros Figueiredo

Te revi em todas as tardes

 


25 junho, 2024

os meus livros na Rádio Portimão

 Amanhã, ligue a net na Rádio Portimão e por volta das 15h irão falar sobre os meus 3 livros. Para quem quiser ouvir em diferido, partilho o link logo que me disponibilizem.

A musica é excelente e lusófona.




24 junho, 2024

Justes no seu melhor

 

Na noite de S. João acautelavam-se os vasos que normalmente embelezavam as varandas e escadas exteriores, porque nessa noite eles desapareciam. Os rapazes juntavam-se e nessa noite escondiam todos os vasos que encontravam. Ainda dava trabalho. Era preciso arranjar um palheiro ou armazém para os esconder, transportá-los em silêncio, regá-los se por acaso decidiam esconde-los por mais de um dia.

Isto gerava sempre um grande falatório na aldeia, todos a fingirem-se incomodados pelo desaparecimento dos seus vasos, sabendo perfeitamente que mais dia menos dias ele apareceriam.

Depois apareciam todos juntos num canto qualquer da aldeia, normalmente junto ao chafariz ou nas Fontes e cada um tinha que os transportar para casa.

Houve alguns anos em que retiravam da loja, os burros de quatro patas, e amanheciam numa varanda. Sempre admirei estes foliões porque carregar um burro para uma varanda não era fácil.

Santos Populares







Vila do Conde

Póvoa de Varzim



 

Quadras de S. João

 Com Gaia do outro lado

Festejamos o S. João

Sardinhas e sangria

Broa, como pão.

 

Não falta o manjerico

Nesta hora da ceia

A tua mão na minha

Até Cassiopeia

 

A cidreira e as plumas

Dão-me vontade de espirar

Vamos até à cascata

Para comemorar.




22 junho, 2024

GEOMETRIC Montmartre


 Montmartre 

Paris

Onde fica a casa do meu amigo


 Revi em boa companhia - cinema sem pipocas.
Responsabilidade e amizade.


19 junho, 2024

A arquitetriz

 

Só para bookaholics

O VELHO NOVO E ÚNICO

 









RECRUTAMENTO DE PROFESSORES - promoções

 


RECRUTAMENTO DE PROFESSORES - promoções

(Brevemente saldos e black friday).

Lembraram-se agora de retirar o serviço administrativo...

Primeiro cansaram-se os professores, congelou-se o tempo de serviço e logicamente as carreiras, aumentou-se-lhes os horários com o truque da componente lectiva e não lectiva, depois promoveram-se avaliações entre pares para todos andarem à porrada, branquearam-se os problemas disciplinares dos alunos, deixaram que os pais opinem sobre tudo em grupos de watts app, acolhendo queixas e reclamações e depois tentam cativar os professores exaustos com 750€ ilíquidos.

Primeiro ri e depois continuei a rir, conforme chegavam reacções ao meu telemóvel. Contar com os professores aposentados ou com os que têm idade para se aposentar não é solução.

O ministro, este e os anteriores, ainda não percebeu que existe uma verdadeira exaustão por parte dos professores mais velhos, e que se deve a diversos factores entre os quais esta profissão ser, efectivamente, de desgaste rápido e todos anseiam ir embora, sair do Sistema porque não aguentam mais. Depois dos 60, os professores estão tão cansados, que é visível para a família destes, sim, porque os professores também têm família, que dificilmente os apoiarão a regressar às aulas ou a prolongar a profissão; os problemas de saúde surgem em catadupa, como costumo dizer “se não é do cú, é das calças”.

Recorrer a professores já reformados, aproveitar os imigrantes que eram professores nos países de origem e atribuir 2 mil bolsas a alunos que escolham os cursos de ensino são algumas das ideias do Governo para combater a falta de docentes, poderiam ser ideias geniais, mas não são. Ou a profissão é altamente valorizada, dignificada, respeitada e protegida, ou nada feito.

Já todos perderam a paciência ao serem desrespeitados em sala de aula, anos e anos seguidos. Ninguém está para se aborrecer com os excessos que se cometem:

·      Confrontar alunos devido ao telemóvel?

·      Interromper aulas a cada 3 minutos para exigir silêncio e concentração?

·      Ser insultado e ameaçado?

·      22h de aulas semanais mais apoios que em muitos casos se convertem em aulas?

·      Computadores velhos e internet lenta para atrapalhar toda a gente?

·      Salas de aulas geladas no Inverno e sufocantes no Verão?

·      Directores a mandar nisto?

·      Inspectores a quererem mostrar serviço?

·      Agrupamentos de escolas para agigantar problemas?

Alguém acredita que contratar professores emigrantes será bom? Lembrem-se que exigem a todos os professores, que sejam professores de português – iremos ter o português brasileiro e o português do Bangladesh? Será bom? Deixamos de ser exigentes?

“Quase mil alunos estiveram desde o início do ano letivo até Maio pelo menos sem aulas a alguma disciplina: Português e Matemática estão entre as mais afetadas pela falta de docentes.”

E as horas extra?

Quem aguenta fazer horas extra com o mesmo rendimento na aprendizagem? Acham mesmo que será uma solução? Quem aguenta ter mais de 5 tempos letivos por dia?

Prevê -se aumentar até 10 horas semanais extraordinárias o que representa perto de 50% de horas a mais. Quando eu tinha 20 anos teria sido um desafio interessante, desde que bem pago, agora é impossível.

Sr. Ministro é preciso muito mais! É preciso uma reforma profunda em todo o Sistema para devolver a essência da missão da escola, que é ensinar e que envolve muitas vertentes. Ensinar e educar, que parecia tão bem em qualquer projecto escolar, não deram bom resultado. A Escola não pode ser o cadinho de todos os problemas da sociedade. Ensinar tem que ser o foco. O professor não pode perder-se em tarefas burocráticas repetitivas e desgastantes, justificar o que está bem e o que está mal em 3 ou 4 documentos, que ninguém lê.

Comeram a carne aos professores e agora querem roer os ossos e acabar com a carcaça. Pôssa, quero ir embora!

Publicado em NVR em 19/06/2024

16 junho, 2024

13 junho, 2024

SARDINHAS

 Comer sardinhas assadas, sem ficar com o cabelo a cheirar a elas, não é para quem quer, é para quem pode. Aconselho e em boa companhia. .



12 junho, 2024

STO. ANTÓNIO


 Sto. António

Para desfazer equívocos, Sto. António de Vila Real, de Lisboa e de Pádua são o mesmo Sto. António, que nasceu e viveu em Lisboa e depois viveu e morreu em Pádua. Ao longo de sete séculos, as duas últimas cidades argumentaram e competiram entre si sobre a ligação a Sto. António, até que o Papa Leão XIII, para acabar com competições e teimosias sem sentido, declarou-o “Santo de todo o mundo”; talvez tenha sido o primeiro cidadão do mundo, reconhecido já morto e sem nunca saber se o mundo (Terra) era redondo ou plano.

O facto de carregar uma criança que dizem ser o Menino Jesus pode parecer que este santo terá sido contemporâneo de Jesus Cristo, mas não é verdade. António, ou seja, Fernando de Bulhões, o seu verdadeiro nome, nasceu em Lisboa, 1191 anos depois de Cristo: Como currículo breve sabemos que nasceu numa família nobre, pertenceu à Ordem Franciscana, buscava a simplicidade e a introspecção. Pregar sobre as Escrituras era a sua especialidade, levando-o a Pádua. Homem de grande cultura, deve ter sido um dos maiores intelectuais da Igreja Católica do seu tempo. Leccionou em universidades italianas e francesas e foi o primeiro Doutor da Igreja Franciscana. Faleceu em Pádua e foi canonizado, por ser considerado uma santidade. É curioso que quando o seu corpo foi transladado, descobriu-se que tinha a língua intacta, o que provaria que a sua pregação era inspirada por Deus.

Conhecemo-lo como um dos santos populares, porém tinha uma cultura literária invulgar, referenciando, para além da Bíblia, filósofos importantes da Antiguidade. Os seus sermões, para além da vertente cristã e evangelizadora, documentam uma época com a sua evolução social, económica, laboral e até urbanística; condenam a inveja, a avareza, a exploração do outro, a inveja, a falta de ética e o egoísmo - valores transversais a muitas épocas e sociedades, e sempre actuais. Os seus sermões serviram de inspiração a Padre António Vieira, louvando as virtudes dos seres humanos e censurando o que considerava ser o vício dos colonizadores (século XVII).

 É padroeiro dos amputados, animais, estéreis, barqueiros, idosos, grávidas, pescadores, agricultores, viajantes e marinheiros, cavalos e burros, pobres e oprimidos; é invocado para achar coisas perdidas (responso de Santo António), para conceber filhos, para evitar naufrágios e casamenteiro. Santo mais polivalente não há, não sei como pode tomar conta de tantas tarefas.

O homem culto e activo apresenta-se com um menino de tenra idade ao colo. O que representa aquele menino? Os crentes dizem ser o Menino Jesus, e quando este tem o menino do lado direito está representado como casamenteiro e quanto tem o menino do lado esquerdo como milagreiro.

    O seu significado perde-se no tempo, há várias interpretações, umas mais ingénuas do que outras, porém, o que aparentemente significa é uma profunda ligação deste franciscano ao cristianismo, numa fase de expansão do mesmo (Cruzadas século XI a XIII), em que o menino significa rejuvenescimento e força de uma doutrina.

Santo António do mundo, de Lisboa ou de Vila Real

Também tens fama de casamenteiro

Se o casamento fosse coisa sensacional

Tu próprio não ficavas solteiro.


Publicado em NVR em


11 junho, 2024

A SALA DE PROFESSORES

 


“A SALA DE PROFESSORES”

UM FILME DE ILKER ÇATAK

Ficção | Alemanha | 2023

Com: Leonie Benesch, Michael Klammer, Eva Löbau, Leonard Stettnisch

Carla Nowak, uma professora dedicada de Educação Física e Matemática, inicia o seu primeiro emprego numa escola secundária. Destaca-se dos outros docentes graças ao seu idealismo. Quando há uma série de roubos na escola e se suspeita de um dos seus alunos, ela decide investigar o caso. Carla tenta mediar entre pais indignados, colegas obstinados e alunos agressivos, mas vê-se implacavelmente confrontada com as estruturas do sistema escolar. Quanto mais desesperadamente tenta agir de forma correcta, mais a jovem professora aproxima-se do seu limite.

Oscares: nomeação para melhor filme internacional.

*****

Recomendo pelo seu realismo e porque abre vários caminhos de reflexão.


10 junho, 2024

faz 50 anos

 FAZ 50 ANOS


De crisálida a borboleta

 

              Há vinte e quatro horas, eu era uma adolescente alegre, despreocupada, feliz e hoje transformo-me numa mulher. Despi a adolescência em Luanda, pouco antes de entrar no Aeroporto Craveiro Lopes, com destino a Lisboa, já sem esperança de regresso breve. Abandono essa fase de transição da vida e adquiro competências rápidas para aceder à maturidade social.

              Entro na idade adulta, tal como uma crisálida que se transforma em borboleta, da noite para o dia, encurtando preguiças, dúvidas juvenis, inseguranças, rebeldias e acelerando a autonomia, a tentativa de um maior discernimento e responsabilidade da maturidade.

              É nesse estado do meu desenvolvimento holístico que entro no avião, desconhecendo onde me levará esta metamorfose activa que levo comigo.

              Tento resistir ao choro. Não entendo esta retirada precipitada, desconheço razões que justifiquem a determinação do pai em sair e não voltar a Luanda, após as férias. Despedi-me da minha cidade, contrariada, receando nunca mais ver os meus amigos. Nasci e vivi em Luanda os últimos anos. Sete anos, os melhores anos da minha vida, com o desabrochar da minha personalidade, da minha rebeldia, o desenho das minhas convicções e valores, numa cidade encantada, cheia de contradições e de assimetrias, mas motivadora, exuberante, apostada em crescer e em desenvolver o potencial de um território.

              Após a ceia servida a bordo, já passa da meia-noite, os pais tentam dormir. Fingimos dormir. De olhos fechados, penso em tudo que se passou nestas últimas vinte quatro horas e a despedida inesperada da cidade de Luanda, determinada pelo pai, mês e meio após a Revolução dos Cravos[1]. Luanda parecia serena e tranquila, reinava a paz em todas as ruas, porém, o pai considerou que retirar a família para a Metrópole, agora, é a decisão mais sensata e assertiva.              

              Fingimos dormir. Sim, fingimos. Como alguém poderá dormir vivendo este trambolhão impensado? Ao contrário das outras viagens de avião, não me interessa em que lugares viajamos, se vou ou não à janela, nem presto atenção a ninguém. Faço um balanço da minha vida e das inseguranças que me invadem nestas últimas horas, de olhos fechados tento controlar a minha respiração, tornando-a aparentemente regular, cadenciada e serena. Sinto que parte da minha vida foi amputada sem eu perceber as razões, e esta ferida marcar-me-á para a vida. Não me matará, mas irá moer-me toda a vida sem escolher hora ou local.

              Não consigo projectar-me no futuro, prever o que acontecerá em Setembro, quando se iniciar um novo ano lectivo, e como me irei organizar. A caminho do aeroporto, o meu pai deu indicações precisas à minha irmã que ficou em Luanda, para ir ao liceu, obter o meu certificado de habilitações do 6º ano / 1º ano do Curso Complementar e enviar com urgência para a Metrópole.

              Vou dormitando por cansaço, encostada ao braço do pai, ou melhor dizendo, o sono tropeça em mim ao longo da noite. A minha cabeça parece um labirinto de ideias e situações que me empurram para este amadurecimento repentino e prematuro, que se traduz anatomicamente, num brutal nó na garganta. Apesar de contrariada, ainda no interior do avião, decido não pressionar os pais com o regresso a Luanda. Esta mudança repentina na nossa vida, deve ser ainda mais penosa e complexa para eles, que já têm cinquenta anos e grandes responsabilidades. Aguardarei serenamente, tentarei não criar conflitos, fingirei até algum entusiasmo para que não se preocupem comigo. Terei de aprender a digerir tudo sozinha. Serei uma óptima aluna para fazer o meu curso rapidamente, se o pai conseguir suportar as despesas, confio que sim.

              Chegamos a Lisboa, sem grandes conversas, uma viagem inundada por mutismo e pessimismo. Esta viagem não se reveste de alegria nem de entusiasmo, como todas as anteriores, em que eu exteriorizava por excesso, a minha adolescência divertida e irónica. A minha metamorfose despe-se de amigos e conhecidos, recheando-me de um grande vazio existencial e revolta, sem saber o que será o meu futuro e o da minha família e o que faço ao passado. Parece-me que dispo uma túnica leve e fresca e visto uma camisa-de-forças, contendo-me, apertando-me e sufocando-me. Não me foi dado poder de decidir sobre ficar ou partir, porque apenas tenho dezasseis anos e não sou autónoma.

              Em Lisboa, não vejo militares nas ruas, nem cravos nas mãos das pessoas, como eu imaginava, vejo cerejas, lá estão elas na rua a vender, tudo parece normal, com mais animação transpirada em frases escritas em paredes, apelando à Revolução de Abril. O entusiasmo de algumas pessoas contrasta com o nosso constrangimento, a nossa contenção, os nossos sucessivos nós na garganta. Os táxis continuam a cheirar a combustível, a estofo mal lavado e o rosário continua pendurado no espelho retrovisor, a oscilar a cruz durante a viagem. Lisboa continua movimentada e parece-me iluminada já pela luz do Verão. Oiço uma carrinha com um megafone a percorrer as ruas perto do aeroporto, emitindo uma canção que apela à revolução e anuncia um comício.

              Tomamos a rota da aldeia transmontana onde os pais nasceram, onde estão as origens da nossa família e onde conservam uma casa adquirida pelos pais no pós-guerra. Vivi nessa aldeia alguns anos da minha infância e nas férias dos últimos quatro anos.[2] Este ano não é igual, não sinto ansiedade, nem alegria, ao pensar no reencontro familiar. Sinto peso na alma, como se carregasse um fardo de toneladas de saudades, que já se manifestam, recentes e densas e que me asseguram tristezas futuras, amanheceres apáticos e entardeceres melancólicos.

              Passamos por Coimbra para ver a minha irmã mais velha que estuda História, na Universidade. Coimbra mantém o seu ambiente estudantil.

              “Nem mais um soldado para a Guiné”, vejo escrito junto às Escadas Monumentais. Dirigimo-nos para a Rua da Matemática, junto à Real República dos Corsários das Ilhas. Agora é diferente das outras vezes. Os meus pais expressam cansaço e desânimo, apesar da alegria do reencontro com a minha irmã. Não conversamos sobre ontem, sobre a despedida nocturna da cidade de Luanda. Esta é uma cumplicidade silenciosa que guardaremos para sempre no interior do nosso coração. Falamos do crescimento da minha sobrinha pequenina, que ficou em Luanda, sobre as suas primeiras palavras e as suas travessuras. Falar sobre uma criança sempre dá cor aos diálogos, pacifica a nossa mágoa e imprime alguma esperança no futuro.

 

 

.10 de Junho de 1974 - a revolução aconteceu há menos de dois meses e está viva na memória de todos. As cerimónias fascistas realizadas no Dia da Raça, em anos anteriores, para exaltar o Portugal do Império Colonial, fizeram, este ano, uma pausa para ajustar reflexões e procedimentos, coordenados com a revolução e com o Portugal democrático.



[1] O silêncio do kisanji, segundo livro desta trilogia.

[2] O fato que nunca vestimos, o primeiro livro da trilogia.


In "De cereja em cereja beijo o verão" de Anabela Quelhas

Calaram o poeta

Calaram o poeta.

A DESOMENAGEM A CAMÕES

1524- 2024

Quando os medíocres têm reconhecimento público como grandes artistas.

José Aurélio, dizem ser grande escultor, aqui não estava inspirado.

E quem lhe pagou não sabe gerir o nosso dinheiro.

Os meus alunos teriam melhores ideias.

Dizem ser uma estilização...

ERRADO!

Isto é uma minimalização mal amanhada.

A Casa da Moeda ridiculamente em baixa.

E a amora é pra que? Serão azeitonas em forma de amora?






09 junho, 2024

REVIVER

 https://www.youtube.com/watch?v=4Xis3dXKgS4


REVIVER DAY DREAM

26 LÉS-A-LÉS

 


Primeiro votar depois Penafiel na chegada.

Entretanto...