30 setembro, 2024
29 setembro, 2024
ELEGÂNCIA
Elegância não se mede por roupas, maquilhagem e sapatos,
isso pode, em certos casos, ser um ligeiro tempero, mas não passa disso.
Elegância é sabedoria, conhecimento, postura de vida,
valores, sensibilidade, sagacidade, ética, saber falar, tolerância, honestidade, respeito pelo outro, cordialidade, inteligência, equilíbrio, subtileza e não
perder tempo com futilidades, porque o tempo é precioso.
25 setembro, 2024
ENTRE QUEM LÊ
ENTRE QUEM LÊ
Pela primeira vez
temos um grande evento cultural ligado aos livros, à leitura e à escrita.
Já tardava. Sabemos
que uma primeira edição pode atrair poucos visitantes, poderá não compensar
financeiramente, poderá até dar prejuízo, porém, o objectivo da cultura não é
gerar lucros. A cultura deve proporcionar conhecimento, enriquecer o pensamento
e a identidade colectiva e fomentar valores, porque estes são essenciais em
qualquer sociedade. Assim, tardava! Já devia ter sido! e espero que no próximo
ano tenhamos mais. O contentamento e o entusiamo são visíveis no rosto dos
presentes.
Estamos no tempo em
que é preciso fazer algo para contrariar a tendência galopante para substituir o
livro, pelos meios digitais. Para isso é necessário aproximar os cidadãos ao
mundo dos livros. Crianças, adolescentes e adultos estão completamente
seduzidos pelo seu telemóvel. Com pouco esforço basta clicar e várias imagens
entram pelos nossos olhos dentro, com ou sem narrativa. Não é necessária
concentração, não é necessário raciocínio, não é necessário esforço.
Infelizmente a avaliação realizada em outros países, alerta-nos para alguns
problemas. O digital é uma boa ferramenta para apoiar diversas tarefas no mundo
do trabalho e do lazer, mas ultrapassando o limite da razoabilidade, embrutece,
provoca isolamento, reduz a competência leitora, torna os utilizadores ansiosos,
sem paciência, intolerantes, stressados, lêem mal, escrevem pior, apresentam
problemas na comunicação, interpretam sem sentido crítico, perdem destrezas
manuais, criatividade, etc. A imagem, a cor, a velocidade, os jogos, bancos de
imagens infinitos e agora a IA são elementos que cativam e teremos de criar alternativas
compatíveis, capazes de recuperar e formar novos leitores. São necessários
eventos, não basta ter os livros para vender: conversas com escritores,
contadores de histórias, oficinas de ilustração e representação, jogos lúdicos,
e por aí fora, tudo o que a imaginação consiga concretizar para motivar. ENTRE
QUEM LÊ já oferece parte do que foi registado e por isso a sua avaliação é
positiva. Agora, é só melhorar.
O alinhamento é ótimo,
os convidados são figuras conhecidas do mundo literário, alguns de primeiro
plano e as dinâmicas revelam interesse. O cartaz é apelativo, o espaço é nobre,
mas necessita de certas adaptações. A publicidade deveria ser maior, porque
conhecemos a inércia dos vila-realenses e a preguiça para abandonarem o sofá.
Assisti à abertura e à
maioria das actividades de sexta, sábado e domingo.
Dou destaque para Ana
Margarida Carvalho e Dulce Maria Cardoso - é difícil ter um evento com duas das
melhores escritoras contemporâneas.
Pires Cabral já nos
habituou ao seu discurso de qualidade.
Conversas com
escritores e poetas locais aconteceram no domingo ao fim da tarde – Caseiro
Marques, Anabela Quelhas, Ribeiro Aires, Marília Miranda Lopes, Manuela Vaz de
Carvalho e António Fortuna – souberam a pouco. Havia muito a partilhar e o
tempo foi escasso. Foi tudo muito apressado, para personalidades tão vincadas e
projectos de escrita tão diferentes e interessantes, que são uma mais-valia na
cultura transmontana.
Ainda teremos mais 5
dias para festejar a leitura. Desejo que o público flua e inclua esta
oportunidade para romper a rotina semanal. Ficaríamos todos a ganhar.
Quem lê mais, sabe
mais e está mais bem preparado para resolver os problemas da vida.
Publicado em NVR 25/09/2024
JOÃO UBALDO RIBEIRO
Parceria com João Carlos Carranca
Karranca às quartas, na Rádio Portimão
22 setembro, 2024
20 setembro, 2024
ANA MARGARIDA DE CARVALHO
Hoje finalmente conheci Ana Margarida de Carvalho, uma das minhas referências na literatura contemporânea. Autografou este meu livro; foi o primeiro que li e que me impressionou muito, pela capa, pelo título, pelo tema (naufrágio de uma embarcação que faz trafego de escravos no século XIX, na costa do Brasil), pela narrativa, a descrição detalhada e as emoções que me causaram.
Recordei a História Trágico-Marítima, o Hugo conseguiu arranjar uma edição no alfarrabista e desta leitura nasceram várias conversas sobre o tema.
A Ana Margarida foi entrevistada por Ana Vanessa e depois respondeu às perguntas do público e aí explicou-me como surge a ideia de escrever sobre um naufrágio.
18 setembro, 2024
Transportes públicos
Transportes públicos
Como tenho manifestado
críticas à organização e utilização do centro urbano, pode parecer que pertenço
àquele grupo, que entregariam o centro da cidade à poluição e aos veículos
privados, mas não corresponde à verdade, e hoje vou escrever sobre os
transportes públicos desta cidade.
Parece-me que a cidade
tem sido favorecida com uma rede de transporte pública razoável, 25 linhas que
ligam não só vários pontos da cidade, assim como vários pontos do concelho.
Antes de 2002 isto não
existia. Desde 1975, que a cidade cresce, mas o poder político esteve 25 anos
inactivo nessa matéria.
Havia 2 ou 3 empresas
privadas que faziam o seu negócio transportando pessoas da cidade para as
aldeias, sem um plano estratégico a pensar nos cidadãos e nas suas necessidades
de deslocação urbana. Cada um tinha que andar a pé, de carro de praça ou
comprar um veículo automóvel pessoal, para poder deslocar-se. Cheguei a esta
cidade em 1988, habituada a utilizar transporte público no Porto e em Coimbra,
e aqui, fui trabalhar para Mateus e tive que utilizar viatura própria, para ir
trabalhar porque não existia alternativa.
Estamos melhor, uma boa
rede de transporte publico alivia a pressão nos centros urbanos e alivia a
bolsa dos cidadãos. Estamos muito melhor! Temos cerca de 25 linhas estruturais
em que algumas ainda se desdobram e cobrem grande parte do território.
Pelos dados que recolhi
(desconheço se são fiáveis) teríamos em 2022 uma frota de 20 veículos –
parece-me pouco para 25 linhas.
A minha experiência é
positiva, como vivo relativamente perto do centro, tenho transporte quase à
porta, utilizo-o fora das horas de ponta e constitui um recurso satisfatório
para me ajudar na minha mobilidade urbana. Na verdade, se tiver que estacionar
no centro, o dinheiro do estacionamento ultrapassa o custo de duas viagens em
transporte publico. Devo elogiar também os profissionais que os conduzem, que
manifestam simpatia e ajudam os utilizadores.
Tudo parece bem, mas
não está.
Refiro o interior dos
autocarros onde falta a visibilidade de um esquema da linha e um pequeno
esquema de toda a rede, atendendo a que há utentes que têm de usar mais do que
uma linha; falta também um monitor de informação com aviso antecipado da
identificação das paragens. O desenho do interior dos autocarros está feito
apenas para jovens; pretendendo-se rentabilizar o espaço do habitáculo, resultam
bancos elevados com degraus ou plataformas tornando perigosa a sua utilização
aos menos ágeis e menos novos.
Sobre as paragens de
autocarro, têm desenho contemporâneo, formadas por painéis transparentes, com
painel lateral direito com configuração de outdoor ou mupi[1]
(tive dificuldade em seleccionar o termo correcto) e respectivo postalete.
Usufruindo da sua forma de abrigo localiza-se um banco para os utentes se
poderem sentar, protegidos das intempéries.
Tudo parece bem, mas
não está.
O referido “postalete”
possui informação reduzida e esquemática das linhas, que é insuficiente. Os horários,
o esquema de toda a rede diurna e nocturna são inexistentes. O mupi está
ocupado com publicidade, certamente paga, e não se dá prioridade às informações
em falta. Como forma de ultrapassar este constrangimento veem-se folhas A4
coladas com fita-cola, sobre os painéis transparentes onde não deveria ter nada
para facilitar a sua limpeza e transparência. Fica o contraste entre a
modernidade e o desenrasque, com várias folhas A4, umas bem coladas e outras
com parte da folha pendurada.
Isto merece reflexão, o
mundo da publicidade é voraz. A publicidade exterior é o melhor investimento
para marcas que procuram notoriedade e impacto. As paragens de autocarro são
bons lugares para promover produtos ou serviços e influenciar decisões de
compra. São locais de permanência obrigatória, de um público flutuante,
diversificado com predominância de jovens. Assim, a colocação de publicidade
não é uma atitude ingénua da autarquia, mas sim uma atitude que produz
rendimento.
Aqui fica o reparo, a autarquia não
pode ser ambiciosa e querer tudo, ou pretende ter munícipes bem servidos ou
pretende rendimento publicitário fácil.
Um último apontamento:
às onze horas no interior dos autocarros já não se reconhece qualquer aroma
associado à higiene diária; as paragens requerem uma maior higienização,
qualquer utente percebe nos elementos transparentes, restos de fita cola, e
surro. Sim, escrevi surro e outras sujidades resultando da limpeza pouco
cuidada.
Tudo
parece bem, mas não está.
17 setembro, 2024
16 setembro, 2024
15 setembro, 2024
13 setembro, 2024
sexta treze
Entre as névoas do tempo,
em noite de sexta feira 13 solto coriscos e maldições
segredos antigos sussurram ao vento.
Que este peçonha te pegue aos trambolhões
De cruzes, marreca e hálito fedorento.
11 setembro, 2024
Eu docente me confesso
Eu docente me confesso
Não caí no mundo da docência por
acaso, decidi ter uma vida profissional ligada à arquitectura e esta só se
completava com algo mais. O mundo do projecto, a intervenção urbana activa, o
pensamento e análise crítica do território, a construção, os materiais de
construção e a interacção com os clientes, precisava de algo que articulasse
outras áreas artísticas, que sempre fizeram parte mim e no mundo da
arquitectura eram muito secundarizadas ou até esquecidas.
O ensino surgiu como a oportunidade para preencher esse espaço e dar-lhe brilho, que não sendo sobrante, era paralelo
a outros. Nunca quis ensinar geometria descritiva, porque rigor e raciocínio
abstracto era o que eu tinha que chegasse e sobrasse, como arquitecta. Eu
precisava de tudo que compunha a área das artes visuais para alimentar
experiências relacionadas com o desenvolvimento artístico dos jovens,
estivessem eles na fase das operações concretas ou na fase das operações
abstractas. Tinha ainda muito presente a minha experiência liceal, reconhecendo
a importância do balão de oxigénio do Desenho, para a formação da minha
personalidade observadora e criativa. Eu queria proporcionar experiências
semelhantes a outros jovens, que estão naquela idade, que não sabem o que
querem, rebeldes, inconvenientes e sobretudo de mente aberta para o mundo,
potencialmente criativos dentro de armários que nem sempre se abrem. Precisava
disso para não estagnar, para me sentir rejuvenescida, colorida diariamente e,
por outro lado, sentia que poderia exercer uma boa influência nas mentes em
formação, levá-las a realizar experiências marcantes, enriquecer o seu interior
e facilitar a exteriorização do mesmo, reduzindo-lhes a agressividade - fazê-las
gostar de arte.
E foi assim, a minha formação
académica deu-me parte do suporte do conhecimento científico, e foi necessário
adicionar pedagogia e formação contínua, para depois poder navegar no mundo do
ensino das artes visuais com felicidade e criatividade. Detesto repetição; o início
de cada ano lectivo, foi sempre um recomeço e exigia de mim, tudo, como se
fosse a primeira vez. Nunca propus os mesmos temas de trabalho, e assim, até
para mim, cada ano era único e novo, o que me rejuvenescia e motivava. Recorri
com frequência a auto-formação, dei por mim a investigar na área da psicologia
e da neurociência e devo ser dos poucos professores, que incluem assumidamente na
sua formação contínua, visitas a museus e exposições – saber o que os outros
fazem, enriquece o meu caminho e reflecte-se nos meus alunos.
Tive alunos mais ou menos criativos e
todos sempre obtiveram um estímulo positivo para avançar e nunca rejeitar
trabalhos. Sempre souberam que com uma pequena ajuda se consegue converter um
trabalho, em melhor trabalho, não sendo necessário deitá-lo ao lixo.
Também andei de mala às costas, e
sofri todos os problemas que esta carreira vem absorvendo ao longo dos anos,
tenho o meu registo biográfico cheio de greves, animei-me com conquistas,
decepcionei-me com derrotas e tentei sempre ser a almofada dos meus alunos.
Infelizmente, atravessei uma zona
turbulenta e verdadeiramente cinzenta – quando os ministros entenderam
transformar a Escola numa fábrica, como se 1 kg de carne tivesse de dar
obrigatóriamente 20 croquetes. Fui obrigada a seguir o meu caminho, adoptando
práticas nem sempre aquelas que me exigiam, para proteger a aprendizagem dos
meus alunos, arriscando a ter a direcção, colegas e até pais contra mim. Há
momentos que é preciso dizer NÃO. O sistema obrigou-me a aplicar fichas
diagnósticas, que eu recusava e esquecia logo a seguir, porque nunca quis criar
expectativas sobre os meus alunos no primeiro dia de aulas. Sempre assumi que a
avaliação em arte é subjectiva e sempre escrevi mais, do que apliquei as fichas
excell tão endeusadas por alguns. Defendo que um aluno nunca desaprende
e por isso a avaliação deve ser contínua, verdadeiramente contínua, aquela que
vai corrigindo a anterior. Acreditei sempre que as principais estratégias de
sucesso são o envolvimento do aluno na aprendizagem, a ampliação ou reforço da
sua auto-estima e o sentido de humor do professor, para converter a aula num
espaço em que o tempo passa rápido.
Com muitos e muitos anos de prática
profissional e já no limite do exercício, penso nos meus alunos de várias
gerações. Sinto-me realizada por ter sido referência para muitos deles. Gosto
de os reencontrar já inseridos no mundo do trabalho e perceber que pertenço à
vida deles. Sinto-me sobretudo grata, porque sem eles, não teria criado engenho
para gerar equilíbrio e motivação para ter sucesso em outras tarefas da vida.
Publicado em NVR 11/09/2024
apaixonei-me
Apaixonei-me por este edifício, casa,
moradia, habitação, o que lhe queiram chamar.
Olhava-a quando me levantava através
da janela do hotel, e o meu primeiro pensamento tinha esse destino.
Olhava-a quando estava na praia.
Olhava-a a passar para o restaurante
e despedia-me dela no regresso ao hotel no final da noite.
Observei-a na sua presença com alçado
principal e também exactamente do ponto de vista oposto, imaginando o resto.
Apaixonei-me.
Paixão de corações e suspiros.
Com a minha maturidade já não foi o
objecto em si, que me atraiu, os planos geométricos, a forma/função, a estética,
a inovação arquitectónica. Apaixonei-me pela simplicidade, escala, robustez combinada
com a fragilidade visível. Ao apaixonar-me por ela foi mais forte a sua essência
relacionada com o exterior, do que haveria no seu interior. O interior
desconhecia-o e adivinhava-o, como o mínimo essencial para habitar.
Apaixonei-me por aquilo que poderia ver daquele espaço para o exterior – o pôr
do sol diário, o maior espectáculo do mundo, o marulhar sereno do mar, o areal
como base morfológica e o céu imenso. Imaginei-me a espreguiçar-me logo de
manhã com a sensação do sítio do espaço marítimo. Imaginei-me à janela a olhar
para fora, para o espaço por onde andei a deambular. Imaginei-me a ouvir música
apreciando o vento do exterior ou a falta dele. Imaginei-me a ler um livro e levantar os olhos
até aos últimos raios de sol. Imaginei-me no degrau vinte dos afectos,
aconchegando o brilho e a geografia do lugar, através de uma lareira no
Inverno, como garantia infinita de felicidade.
Seria ali o meu porto seguro contigo,
provavelmente igualável a Cassiopeia.
Seria o espaço de meditação/reflexão
de mulher formada, autónoma, emancipada, que nunca dependeu de ninguém, com as
suas lutas pela liberdade.
Seria um espaço de relaxamento e
lazer, apreciando as boas sensações da vida.
Seria também o espaço para
desenvolver sentido critico sobre mim e o mundo acompanhada de granito e
fenestrações brancas, associadas a melodias que branqueiam velhos dissabores.
Trouxe estas emoções comigo, memórias
embrulhadas em alegria e coração cheio.
Voltarei.
in "Ensaios de escrita, um projecto sempre adiado" Anabela Quelhas