ACEITAR E
PRATICAR, DÓI MENOS
Verifiquei que em qualquer sítio onde estejam crianças, estas reflectem
de imediato a educação que têm e qual o perfil dos pais.
Há crianças fabulosas, simpáticas, atenciosas, que conhecem as palavras
mágicas – obrigada, peço desculpa, se faz favor, bom dia, adeus, com licença –
e que as utilizam em qualquer situação e em qualquer país. Há outras, onde
entram, provocam desconforto imediato a quem está por perto, acompanhadas por
pais absolutamente desorganizados e perdidos. Nos restaurantes, em vez de lhe
indicarem o local onde se devem sentar, perguntam:
- Meu amor onde te queres sentar? - enquanto os pais e eventualmente os
avós aguardam pacientemente a sua decisão.
Segue-se a fase da inquietação e da birrinha por tudo e por nada e só
se calam quando lhe passam um telemóvel ou um tablet para as mãos. O digital parece desempenhar o papel de
anestésico com efeito imediato.
Basta isto, para percebermos, quem manda lá em casa e como se educa uma
criança. Estes pais não dão oportunidade a que os filhos olhem para a comida,
olhem para os pais e muito menos para quem está à sua volta. Evitam qualquer
frustração ou vazio na vida dos seus queridos petizes.
Um dia encontrei um casal conhecido que passeava o seu bebé com menos
de um ano, no carrinho de passeio e notei que, este já segurava um telemóvel.
Perguntei porque lhe permitiam usar o telemóvel. Responderam que se lhe
tirassem o telemóvel ele chorava. Como tenho alguma confiança com o casal,
atrevi-me a informá-los que as crianças precisam de chorar, de serem
contrariadas e sobretudo é função dos pais dar-lhes espaço para a frustração e
os espaços de ócio sem fazer nada, para que estas descubram como ocupar tempo e
saber lidar com a frustração e os nãos da vida; e quando são muito pequenos
como era o caso, é essencial que os pais sejam criativos, lhes ensinem a ver o
mundo sem ser através do telemóvel. Devem pegar-lhes ao colo, cantar, mostrar o
que os rodeia, fazer com eles brincadeiras básicas que os envolva como
participantes, que ampliem os afetos e simultaneamente estabeleçam limites à
sua acção.
Até aos seis anos os pais têm a responsabilidade de “apresentar” o
mundo aos seus filhos, proporcionando-lhes experiências variadas e não o estão
a fazer. Não é preciso carregá-los, ainda recém-nascidos, para férias na praia,
nem levá-los para um Resort nas Caraíbas, porque as férias converter-se-ão numa
canseira constante. Pode ser no quintal, na sala lá de casa, em casa dos avós…
mostrem aí a vossa competência como pais.
Informei que sempre existiram crianças que choram, mesmo antes dos
telemóveis. As crianças dos telemóveis transformar-se-ão em crianças
insuportáveis no futuro, sem socialização, neuróticas, agressivas e
mal-educadas. Elucidei que quando os pais afirmam orgulhosamente que o seu
filho, tão pequenino, já sabe usar os suportes digitais, como se estivessem a
partilhar a inteligência do filho sobredotado, é um péssimo sinal, nem
adivinham os grandes problemas que os espera no futuro, e o certificado de
incompetência que estão a passar a si próprios.
Volto mais uma vez a este assunto.
Investiguem sobre os malefícios dos suportes digitais utilizados por
crianças e jovens em formação. Perceberão que estão a reduzir o mundo, ao ser
que mais amam.
É chato aturar um filho a chorar? É!
É estafante dar-lhes atenção constante? É!
É doloroso impor limites? É!
É esgotante andar com sono em atraso, multi tarefas para fazer e, mesmo
assim, arranjar tempo para interagir com o filho com um sorriso nos lábios? É!
É uma seca trocar um jogo do nosso clube de futebol, por um jogo idiota
de colocar peças umas em cima das outras, para depois tirá-las pela mesma ordem
e recomeçar tudo de novo? É!
É frustrante, trocar a discoteca, a noite com as cervejolas, as
caipirinhas e o trecolareco com os amigos(as), por uma noite a mimar o filho e
a recontar pela milésima vez a história da carochinha? É!
É, e é assim que tem que ser, porque ser pai e mãe tem destas coisas e
o melhor é aceitar e praticar, porque dói menos. Não pense em avós, babysitters,
amas, creches, academias, escolas e ATLs, porque não é a mesma coisa; os pais
são insubstituíveis e são os reais responsáveis pelos filhos que puseram neste
mundo. Telemóveis? nunca antes dos 6 anos, e depois, em doses reduzidas, por
favor.
Publicado em NVR em 23/08/2023
3 comentários:
Excelente texto. Pertinente e elucidativo. Parabéns!
Adorei o texto. Muito elucidativo. Um tema pertinente que todos os pais de hoje deveriam ler. Educar um filho não é fácil, há que dizer não e ao mesmo tempo dar-lhe o maior amor e atenção. Regras são fundamentais. Brincar com eles super fundamental.
Anónimo - grata.
Ana André, e é isto, bem sabes. Beijinho
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