ESPLANADA, nome feminino
1. Terreno descoberto. 2. Planura, planície. 3. Chapada. 4.
[Fortificação] Terreno plano, largo e
descoberto, na frente de fortificações ou de um edifício. 5. Lugar ao ar
livre com mesas e cadeiras onde se come ou se tomam bebidas, refrigerantes,
café, etc.
Consultei o dicionário e
seleccionei o 5.
O que nos diz a História sobre
esplanadas? Estar na esplanada parece ser hábito recente, com menos de 100
anos. Antes, os cafés e restaurantes dispunham apenas do seu espaço limitado,
definido no seu interior; espaço fechado, pouco arejado por vezes, protegido do
sol, da chuva, do vento e do arejamento, onde a iluminação artificial reinava,
assim como o frúfrú dos cetins, tafetás e organzas das toilettes das
senhoras, cujos odores se misturavam numa orgia sem fim, entre o mofo, o
perfume, a nafetalina, a gordura da cozinha, o tabaco, o café, o sabão e a cera.
Só após a 2ª Guerra Mundial e perante
os consumidores teimosos e desejosos de sol e de paz, é que os serviços de
restauração foram abandonando o conceito conservador e bafiento do espaço
fechado, mal arejado, tantas vezes o espelho do país politicamente fechado
e sombrio, como era o nosso - um país de grande território, mas fechado à
inovação e à autonomia, sombrio, porque triste, desconfiado e ”orgulhosamente
só”. Todos temos a memória dos pequenos tascos, que para além de fechados,
pequenos, sombrios também tresandavam a vinho, porém, onde era frequente
comer-se um escabeche delicioso. Os consumidores foram exigindo novos espaços
mais adaptados às estações do ano, beneficiando do clima maravilhoso que tem o
nosso país, permitindo mais de seis meses de temperatura agradável para
"esplanada" – algo mais assertivo com a cultura mediterrânica, que por
muitos anos esteve arrumada na gaveta. Aqui, o sol tisnava a pele dos
trabalhadores das encostas do Douro, nas grandes cidades europeias, usufruía-se
do sol em qualquer recanto. Pensando bem, o que faltava, na verdade, era tempo
de lazer e ultrapassar a barreira do recato. Esta forma de viver a vida, saindo
do interior de quatro paredes, foi retratada por vários pintores, em registos
famosos. Cadeiras fora do café em fila estreita, em passeio esguio já as havia
desde o século anterior, especialmente numa Lisboa envergonhada e amordaçada,
mas esplanadas é algo de coração maior, de espaço amplo de rua e múltiplo que
cabe, repartindo-se, em muitos sorrisos.
Um dia o país sombrio colapsou, os
retornados e refugiados invadiram-no desejando sol e replicar um pouco a
qualidade do lazer que traziam das colónias tropicais… e bem mais tarde,
surgem os turistas, muitos deles provenientes do norte da Europa, com sol
rafado todo o ano e muito disputado entre todos.
Esta liberdade de se estar,
olhar à volta sem barreiras, de namorar os recantos da cidade, de ver e ser
visto, de deixar a manhã espreguiçar-se no sabor de uma torrada, deixar a tarde
correr sem tempo, mergulhar na luz dourada dos finais do dia e transitar
para a noite tépida, até os amigos se lembrarem que têm que ir para
casa, é dar mais sentido à vida, e mais significado aos pequenos prazeres.
A pandemia retirou-nos esse prazer.
Nunca tínhamos percebido que sentar numa esplanada e soltar o olhar, enquanto
se tomava um café ou se saboreavam umas batatas fritas, que seria um prazer tão
grande. Só agora percebemos este pequeno grande prazer que fazia parte das
nossas vidas. Teremos esse prazer de volta e deveremos cuidar-nos para que
permaneça.
Não me interessa se ainda corre um
arzinho fresco, se tenho ou não um guarda-sol a proteger-me, vou sentar-me nas
esplanadas que frequentava e todas as outras que irei conhecer, vou semicerrar
o olhar e tentarei confessar-lhes o meu amor.
3 comentários:
Excelente texto, mais uma vez!
Cada vez mais gosto de esplanadas, agora é que lhes damos valor!
Excelente texto, mais uma vez!
Cada vez mais gosto de esplanadas, agora é que lhes damos valor!
Excelente texto, mais uma vez!
Cada vez mais gosto de esplanadas, agora é que lhes damos valor!
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