24 julho, 2019

ANITA vai prás termas


Anita vai prás termas
Faço a mala e reparo que a bolsa dos medicamentos aumentou de volume.
Em vez de bikini, meto dois ou três fatos de banho, pouco decotados, dos que uso na hidroginástica, em vez do fio dental, vou procurar umas cuecas de gola alta, que tenho para ali guardadas para o caso de ter que ir no INEM para o hospital e um soutien a condizer do tipo la vache qui rit. Sou  obrigada a pensar em tudo! Dobro um roupão que nunca uso e um pijama que já não me vê há anos.Costumo dormir apenas com a gota de Channel, que no. meu caso  é mesmo Bulgary.
Dobro a receita do medico, um pouco decepcionada comigo mesma e coloco-a na carteira. O que irei fazer para umas termas durante 15 dias a não ser tratar do esqueleto e cumprir a receita do médico? Antigamente as jovens encalhadas de boas famílias iam arranjar noivo às termas, e passavam o dia a beber água gaseificada, a fazer crochet e a arrotar nos intervalos. Dançavam em noites dançantes com tango e valsa, para entusiasmar as hormonas, para que um pedido de compromisso viesse ao de cima, para permitir um maior amasso no Tango dos Barbudos. Onde vi isto? No cinema, certamente.
Sinto-me tão frustrada!!!
Eu Anita me confesso, que merda de vida!!! Que pasmaceira. Ainda perguntei ao médico, se poderia ir para as termas de Saturnia, termas por termas, já tendo que ser, entre Chaves e Saturnia, eu iria mesmo para Saturnia. Disse que não, teria que ser mesmo termas de beber água e esguicho de mangueira no esqueleto à velha maneira. SPA NEM PENSAR.
Em vez do computador levo... levo o que? Terei que
comprar  numa retrosaria, agulha e linhas para bordar? uff... socorro Celeste, tenho que reaprender a fazer malha.
Em vez de uma sandalete de tacão alto, o ortopedista aconselhou-me calçado ortopédico Dr. Schoulds, daqueles modelos de cotas reformados, comprados na farmácia, que andam nos cruzeiros das Baahamas..., os sapatos tem um design refinado, nunca se sabe se são do pé esquerdo ou do pé direito. Tanto faz, serve nos dois.
--Não serve sapatilha Adidas comprada no chinês?
--Tem que ser Schoulds porque assim e assado. (argumentário de médico, que quer que uses meia el@stica na praia, durmas em rampa inclinada como se dormisses em ponte levadiça e fosses da família de morcego e desinfecta até gelado com desinfectante das saladas).
Em vez do cabelo pela cintura, já me sugeriram pedir à minha cabeleireira para me fazer um corte à 60 -- não é um corte rebelde dos sixties, não, um corte de mise, que necessita de rolos na cabeça e de laca, num corte de Rainha Mãe já aposentada a cheirar a naftalina. Acabei por pintar o cabelo com a cor caju igual à cor da Manuela Ferreira Leite para me começar a habituar.
 Também me sugeriram mandar fazer uns vestidos à Cavaca, dado o seu bom gosto, poderia atrair algum doutorado nas danças de salão, senhor de meia idade um gentleman bem relacionado com a banca que ande a tratar da azia com água Carvalhelhos. (Engoli em seco, para que eu quero mesmo, um gentleman com azia, se eu como muamba toda a semana e adoro um joelho da porca?).
Também arrumo na mala, o dentafix. Que estranho, não me lembro de ter colocado uma dentadura.... já tenho esquecimentos graves!!! A minha língua dá a volta a minha boca. Por onde andará a minha dentadura? O Alzheimer ao ataque. Isto deve ser dos nervos!!! Tomei as gotas?
Mas o medico quer mais o que?. felizmente ainda pinto as unhas e não tenho os dedos encavalitados com joanetes... também junto a calçadeira, o reumongel, pelo sim, pelo não, ah o tapete ventosa para o duche, os óculos para ver ao perto, e os sapatos de agasalho.... mas estamos no verão, que estranho não encontro a dentadura, mas tenho aqui os cones auditivos. Estou mouca e não sabia! Os. cones estão junto de um cd de fado. Gosto de fado?! Olha outra novidade. Pensei que só apreciava rockalhada e batuques dos mussekes... ups afinal não são cones auditivos, são os supositórios que o otorrino receitou para otites e que mesmo nas orelhas não abrandam a dor hum...sinto que nasci no jurássico e nem me reconheço nesta caverna. Socorro, Platão, deixa-me sair!!! E a minha consciência sempre a buzinar no meu ouvido: médico é que sabe, médico é que sabe...
-- Ora convém levar um livro e umas revistas para ler e passar o tempo termal.
--De que tipo doutor?
--Ondjaki, não, é de fácil digestão, e tu tens de estar indisposta para a água fazer efeito. Mia Couto? Não, tem nome de mulher! Tens que levar livro a metro, descomplicado e parvo para poderes noivar rapidamente -- tipo Equador do MST. Leva palavras cruzadas da revista Expresso.
-- Como? Desse não levo não, deitei todos ao lixo, receio que estupidez seja contagiosa e as palavras cruzadas do Expresso, da mulher do Balsemão, a partir desta semana só utilizo para limpar o cócó do cão.

TRRIMMMM, flop, TRRIMMMM, TRIIIIMMMM um relógio acorda-me, que noite!
--Acorda Anita, já estamos atrasados!
Malditos feijões! A bebida calcinha de nylon andou aqui a levar-me aos subterrâneos de mim. A boca sabe-me a ficheiro de excell. Olho para a mesinha de cabeceira e vejo uma receita médica antiga, dobro-a em modo origami com forma de aviãozinho, abro a janela  e lanço-a para o espaço, vai aterrar no quintal do vizinho.
Tomo duche, a mochila está feita, visto-me, capacete a proteger-me, subo para a Harley, ligo os piscas da esquerda, rumo para Ibiza em boa companhia. Cala de Sant Vicent.
Eu gosto é do verão!

 Publicado em NVR