Repensar a guerra
Estou sempre do lado
das minorias e dos mais fracos, porém, simpatizo também com aquilo a que se
chama diálogo, negociação, diplomacia e estratégia.
Sobre a guerra entre a Rússia
e a Ucrânia, que virou indignação mundial, confesso que nunca esperei que se
voltasse a repetir os mesmos erros do passado, e que já teríamos ultrapassado o
conceito de guerra tradicional, a apreciação de quem é mais forte, de quem tem
menos armas…. quem matou mais pessoas e quem tem mais pessoas para morrer.
Pensei que as experiências ao longo do século XX e o terrorismo do século XXI, tinham
colocado os humanos noutro patamar, possuía a esperança que tivesse havido
mudança de mentalidades. Na verdade, não sou ninguém para opinar sobre quem tem
razão, para apresentar argumentos sociais, políticos, económicos e históricos,
porque até questiono o significado de razão e a sua utilidade. Considero que todos
têm razão e ninguém tem razão. Sei que é uma luta entre um David e um Golias,
sem Bíblia e sem calhaus, sendo fácil adivinhar que uma guerra nunca será um
meio de encontrar soluções.
A reflexão que quero
aqui trazer hoje, é sobre as visitas de Zelensky para angariar apoios. Ele
parece uma estrela rock a angariar fundos para fome em África, todos os países
o acolhem com simpatia e admiração e fazem promessas: armas e armas, tanques e
leopards, armamento, tecnologia de guerra… e dizem que apoiam a Ucrânia até ao
fim.
Promessa perigosa.
O que é esse fim? Como
se define esse fim? Significa o quê? recrutar “carne para canhão” nos países
europeus?
Alguém está disponível
para mandar os filhos para a guerra da Ucrânia? Ir até ao fim, nunca ceder,
nunca desistir é um orgulho idiota que passará pelo que referi, fornecer
exércitos feitos de jovens, os nossos jovens.
Nós, portugueses, não
estaremos fartos de guerra? Tivemos uma guerra colonial com 3 grandes frentes
africanas, que afectou directamente toda a população portuguesa. Isto foi há 50
anos – perguntem aos vossos pais e avós para saberem como foi.
O serviço militar era
obrigatório e os jovens quando chegavam aos 20 anos, lá iam eles, quisessem ou
não. Sabiam como iam, mas não sabiam como regressariam. Os que voltavam, poderiam
voltar dentro de uma urna, numa cadeira de rodas, sem uma perna, ou voltavam,
afectados psicologicamente para a vida toda. Nunca voltavam os mesmos, voltavam
silenciosos, demasiado silenciosos e maduros. É isto o que querem? Querem
despedir-se dos vossos filhos para sempre? Lembrem-se da descolonização,
criticada por muitos, pouco entendida por outros, e lembrem-se que os nossos
mancebos não queriam ir para a guerra, porque numa guerra há uma grande
probabilidade de morrer.
Lembro os murais no ano
de 1974 onde constava, NEM MAIS UM SOLDADO PARA A GUINÉ! que expressava o
protesto contra essa guerra, o desagrado e a recusa em “alimentá-la”. Esta
frase significa tanto… quem se lembra dela?
Para ganhar poupando
vidas é preciso saber perder, despir orgulhos, acreditar na diplomacia que nem
sempre estará alinhada pela justiça. Por vezes ser humilhado pode salvar vidas,
para viver em paz e combater a falência humana.
Quando tomarem posição sobre
esta ou outra guerra, interroguem-se sempre: “Se for o meu filho a ir para a
guerra, mantenho a minha retórica? “
Pensem que aos almoços
de Domingo serão menos à mesa. Sobrarão pratos e cadeiras. Já não existem
aerogramas, nem correio, porém, na guerra não existe rede para telemóvel.
Quando estiverem a fritar batatas, equacionarão, para quê, para quem, se ele(a)
não está cá?! e então irão ver o álbum de fotografias de quando ele(a) era
pequeno(a) com muita frequência, e mesmo sendo ateus, rezarão orações
inventadas para ele(a) voltar rápido e pelo próprio pé. Viverão muitas horas em
silêncio, de olhos fechados a recordar momentos e quando estiverem no meio de
uma multidão, sentir-se-ão incrivelmente sós.
Iniciar-se-á um ciclo de alerta, passarão a ter sono leve e de poucas
horas, sempre preocupados com o telemóvel que poderá tocar.
Nesta guerra e em todas
as guerras é preciso repensar tudo. Os heróis só servem para fazer estátuas e
os cemitérios estão cheios deles.
Publicado em NVR 22/02/2023
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