26 setembro, 2015

Desconstrução da humanização

            Todos nós parecemos actores da história da Bela Adormecida. Por vezes, mesmo sem príncipe, parecemos sair da nossa letargia militante e acordamos para os problemas do mundo.
            O mundo existe desde que é mundo, mal ou bem entra pela nossa casa todos os dias e a todos as horas, mesmo sem pedir licença. Carregamos o mundo no telemóvel, no tablet, no computador, diariamente num estado de adormecimento, egoísta, consentido e aflitivo. Pontualmente acordamos com notícias, que a comunicação social passa e repassa, forçando o conhecimento do receptor, assumindo a função do despertador a tilintar logo de manhã junto da nossa existência.
            Desperta-nos e devolve-nos o mundo em que vivemos.
            Acordámos com o 25 de Abril, acordámos com o “acidente” de Sá Carneiro, acordámos com Timor, acordámos com a tentativa de assassinar João Paulo II, acordámos com Mandela, acordámos com a guerra do golfo, acordámos com Gorbachev, acordámos com a morte de Diana, acordámos com a queda do Muro de Berlim, acordámos com a SIDA, acordámos com o 11 de Setembro, acordámos com o Acordo das Lajes, acordámos com o tsunami do Índico, acordámos com o juiz Rui Teixeira, acordámos com a gripe A e com o ébola, acordámos com o Duarte Lima, acordámos com a Madeleine Mcann, acordámos com Obama, acordámos com a Troika, acordámos com o Pápa Francisco, acordámos com o Salgado, acordámos  com Charlie, acordámos com a prisão de Sócrates, acordámos com a Grécia, acordámos com a fotografia  do corpo da criança Síria a dar à costa,… acordamos apenas com os ícones, podendo ser da desgraça ou não, transportando situações diversas com grande complexidade de conteúdo, potenciando outras,  e que criam ondas de solidariedade no apoio ou no protesto, feitas desta massa colectiva que somos nós, humanos adormecidos. Atitudes que se manifestam voláteis e efémeras….
            Quem explica isto?
            Quando acordamos, manifestamos a nossa indignação exaltamos valores culminando com o humanismo, que da esquerda à direita, todos julgamos possuir e defender. A televisão, a imprensa e as redes sociais atiram-nos com os que fazem opinião, e estes opinam numa operação de  “baralhar e voltar a dar” como se fossemos singelas cartas de um baralho obediente, apelando para a história, para a politica, para a economia, para as culturas, para as lógicas ilógicas de ocasião e para factos convenientemente esquecidos, exercendo o contraditório, indignando e pondo em causa a breve indignação de cada um de nós,… vêm os políticos, os jornalistas, os advogados, os analistas  e até aqueles que tem grandes responsabilidades no pais onde vivo, confrontando assertividade, com deturpação, com demagogia e conseguindo com algum sucesso a desconstrução do pouco humanismo que cada um ainda conserva em si e que tem a esperança preservar numa perspectiva ingenuamente solidária. Esta digladiação informativa é fugaz, dura dias ou poucos meses, e nós reagimos, opinando, mostrando a nossa indignação e o nosso lado heróico pelo mediático, mas este desvanece-se em consonância com a notícia que deixou de o ser, e voltamos a hibernar, adormecendo no nosso castelo encantado, até ao próximo despertar.
            Todos estes casos têm apenas em comum, o processo, o acordar, a indignação inicial, a indiferença posterior, o readormecer passado o impacto da novidade e do prurido causado, e o esquecimento.  
            Entre uns e outros, acontecem as vitórias e derrotas clubísticas que formam um mundo à parte do nosso mundo, e os escandalozecos cor-de-rosa (aquela que fotografou nua com quem, o outro que descasou e aquele que entrou nos Óscares) que funcionam como bálsamos da desgraça, tipo prozac providencial + Kompensan divino, ajudando-nos a esquecer e a mergulhar em mais um sono dos justos. Sim, porque cada um de nós, comodamente deitados em posição de Bela Adormecida, convence-se de que é justo, sossegando a consciência.

            Entretanto, enquanto dormimos, tudo continua a acontecer exactamente da mesma forma que nos surpreendeu e indignou; nos cenários internacionais, num primeiríssimo plano, negócios de armas, de guerra, de paz, de petróleo e de dinheiro e em 2º plano, lá continua o desemprego, os sem-abrigo, os doentes, a má gestão dos dinheiros públicos, o racismo, a mutilação genital feminina, os animais abandonados, a poluição, a violência doméstica, a pedofilia, a prostituição, a exploração do trabalho infantil, a caça aos elefantes, as máfias, a escravidão, a falta de água, o cancro, os refugiados e toda a lista de indignidades e enfermidades, cujos 7 pecados capitais, mais os veniais, são incapazes de conter e que vêm sufocando este animal estranho, pretensamente racional e civilizado, que é o Homem do século XXI.
Publicado no NVR -  23/09/2025

25 setembro, 2015

DOURO JAZZ



Olha!!!! Querem ver que por mera coincidência, ficamos na mesma fila!!!
Se Deus nos juntou, algum defeito nos encontrou!!!.
Hoje foi Jazzim!!!!
Tiiiiirirititiritiritiiiiii tiiiii titritiritiritiiiiiii
Tataratiratatatrii, riiiii tataritaritaaaa
Primeiro estranha-se depois entranha-se!!!!
Aplauso para o Douro Jazz
Gostámos, aplaudimos, rimos e sorrimos e trauteámos.
Muito Bom.





22 setembro, 2015

Bom dia, cassiopeia espera-nos!


Oferece-me anéis, colares, pulseiras,
Joias douradas, cravejadas de todas as cores,
Jades, rubis e ametistas
E eu quero as estrelas,
Brilhos de sedas e cetins de noites escuras,
Bordados de lua cheia.
Oferece-me diamantes
E eu quero dançar,
pautas musicais, que só nós ouvimos,
flutuando num salão qualquer.
Oferece-me tanzanitas azuis,  
E eu quero o abraço da mesma cor,
Envolvente e único,
Nascendo da voz mais profunda do mundo:
- Bom dia, cassiopeia espera-nos!
AQ

12 setembro, 2015

O FASCISMO DOS BONS HOMENS’

 
 
O FASCISMO DOS BONS HOMENS’
TRIGO LIMPO TEATRO ACERT

‘O Fascismo dos Bons Homens’ é um espectáculo concebido a partir do romance comovente e satírico ‘A máquina de fazer espanhóis’, de Valter Hugo Mãe.
...
‘A máquina de fazer espanhóis’ é, já por si, um retrato da nossa portugalidade. Na situação que vivemos actualmente o texto ganha ainda mais sentido e mais sentidos. E é uma ferramenta espectacular, um ponto de partida único e motivador para quem, como nós, adora contar histórias.
O Trigo Limpo Teatro Acert, ao colocar em cena um espectáculo baseado neste texto, pretende, não só, contar a história de António Silva, personagem central e narrador do romance, mas também a do lar ‘A Feliz Idade’, o nosso lar, o nosso Portugal de agora mas antigo, por vezes, muito antigo mesmo…

Entre o trágico e o cómico, esta aventura de final de vida ganha, em palco, uma dimensão que nos remete novamente para o mundo do ‘faz de conta’, essa fantástica brincadeira que, em pequenos nos permite ‘reinar’ e, já adultos, nos reaproxima da menoridade. Tudo isto atravessado de poesia.

Adaptação e encenação: Pompeu José
Composição e direcção musical: Filipe Melo
Cenografia: Zétavares e Pompeu José
Desenho de luz: Luís Viegas e Paulo Neto
Interpretação: António Rebelo, Hugo Gonzalez, João Silva, Pedro Sousa, Pompeu José, Raquel Costa, Sandra Santos

O RÚSTICO AVEC



O RÚSTICO AVEC

            Nas duas últimas décadas, as cidades e as aldeias portuguesas foram inundadas por exemplares da arquitectura “catalogada” como “arquitectura rústica”. Ressalvo, não é um estilo, é uma técnica de construção.

            O que é o rústico? O rústico aplicado à construção e mais especificamente às paredes, traduz-se numa ausência de acabamento e de “arte”, aparentando aspecto grosseiro, rude, sem grandes detalhes construtivos e apuramento no acabamento.

            O senso comum associa este aspecto visual à ruralidade, ao romantismo do sentimento campestre, influenciado por vezes na importação de modelos de outros países e na linha do “country” da decoração de interiores, retirando-lhe as componentes, histórica e científica, da situação portuguesa.

            Cada época tem uma forma de construir, articulada com o conhecimento científico, os materiais da região, as ferramentas disponíveis, a capacidade económica do proprietário, articulando-se com as regras de bem construir, aplicadas sabiamente pelos mestres pedreiros que existiam antes destes dias baralhados que vivemos nas últimas décadas, de uma globalização nem sempre inteligente.

            A arte de bem construir de um pedreiro, orienta-se por regras bem definidas e consta de um saber acumulado ao longo de muitos anos, com conhecimento passado de geração em geração, de mestre para aprendiz, com muitos dias e anos de prática e de muitos calos nas mãos.

            Pelas atrocidades que vejo no meio envolvente, eu diria que, actualmente, pedreiros,  já há poucos. Trolhas sim, pedreiros não!

            Não vou mais derivar por aí. Registo apenas que ao observar certas obras de recuperação e restauro nesta fase da regeneração urbana de algumas cidades, vejo maus exemplos, que muita gente aplaude sem sentido, manifestando apenas uma ignorância arquitectónica exuberante.

O rústico avec!!!!

       Enuncio uma regra simples que desconstrói o aplauso de muitos, nesta região granítica e telúrica, carente de bons pedreiros. O rústico que é para manter rústico, ocorre sempre que as molduras de vãos do edifício não são peças especialmente talhadas, aparelhadas e tratadas, assumindo rudeza similar ao resto da construção e localizam-se no mesmo plano. Num edifício em que existem panos de parede rudes, mas existem também molduras de vãos, talhadas e trabalhadas, quer dizer que o aparelho rusticado é para cobrir com outro material (reboco e pintura, azulejo, aqui no Norte) e as peças bem desenhadas e bem talhadas, são apenas essas que devem ficar à vista (molduras, cunhais, rodapés, cornijas, platibandas e elementos decorativos) e normalmente destacam-se, porque se situam num plano ligeiramente exterior (são salientes). Como toda as regras, esta também tem excepções.

            Fácil e simples! Os edifícios barrocos são autênticas “bíblias” da construção, e nós temos muitos onde aprender.

            Olhem as paredes da nossa cidade e constatem os disparates que por aí se têm cometido. Mas nada está perdido, logo que a razoabilidade inunde as consciências, estas situações são possíveis de reverter. Abstenho-me de mencionar aqui os casos mais escandalosos, para evitar constrangimentos. Vejam com olhos de ver e descubram.
Publicado em NVR - 8/09/2015

03 setembro, 2015

A propósito de Ceuta.


A propósito de Ceuta

                No dia 21 de Agosto de 2015, fez 600 anos que os portugueses tomaram Ceuta e mudaram o destino de um pequeno país localizado no extremo de um continente, abrindo portas para um mundo novo.

                Reservando-me a comentar sobre a área polemica deste acontecimento histórico (a matança de Ceuta), reconheço que talvez tenha sido esta, a porta principal para a globalização do mundo e é disso que nos devemos orgulhar, portugueses complexados com as colonizações, e que os outros países têm e mantêm sem grandes arranhões na sua dignidade.

                Ceuta é hoje o território de contacto entre dois continentes, com uma história que tem Portugal como personagem principal. A História existe e gosto de conhece-la, orgulhando-me ou não dela. E nesta história há sempre várias histórias, a história carniceira (transversal a todos os países e a todas as épocas) e a história da aventura e do conhecimento. Nestas coisas da violência, a história e a expansão de todos os impérios é feita sempre à custa de vidas humanas. Nada me escandaliza sobre o que se passou há 600 anos, porque a vida humana era barata nos conceitos do Homem da época, escandaliza-me sim, a história contemporânea dentro de um contexto de um Homem civilizado que todos pretendemos e assumimos ser. (Os norte americanos continuam a viver num território que pertence aos índios, e revelam-se ferozmente contra as emigrações, enfim… )

                Desloquei-me à cidade do Porto para visitar duas exposições sobre o assunto. Uma localizada no World Discovery, em Miragaia e outra localizada na Biblioteca Municipal do Porto, em S. Lázaro.

                Sobre esta última, exposição ilustrada e inspirada nos excertos do texto da Crónica da Tomada de Ceita de Zurara, que conta com a participação de 10 ilustradores, devo assinalar como de grande qualidade - simples, elucidativa e esteticamente bela. Associar os arcos do claustro do edifício à mostra, através de suportes semi–transparentes, convertem esta exposição em algo surpreendente e original.

                 O presidente Rui Moreira e a sua equipa, estão de parabéns. É preciso pensar, antecipar, organizar e depois partilhar a tempo e horas!

                Consultei a agenda cultural aqui do nosso burgo real – feira das velharias, futebol, observação das estrelas, circuito de Vila Real…..,

                                                                                        ….temos como personagem ilustre, D. Pedro de Meneses, que a maioria desconhece quem é.
Publicado no NVR