ENTRE QUEM LÊ
Pela primeira vez
temos um grande evento cultural ligado aos livros, à leitura e à escrita.
Já tardava. Sabemos
que uma primeira edição pode atrair poucos visitantes, poderá não compensar
financeiramente, poderá até dar prejuízo, porém, o objectivo da cultura não é
gerar lucros. A cultura deve proporcionar conhecimento, enriquecer o pensamento
e a identidade colectiva e fomentar valores, porque estes são essenciais em
qualquer sociedade. Assim, tardava! Já devia ter sido! e espero que no próximo
ano tenhamos mais. O contentamento e o entusiamo são visíveis no rosto dos
presentes.
Estamos no tempo em
que é preciso fazer algo para contrariar a tendência galopante para substituir o
livro, pelos meios digitais. Para isso é necessário aproximar os cidadãos ao
mundo dos livros. Crianças, adolescentes e adultos estão completamente
seduzidos pelo seu telemóvel. Com pouco esforço basta clicar e várias imagens
entram pelos nossos olhos dentro, com ou sem narrativa. Não é necessária
concentração, não é necessário raciocínio, não é necessário esforço.
Infelizmente a avaliação realizada em outros países, alerta-nos para alguns
problemas. O digital é uma boa ferramenta para apoiar diversas tarefas no mundo
do trabalho e do lazer, mas ultrapassando o limite da razoabilidade, embrutece,
provoca isolamento, reduz a competência leitora, torna os utilizadores ansiosos,
sem paciência, intolerantes, stressados, lêem mal, escrevem pior, apresentam
problemas na comunicação, interpretam sem sentido crítico, perdem destrezas
manuais, criatividade, etc. A imagem, a cor, a velocidade, os jogos, bancos de
imagens infinitos e agora a IA são elementos que cativam e teremos de criar alternativas
compatíveis, capazes de recuperar e formar novos leitores. São necessários
eventos, não basta ter os livros para vender: conversas com escritores,
contadores de histórias, oficinas de ilustração e representação, jogos lúdicos,
e por aí fora, tudo o que a imaginação consiga concretizar para motivar. ENTRE
QUEM LÊ já oferece parte do que foi registado e por isso a sua avaliação é
positiva. Agora, é só melhorar.
O alinhamento é ótimo,
os convidados são figuras conhecidas do mundo literário, alguns de primeiro
plano e as dinâmicas revelam interesse. O cartaz é apelativo, o espaço é nobre,
mas necessita de certas adaptações. A publicidade deveria ser maior, porque
conhecemos a inércia dos vila-realenses e a preguiça para abandonarem o sofá.
Assisti à abertura e à
maioria das actividades de sexta, sábado e domingo.
Dou destaque para Ana
Margarida Carvalho e Dulce Maria Cardoso - é difícil ter um evento com duas das
melhores escritoras contemporâneas.
Pires Cabral já nos
habituou ao seu discurso de qualidade.
Conversas com
escritores e poetas locais aconteceram no domingo ao fim da tarde – Caseiro
Marques, Anabela Quelhas, Ribeiro Aires, Marília Miranda Lopes, Manuela Vaz de
Carvalho e António Fortuna – souberam a pouco. Havia muito a partilhar e o
tempo foi escasso. Foi tudo muito apressado, para personalidades tão vincadas e
projectos de escrita tão diferentes e interessantes, que são uma mais-valia na
cultura transmontana.
Ainda teremos mais 5
dias para festejar a leitura. Desejo que o público flua e inclua esta
oportunidade para romper a rotina semanal. Ficaríamos todos a ganhar.
Quem lê mais, sabe
mais e está mais bem preparado para resolver os problemas da vida.
Publicado em NVR 25/09/2024
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