24 dezembro, 2021
FELIZ NATAL
A neve é algodão, ´presépio só na
igreja de S. Paulo, Pai Natal fica na esquina da Travassos, à sombra, a soar
por baixo do fato quente e das barbas postiças, o sinaleiro vai bracejando para
o transito fluir na rotunda da Alameda D. João II, debaixo do sol tórrido de dezembro, as rabanadas quanto mais
fresquinhas melhor, dizem os mais velhos, eu nem gosto das fatias de pão que me cheiram a canela,
aroma que decide habitar o meu cabelo, estragando o cheiro de shampoo Sunsilk e
sabonete Lux na pele, o sabonete das 9 em cada 10 estrelas. A mãe na cozinha
pedindo ajuda, a salsa não chega -filha vai no Lugar comprar. Acabaram os ovos
e ainda vou fazer o bolo de bolacha que tanto gostas, vai na mercearia do sr
Manuel, e agora vai no Correio falta
enviar dois postais de Natal para a Metrópole e telegrama para avó.
O pai na varanda ajeitando cadeiras,
a petiscar ginguba e caju, a beber cola com rum e muito gelo e limão, e eu
resmungando, pela mãe não se lembrar de todos os esquecimentos de uma só vez.
Quero ir na praia de S. Jorge na Ilha, meus amigos me esperam lá, para fazer
shap shap, boiar no colchão, comprar baleizão, xingar todo o mundo e suspirar,
usando olhar de ver ao longe, para te ver de bermudas verde sporting. E eu aqui
nos mandiletes da mãe de dia de consoada, na avenida do bairro da CAOP.
Pópilas!!!
(Escrevendo à canhota)
22 dezembro, 2021
O NATAL
NATAL
O que posso dizer sobre o
Natal que já não foi dito?
Na
minha família, temos a sorte de fazermos vários Natais ao longo do ano, por
isso conheço o verdadeiro significado do Natal, porque é tão assumido e tão
entranhado em nós, que nos impele a fazê-lo várias vezes ao longo do ano. Temos
necessidade da presença de uns e de outros numa bolha de cumplicidade, amor
fraternal, vivências e grande amizade.
As pessoas vão faltando nos lugares à mesa, porque
partiram, mas não gostariam de ver os seus lugares vazios, o seu espaço sem
ninguém, ou então, cada um ficar na sua casa a curtir a tristeza da perda. É um
dos avós, depois a avó que se vestia de preto, o tio mais velho, a prima que
partiu antes do tempo... depois são os nossos pais que deixam os lugares
vazios. Passamos a ser nós a comprar o bolo-rei e a fazer as rabanadas,
recorrendo ao livro de receitas da mãe, procurando desesperadamente pelos
mesmos sabores. Quando o espaço fica vazio, afastamo-nos um pouco à mesa para
isso nunca se notar, o espaço dos pratos fica maior, os guardanapos e os
talheres ficam a uma maior distância. Por vezes entra um convidado ou nasce
gente nova, o que amplia o brilho da mesa.
Todos
somos cúmplices do disfarce da ausência, por vezes regista-se um silêncio, um
olhar que passa para lá do tempo... O Natal é a festa dos vivos e da esperança,
portanto é aos que estão cá, a quem nos devemos dedicar. Lembro um Natal
especialmente difícil, porque um lugar ficou vazio a menos de 20 dias do Natal
e este fez-se na mesma, menos exuberante, mas fez-se.
Os
nossos pais que tiveram também os seus vazios e também procuraram o livro de
receitas da avó. Nunca deixaram de festejar o Natal passando a dedicá-lo aos
filhos. Nós.
Normalmente
na noite da consoada ou no dia de Natal, vão desfilando na minha mente,
momentos felizes somados ao longo de muitos anos e são esses que pretendo
conservar sempre na minha memória:
-
Os natais passados numa aldeia transmontana, quando era criança, em que a minha
ambição era chegar à corda do sino da igreja, para poder tocar depois das 12h
do dia 24 e recolher musgo para construir o presépio na sala lá de casa. As
minhas irmãs mais velhas não me deixavam tocar nas bolas da árvore de Natal,
porque eram muito bem guardadas durante o ano. Eram de vidro e tão frágeis que
bastava um toquezinho e desfaziam-se em mil pedacinhos. Jogava ao rapa e aos
pinhões com os meus primos e íamos ver a grande fogueira de Natal. Os pequenos
presentes apareciam no dia seguinte, no forno do fogão de lenha que, entretanto,
ainda ninguém tinha utilizado e atribuía-se a surpresa ao Menino Jesus. O Pai
Natal era figura ignorada. Os presentes eram simples e só para as crianças.
-
Os natais tropicais, vividos a sul, eu já na puberdade e adolescência, num
ambiente urbano, com concursos de montras, iluminações de Natal, lojas abertas
até às 23 horas e um calor de arrasar. A praia e os passeios nocturnos com
roupa bem decotada e as hormonas aos saltos, faziam parte. As frituras da cultura
gastronómica portuguesa, aguardavam para esfriarem e serem servidas com o
camarão fresquérrimo e as bebidas geladérrimas. A mesa era decorada com mangas,
caju, abacaxi, mamão e bananas
-
Os natais do nosso retorno. Todos juntos de novo, mas sempre recortados em
alguma nostalgia que ninguém ousava verbalizar, um vazio diferente, mas de
carência semelhante. Voltou a fogueira e eu já podia beber um pouco de vinho
fino com o bolo-rei que a minha mãe confeccionava com mestria e sabor
delicioso.
-
E o Natal do ano passado em circunstâncias COVID, com ceia a dois e o resto do
Natal vivido na única pessoa, a ler, ver filmes sobre o Natal, a comer Ferreros
e Raffaellos, a reflectir sobre o que, na verdade, interessa na vida, o que
falhou na minha e os grandes sucessos que já vivi. Pensei obviamente naqueles amigos
zangados com o Natal, que sempre o passam sozinhos por opção, vestindo o pijama
dia 24 às 18h, desligam os telefone e telemóvel e reaparecem no dia 26,
fingindo-se bem-dispostos, com as lágrimas embrulhadas em lenços de papel, guardados
discretamente no bolso do pijama.
Quando
atingi a maior idade, decidi que eu construiria os presentes de Natal oferecendo-os
a pessoas que considero muito especiais. Entre ir às compras e limitar-me a
comprar aquilo que outro imaginou, e fazer prevalecer peças feitas com a minha
imaginação, decidi por mim. O Natal passou a ter ainda mais significado. Demora
mais tempo, dá mais trabalho, porém, enquanto trabalho penso na pessoa a quem
se destina, fazendo um refresh da nossa relação, lembrando quando essa
pessoa entrou na minha vida, o que vivemos juntas, as nossas lutas e as nossas
diversões. Foram as casinhas de barro, os crochets minúsculos, os desenhos, as
pinturas, os bordados e atualmente os poemas e os vidros.
Que
dia é hoje?... Já só faltam dois dias e
eu tenho tanto para fazer!
Feliz
Natal.
Publicado em NVR 22/12/2021
19 dezembro, 2021
17 dezembro, 2021
15 dezembro, 2021
BRASEIRA, MESA E CAMILHA
BRASEIRA, MESA E CAMILHA
É
aborrecido o Inverno ter vagas de frio, chuva, gelo, neve... se assim não fosse,
o Inverno até seria suportável. Seria evitável sentirmos frio, ter frieiras e
toda a panóplia de constipações, gripes e pneumonias, daí resultantes. Poderia
estar frio só na rua dos meus vizinhos, nevar apenas na televisão, gelo só no
frigorífico e granizar na preparação de bebidas, para ouvirmos o shlop, shlop, das
pedras de gelo a bater no shaker e a chuva poderia cair entre as duas às seis
da manhã. Chegaria muito bem.
Qual
é o encanto da neve, se lhe tocamos e até os ossos doem?
Fazíamos
de conta que seria apenas metade do ano, com outras paisagens, árvores sem
folhas, o sol um pouco lixiviado e aguardaríamos que o tempo o passasse no seu
ritmo normal ente os equinócios, sem estarmos sempre com saudades da Primavera
e do Verão.
Lembro-me
quando havia carvoarias em Vila Real. Acho que havia várias. No final da tarde,
nas ruas com pouco movimento, viam-se pessoas a fazer a braseira para depois a transportar
para dentro de casa, elevando um pouco a temperatura dos lares.
Os
recipientes circulares, uns de chapa, latão e outros em cobre, acolhiam os carvões
que depois se incendiavam para entrar em atividade calorifica, cercados com um
círculo de cinza e com uma prata (resto de uma tablete de chocolate) que protegia
o cento da braseira para aguentar as brasas acesas, várias horas.
Era
obrigatório ter um estrado de madeira que permitia suspender uns centímetros a
dita braseira, para evitar o contacto com o pavimento e simultaneamente criar
uma plataforma de madeira hexagonal, para os friorentos apoiarem os seus pés
calçados com grossas meias de lã para se aquecerem na beirinha da braseira.
No
final do dia era vulgar ver vários fuminhos a elevarem-se entre o casario, resultando
da queima do carvão.
Mais
tarde apareceu a mesa redonda com estrado inferior, que permitia o uso de uma
grande toalha denominada camilha, de origem espanhola, inicialmente comprada
nas fronteiras com nuestros hermanos, com dimensão adequada a cobrir
toda a mesa e descer até ao chão, contendo o calor daquela pequena fonte
calorífera. Quando essa mesa apareceu, era um luxo, lembro-me que talvez a meio
da década de 60 e comprava-se numa loja no largo de S. Pedro. As mesas eram
baratas, feitas em pinho mal acabadas, porque o que interessava era a estrutura
para cobrir com a tal camilha.
A
família utilizava-a para fazer as refeições e para continuar o serão até irem para
a cama, acompanhadas por uma botija de barro ou metálica, cheia de água muito
quente, ou aparelho de aquecimento artesanal para meter entre os lençóis.
Eram
estas trivialidades que nos confortavam há uns anos. O maldito do Inverno, do
granizo, do gelo e da neve não tinham grandes opositores. Aquecimento central?
Quem tinha? Pouquíssimos. Ar condicionado? Caldeiras e recuperadores de calor? Eheheh eram pura
ficção científica. As casas das aldeias tinham sítio nas cozinhas para fazer
fogueira ou grandes lareiras que tornavam a vida mais confortável. Na cidade
era a braseirita. Os compartimentos, quanto mais pequenos, melhor – menos ar e menos
paredes para aquecer.
Maldito
inverno!
O
aparecimento da braseira eléctrica e da escalfeta já foi uma grande inovação
tecnológica, mas as facturinhas da electricidade ao fim do mês, escaldavam.
Um
dos primeiros projetos de arquitectura que fiz para Vila Real, já no final dos
anos oitenta, o meu cliente, um engenheiro, pediu para eu projectar uma saleta
secundária, onde iriam passar o Inverno com mesa redonda e braseira. Em 1987 na
Escola Diogo Cão era este sistema utilizado na sala de professores, acrescido
de um vidro redondo pousado sobre a camilha, para os professores poderem
escrever e para melhor se higienizar aquela superfície.
Porque
é que o Grande Arquitecto projectou isto tão mal? A vida por semestres de
Primavera e Verão seria muito mais fácil e divertida. Poderíamos atingir o
dobro da nossa idade, mas as rugas avançariam num ritmo mais alongado e todos
os dias acordaríamos cheios de energia, sem pensarmos em luvas, casacos,
ceroulas, cachecóis e gorros. Não gastaríamos tanta energia, as casas seriam
mais confortáveis e arejadas, os dióspiros poderiam ser substituídos por
papaias e o chá, por refrescos. Haveria menos roupas nos roupeiros, diríamos
adeus às botas, às pantufas, mantas, mantinhas e cobertores. As festas
religiosas e pagãs poderiam comemorar-se na mesma, apenas com retoques de
calendário... Neste fim de semana teria ido até à praia recolher um bronze
brutal e na festa do Natal poderia recorrer a um leque e adoptar a modalidade
de piquenique.
Uns
sonharão em sentido contrário. Não faz mal.
Publicado em NVR 15/12/2021
08 dezembro, 2021
Arte do Natal
Coordenando os duendes no Pólo Norte. Não há matrizes - pura criatividade e muitos anos sem ver telenovela, ignorando limites, com a arte nas mãos... sem graças a Deus, Deus te abençoe, tenha fé que melhores dias virão, seu anjo da guarda lhe protegerá e outros clichês e mimimis absolutamente out.
RED
RED
and RED
05 dezembro, 2021
COLISEU ROMA 2018
Isolei-me, para enquadrar o espaço na História... a emoção das bancadas perante o sangue e a morte. Senti-me deprimida e incapaz de estar atenta aos pormenores arquitectónicos que são muitos e eu tinha listado anteriormente para observação presencial. Não voltarei.
02 dezembro, 2021
O comercial
Os imprevistos da vida levou-nos a jantar ao Comercial, no Porto.
Azul, o glamour e a óptima companhia. Falamos bem e mal sobre tudo e todos. Gargalhadas foram bastantes e quase encerramos o sítio. Tchim, tchim, caríssimos.
Voltaremos brevemente.
01 dezembro, 2021
GEOMETRIK XXI - vídeo promocional
VÍDEO PROMOCIONAL
Faltam profs
Faltam profs
Com
a democratização do ensino em 1974, o regresso das ex-colónias e o progressivo
aumento da escolaridade obrigatória foram necessários mais docentes. Um
imprevisto criado com a Revolução obrigou a aplicar estratégias de recurso.
Entraram para a profissão pessoas com o antigo 7º ano, ou com frequência na
faculdade, ou outras instituições que forneciam formação científica mínima e
passaram a ser identificados como os professores com habilitação suficiente.
Conheço casos caricatos com formação em contabilidade que foram dar português,
e conheço casos provenientes da Alliance Française colocados a dar ciências.
Injectaram-lhes alguma formação e cada um desenrascou-se como pode. Tudo se
tolerou, porque aquele foi um momento excepcional na vida dos portugueses.
Horários em mini-concurso eram abundantes e já me estou a localizar na década
de 80, quando entrei no sistema como licenciada e com habilitação própria de
grau superior. Passou a existir a profissionalização em exercício e em serviço
– 2 anos com cadeiras pedagógicas a sério, para enriquecer as licenciaturas na
vertente pedagógica.
Os
ministros sucederam-se, inventaram-se as Escolas Superiores de Educação e a Formação
Continua. Ah, inventaram Bolonha, os
mestrados e as respectivas teses de final de curso que continuam a dissecar
todos os temas educativos... reinventam-se teorias e estratégias, porque é
chato fazer uma tese e não inventar nada, nem que seja mais do mesmo – método
científico com roupagens segundo a moda da estação do ano. Inventaram-se as
licenciaturas “a martelo” para os professores do 1º ciclo e educadores,
inventaram-se professores polivalentes do 1º e 2º ciclos, minimizaram a duração
dos estágios pedagógicos, aumentou-se a escolaridade obrigatória até ao
secundário, inventou-se o ensino profissional, os Erasmus e agora a
inteligência emocional e a filosofia ubuntu. Inventaram-se objectivos,
descritores, competências, aprendizagens, rubricas, multiplicaram-se grelhas e
reuniões de planificação, articulação, supervisão, inspecção, monitorização e
avaliação. Dos vivos, inventaram-se o João de Deus Pinheiro, o Roberto
Carneiro, a Carmo Seabra, a Maria de Lurdes, a Isabel Alçada, depois o Crato e
agora Tiago Brandão, que se encarregaram ao longo destes anos, em massacrar a
paciência e a sapiência dos docentes até à exaustão, com práticas e supostas
pedagogias nem sempre assertivas, desgastantes, matando progressivamente o
ensino público e privilegiando o ensino privado. Marçal Grilo e David Justino que
também tiveram as suas contradições, agora são comentadores, e após tanta complicação,
até parecem anjinhos.
Já
sou do tempo do Souto Mayor Cardia e já vi tudo, rapidamente tiro-lhes o azimute.
Entre um ministro e outro, não se segue um plano educativo a longo prazo,
existem sim, “golpes de estado” sucessivos, seguidos de pequenas revoluções
vertidas na Escola, como se diariamente se descobrissem novas maneiras de ensinar
conhecimento duradouro e rápido. Nunca se conclui a avaliação destas
experiências pedagógicas. E quem paga tudo isto? Os docentes que integrados no
Sistema, são obrigados a acolher e pôr em prática todos estes desvarios, com a
maior paciência, pensando sempre nos seus alunos. Amou-se a Educação, as Áreas
de Projecto eram as pérolas dessa paixão que rapidamente se extinguiu. Novas
teorias, novos artifícios têm apenas a mira da economia e não a pedagogia, acreditando
sempre que os profs são uns tótós e não entendem estas manobras. Considero até
um insulto à clarividência desta classe, a classe profissional mais bem
informada de um país.
Renovou-se
o Parque Escolar gastando-se fortunas, sem critério e com diversas derrapagens
financeiras, enquanto muitas escolas lutavam para lhes colocarem aquecimento,
ou taparem as infiltrações das coberturas, ou retirarem urgentemente o fibrocimento.
Inventou-se trabalho para dar aos profs, na componente não letiva, para justificar
que esta seria uma profissão igual às outras, porque muitos funcionários públicos
se indignavam com os “calaceiros” dos profs que só tinham 22 horas de aulas, e
muitas férias, esquecendo-se de que os profs, antes e depois das aulas, têm
todos os dias trabalho de casa. Não descansaram enquanto não tentaram tornar
igual, o que é desigual.
Inventaram-se
os magalhães... nem comento!
Os
pais descobriram que os filhos estando na escola o dia todo, lhes facilita a
vida, porque o mundo laboral, quanto mais informatizado, mais exigente se torna
e nunca mais se reduzem os horários de trabalho, nesta euforia neo-liberal. Os
profs e assistentes operacionais passaram a ter muitas valências para tentar
ocupar o “buraco” familiar – fazem de animadores culturais, enfermeiros,
conselheiros, assistentes sociais, psicólogos, tutores, vigilantes, amigos,
parentes e até dão colinho.
Inventou-se
a avaliação na folha de excell e desaprendeu-se sobre a avaliação continua,
progressiva e sistemática, apesar de estar na lei, já ninguém sabe o que
significa. Os pais avançaram para dentro da Escola, eliminaram-se as gestões
democráticas e inventaram-se os diretores e para economizar dinheiro, começou a
dar-se destaque à articulação vertical, para melhor entrar a “bucha” dos
agrupamentos – monstros despersonalizados em estado calamitoso.
Há
muitos anos, qualquer aluno avaliado entre 0 a 20, percebia que se tivesse 9
poderia chumbar. Assim, teria que se aplicar mais. Agora a folha de excell deve
ter diversos registos, que numa escala de 0 a 100, depois de muito ponderado e evidenciado, resulta na avaliação do aluno, imediatamente
acompanhada de planos de recuperação, tutorias, consulta no psicólogo, caso
haja insucesso.
Ando
nisto há 40 anos e dói-me a paciência. Estamos a formar indivíduos
superprotegidos – não se pode usar tesoura de bicos, não se pode fazer
picotagem, não se pode falar na fogueira da Santa Inquisição, não se pode falar
da guerra colonial. Obviamente não temos censura, mas não podemos assustar as
criancinhas, nem traumatizá-las, porém, em casa podem jogar vídeo-jogos cheios
de violência. As suas vidas devem ser completamente kleens, sem recusas,
sem contrariedades, sem risco, sem frustrações, sem doença, sem morte e sem
desejos. Estamos a criar gerações de jovens amorfos e desumanizados, que só
querem estar metidos no quarto conectados com o jogo da moda e gritando por
vezes, “Roubaram os nossos sonhos”.
Os
profs tentam contrariar esta tendência, mas já estão cansados, com tanto
trabalho inócuo e solicitações diárias para tudo e coisa nenhuma.
Actualmente
as instituições e empresas descobrem a Escola como filão publicitário,
promovendo concursos, webinares, conferências, seminários e workshops, que
contribuem bastante para o estado de saturação dos docentes. Estes, coitados,
tiveram apenas duas vezes a sua profissão dignificada (gostem ou não, foi
assim) – a primeira com Vasco Gonçalves que atualizou salários e com Guterres
que transbordava amor, mas sempre um amor empedernido e canastrão. A opinião pública,
manifesta-se contra toda uma classe, como se esta fosse responsável pelo
Sistema e, porque às vezes têm a ousadia de lutar pelos seus direitos fazendo
greve, com os sindicatos à frente e sempre zurzindo se as greves são à sexta-feira
ou à segunda, manifestando uma grande iliteracia laboral, quando defendem que
deveriam ser avisados ou, porque é uma pouca-vergonha uma classe de “milionários”,
“incompetentes” e “calaceiros” lutarem por direitos. Comparar salários com o
resto dos países europeus, não lhes interessa, queimar pestanas, também não e
educar os filhos em casa para que usufruam de todo o conhecimento que a Escola
lhes pode proporcionar, também dá muito trabalho.
Faltam
profs... atirem a vossa revolta contra a Maria de Lurdes, o Crato e o Tiago
Brandão. Acham que alguém no seu juízo perfeito, vai querer desempenhar uma
profissão nómada, mal paga e sem subsídio de risco (em qualquer momento podem
levar um bufardo de um aluno ou dos pais), que é maltratada pela sociedade e
pelos petizes que ouvem em casa, “o teu professor é um baldas”?
Faltam
professores? Que novidade! Tanto racionalizaram e tanto apertaram o cinto...
Porque, na verdade, quem manda na Educação é o Ministro das Finanças. Os
últimos ministros esquecem-se, ou julgam-se esquecidos por nós que já estamos
fartinhos desta comédia? E alguém acredita que alguns profs voltam ao Sistema? Aguardam-se
futuros romances melodramáticos sobre a conclusão da municipalização e a
contratação de profs por escola.
Publicado em NVR 01/11/2021