Como sou de sítio nenhum, é raro
estas datas históricas terem para mim, o significado que têm para a maioria dos
portugueses. Respeito-as, tento compreender o seu significado, mas falta-me o sentido
patriótico. É uma sensação estranha, é como ir à bola e não ter clube.
Questiono casamentos e uniões de
facto no século XXI, compreendo os casamentos estratégicos, que aconteceram ao
longo de quase toda a monarquia europeia, que se resumiam à ambição de juntar e
possuir mais e mais território e tenho muita dificuldade em perceber a evolução
daquela união de facto entre Portugal e Castela, pós D. Sebastião, talvez por
ignorância e por não conhecer com profundidade a estratégia política do século
XVI/XVII. Não sei tomar partido, não sei avaliar, surgem muitos
questionamentos, e permanece o orgulho dos tugas pela Restauração de 1640.
Tal como nas uniões de facto, cada
elemento do casal tem a sua versão, da vida em comum; enquanto tudo corre bem,
nos primeiros meses de acasalamento, se de facto a união se estabelece de livre
vontade, tudo corre às mil maravilhas. Quando a paixão passa, e o amor esmorece,
após o período da procriação, cada um começa a desencantar-se com a falha nas
promessas não cumpridas, a melodia do ressono nocturno passa a ser um motivo de
reclamação da parte do parceiro insone, o mau hálito matinal, torna-se
insuportável e ausente de feromonas, a pinga na tampa da sanita associa-se a
badalhoquice masculina, o bacalhau à Brás tão elogiado pelo doce Romeu, passa a
ter espinhas devido a um bacalhau mal demolhado, mal desfiado e com espinhas
disfarçadas, que rasgam goelas, a unha do dedo mínimo, convertido em brinquedo
sexual, passou apenas a funcionar como desentupidor de ouvidos…
Naquela união de reinos vizinhos,
tanto tugas como castelhanos, estavam ávidos de deitar a mão a toda a riqueza
que pudessem – isto penso que é inquestionável – e tiveram 60 anos para o
fazer. Um dia, os tugas acusando um certo descontentamento na divisão de praças
e fortunas, resolveram construir o feriado do 1.º de Dezembro. Parece que 40
matulões tugas, resolveram dar por terminada esta união, que já só prometia
paulada e desaforos, porém, alguém tinha que ficar à frente da empreitada e foram
buscar João, 7.º Duque de Bragança, homem que até ficou bem no retrato de
bigode arrebitado, bonitão, cheio de estilo e corte de cabelo à tótó, mas que
padecia de inatividade e preguiça. Porque isto de andar à paulada tem os seus
riscos, lembrem-se que naquela época, um individuo levava uma naifada no bucho
e não havia urgências, nem SNS, as tripas ficavam de fora e pronto. João, de
facto, preferia vida mansa de duque, em Vila Viçosa, gozando o património familiar
e suportando o salero da esposa, do que a dar a cara pelos tugas, mas saiu-lhe
na rifa, uma mulher ambiciosa. Luisa de Gusmão, de apelido original Guzmán y
Sandova, escolhida pelo rei de Castela para esposa de João, com o objectivo de
manipular e controlar João, não esteve com meias medidas, pôs-se ao lado dos
tugas (vá-se lá entender as mulheres!), virou-se para o marido que repousava tranquilamente
no leito e disse:
- Estás parvo ou quê? Tens medo que
te vão ao focinho? Se calhar levas de uma maneira ou de outra! Prefiro ser
rainha por uma hora do que duquesa toda a vida.
João lá se sentou na cama, bocejou, procurou
lentamente os chinelos, fazendo-se bastante rogado e dirigiu-se ao criado mudo.
Confunde-se até hoje, se foi movimento patriota ou necessidade fisiológica.
Entretanto, o Vasconcelos, em Lisboa, escrivão da Duquesa de Mântua, vice-rainha,
completamente à rasca levou um balázio e voou janela fora, ainda quente e sem
asas.
João apelidado por “rei de trazer por
casa” não teve outra saída, transformou hesitação em prudência, preguiça em
estratégia, e foi aclamado Rei, com a sábia ajuda de Padre António Vieira, que
afinal é personagem um pouco ignorada neste processo, apesar do calendário não
combinar – sim! esse do “Sermão de Stº. António aos Peixes”, cuja vida e obra
poderia dar um filmão estrondoso em Hollywood, e foi o grande estratega português
do século XVII, assim como o grande imperador da língua portuguesa
Conclusão, João tinha razão,
acabou-se-lhe o sossego, nunca mais teve uma noite tranquila e relaxante, safou-se
por pouco de um atentado. O seu primo Filipe não era para brincadeiras.
Publicado em NVR 6/12/2023
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