24 junho, 2020

Uma ideia feliz


Uma ideia feliz

         Esta fase de isolamento e distanciamento forçado, converteu-se em saudade na ausência da família, dos amigos, dos conhecidos, em que algum momento, se cruzaram connosco. Ninguém repara nisto, numa ausência, de dois ou três dias, mas quando passam dias e semanas, falta algo para confortar o nosso coração. Isolados pensamos em nós e nos outros e bate a saudade das nossas raízes.
         A oportunidade de criar um grupo fechado foi a ideia que me surgiu para aproximar as pessoas que pertencem a uma comunidade e estão espalhados pela Europa, Brasil e Estados Unidos, todos mais ou menos confinados em casa, com esta preocupação do contágio a pairar sobre a nossa cabeça. Muitos de nós, somos emigrantes, população flutuante do mundo, que agora graças às novas tecnologias de comunicação, estamos longe, mas podemos estar perto. Há que atender a esta oportunidade. Foi uma ideia feliz.
         A 28 de abril de 2020, nasceu o grupo “Justes – identidade”, unindo através de uma rede social, a pequena comunidade que contava na última semana com cerca de 410 membros.
         E o que se passa neste grupo, fechado? Todos os membros mais ou menos se conhecem, todos apresentam no seu perfil, uma fotografia actual, todos conhecem e respeitam as regras do grupo e todos abrem os baús da memória para partilhar fotografias, eventos, estórias, momentos. Um comentário leva a outro e as palavras são como as cerejas, vão umas atrás das outras.
         Os primeiros dias foram a verdadeira loucura, porque os pedidos para integrar o grupo, não paravam de chegar ao meu computador, e apesar desta ligação ser on line, era perceptivel, a alegria e o entusiasmo de todos em querer encurtar distâncias.
         Alguns vivem em Justes, outros regressam regularmente, mas alguns estiveram apenas de visita, ou quando eram pequenos, gerando emoções distintas e genuínas.
         Encontraram-se amigos recentes e de longa data, descobriram-se parentescos, curiosidades sobre este nosso território, distribuído por 46 tópicos, 172 publicações, 8.500 comentários e reacções. Saliente-se que a maioria dos membros não é nativa digital, mas sabem utilizar esta tecnologia e alguns membros já ultrapassaram os 70 anos. Admirável!
         Tem sido também um espaço de aprendizagem e de crescimento colectivo, porque há uma grande quantidade e diversidade de informação partilhada, que justificam e enriquecem a nossa identidade, tornando possível a reunião de registos, completando a história de todos.   
 Publicado em Notícias de Vila Real, 24/06/2020

18 junho, 2020

Decepciono-me com a humanidade


Decepciono-me com a humanidade
            Protestar contra o racismo e contra a violência converteu-se numa onda gigante de contradições e de cenas de violência de rua, em diversos países, completamente censuráveis e gratuitas.
            A boa intenção de uns, converte-se em oportunidade de ódio e violência para outros, que espreitam situações onde podem dar visibilidade à sua agressividade animalesca.
            Tudo o que são manifestações espontâneas, eu não estarei lá, exactamente pela grande probabilidade em terminar em desacatos, formando bons motivos para o autoritarismo vingar e se elegerem monstros para nos governar. A extrema-direita, disfarçada, vai aproveitando e ganhando terreno. O que tem uma coisa a ver com a outra? Pois, aparentemente não tem, mas vão-se infiltrando entre os bens intencionados, provocando distúrbios, orientando situações para a violência e o ódio, para despertar na população acções reactivas perigosas. Pessoas assustadas nunca tomam boas decisões.   
            Querem uma sociedade sem agentes da autoridade? Metem tudo no mesmo saco? Imaginem como seria a nossa vida com esta gente agressora, solta sem rédeas, a incendiar, a partir, a estragar… não há causas que justifiquem o incitamento ao ódio.
            O discurso de ódio resvala facilmente para a violência, não dignifica causas e produz um efeito contrário ao que se pretende.
            Eu quero paz pública. Quero tribunais a funcionar e a punir quem prevarica, e que a História nunca se apague, porque é lembrando que aprendemos a não repetir erros. Se a lógica fosse destruir estátuas, poucas restariam. Deveremos promover a verdadeira informação sobre quem elas representam, devidamente contextualizada, para lembrar, para termos presentes o eterno confronto entre o bem e o mal
            Mesmo assim sinto-me entalada entre a nobreza da causa e o vandalismo.
            Decepciono-me com a humanidade, causa-me muito desconforto tudo o que não dignifica o ser humano, e não é só o racismo, há uma estrada larga de imperfeições das sociedades - os diversos tipos de escravatura dos dias de hoje, a violência contra as meninas e mulheres, a exploração do trabalho infantil, a fome, a pobreza, … e nós vivemos no paraíso, porque a nossa democracia permite-nos ter ideias próprias e protestar.
            A violência no mundo reflecte o que “nós” somos. Pensemos nisso, porque refexão, é preciso!
            Após o COVID, o que menos precisamos é de agitação social. E ela está aí! Até parece de propósito…. Será que não?
Publicado em NVR, 18/06/2020

11 junho, 2020

Meia noite em Paris

MEIA NOITE EM PARIS
Realizador: Woody Allen
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METRIK - exposição


METRIK

o imaginário do meu mundo interior e da minha relação com o mundo, vestindo-se de pontos, linhas e planos, em harmonia com a luz e a cor e comunicando com o observador criando novos imaginários.
Anabela Quelhas













09 junho, 2020

A arte embrulho


A arte embrulho
            Quando a arte envolve grandes escalas e são completamente imprevisíveis, capazes de mexer com a indiferença dos cidadãos, temos obrigatoriamente de referir o artista plástico búlgaro, Christo Vladimirov Javacheff (1935-2020).
            Ficou conhecido como o artista que “embrulhava monumentos e sítios” em diversas partes do mundo, juntamente com a sua mulher.
            Destaca-se na sua acção em  "Wrapped Coast, Little Bay", em Sydney, na Austrália, "Valley Curtain", no Colorado, "Running Fence", na Califórnia, "Surrounded Islands", em Miami, "The Pont Neuf Wrapped", em Paris, "The Umbrellas", no Japão e na Califórnia, "Wrapped Reichstag", em Berlim, "The Gates", no Central Park em Nova York, "The Floating Piers", no Lago Iseo na Itália, e "The London Mastaba", no lago Serpentine em Londres.
            Esta acção confere uma nova pele aos monumentos ou locais conhecidos, permite transformá-los, respeita-os, e permite que se vivam novos olhares, numa escala invulgarmente grandiosa e surpreendente conferindo a tudo um grande impacto visual e estético. O manto que cobre, também oculta. Oculta os elementos visuais que conferem a identidade já conhecida do sítio ou do monumento, a sua ligação à História exibindo-a em forma bruta e descaracterizada, permitindo a leitura da verdadeira escala e favorecendo a imaginação de cada observador.
            Esta prática efémera da arte, torna-a ainda mais apelativa, porque a oportunidade para a observar e sentir, só existe num intervalo de tempo, tornando urgente a sua observação. Tenho uma simpatia especial pelas intervenções deste escultor, porque em vez de partir de uma forma global e bruta e imprimir–lhe forma e detalhes, como fazem todos os escultores, ele faz ao contrário, parte duma pré-existência acabada e cobre-a com uma membrana, que estabelece o contraste entre a singeleza e a complexa manobra de engenharia que tudo isto implica. São mantos de visibilidade sobre construções e sítios que invisíveis, julgávamos imutáveis, que nos obrigam a parar e a reorganizar a nossa informação
            Christo tinha a capacidade de transformar o território numa galeria de arte gigantesca, podendo dialogar com o passado e o futuro, com o céu e com a terra, com a história, com a ciência, com a ingenuidade e a sapiência de cada um.
            Ainda teremos oportunidade de observar mais uma obra plástica, talvez a última. Ou não, quem sabe? Será na cidade luz em 2021, o Arco do Triunfo.
Publicado em NVR, 9/06/2020