29 fevereiro, 2024
28 fevereiro, 2024
ANITA E O ANO BISSEXTO
Anita e o ano
bissexto
Estamos em ano
bissexto. Este mês tem 29 dias, mais um para trabalhar.
O ano bissexto serve
com frequência para fazer humor, porque quem nasce neste dia, só terá o seu verdadeiro
aniversário a cada 4 anos, o que fica económico para a família e amigos, e é
decepcionante para o aniversariante, que só recebe presentes de 4 em 4 anos.
Depois de certa idade, quando o cabelo grisalha, uns já têm bigode chinês, pés
de galinha e código de barras, todos gostaríamos de ter nascido no 29 de Fevereiro,
porque nos daria a certeza legítima, comprovada pelo CC, que não envelhecemos tão
rápido.
A contagem do tempo é
uma necessidade, para cada um de nós e para a sociedade, porém, é uma
necessidade unívoca, o tempo está-se a marimbar para nós, nunca para e é-lhe
indiferente a contagem e os anos bissextos.
O GRANDE ARQUITECTO deveria
estar naqueles dias do tanto faz, cansado de criar tanta coisa, concebeu o
tempo sem fornecer manual de instruções, e depois esticou-se no sofá celestial
a apontar o dedo para o infinito, pose parecida com a retratada por Miguel
Ângelo.
Os anjinhos papudos
questionaram-no:
- G. A. o tempo está
criado, desde que foi criado o universo e agora? Como se organiza algo
invisível e tão volátil?
- Tudo eu?! Tudo eu?!
Bastou-me criá-lo, agora entendam-se, deixo ao critério dos humanos. Sou
atemporal, não me vou ralar com isso, agora vou descansar, pois já terminei o
meu acto de Criação. Quem se sentir incomodado que o organize.
-
Então como se vai desenhar a barra cronológica da vida do Homem? Como saberemos
se os relógios da vida batem certo? Onde colocaremos a Revolução Francesa, o
nascimento do Messias ou o Homem do Neolítico? Os Humanos vão baralhar tudo,
solicitamos pelo menos um desenho IKEA (Ignorância Kombatida com Esquema da
Aprendizagem).
- Problema vosso…fui!
Para Adão e Eva, foi simples,
houve apenas 2 tempos: Antes da maçâ e depois da maçã – um sistema binário do
tempo.
Depois, foi correr
atrás de soluções. Sumérios, Egípcios, Chineses, Maias, Judeus, Muçulmanos e Romanos,
todos eles tentaram resolver o problema porque muitos chegavam tarde ao
trabalho, a idade dos filhos era pouco rigorosa, gerando problemas para saber
quanto deveriam entrar para os infantários, o tempo de festejar os equinócios
batia sempre errado, e até era complicado agendar os dias certos para começar e
terminar as guerras. Uma chatice! ainda não havia net e todos desconheciam que todos
andavam à procura do mesmo: a organização do tempo. Fizeram-se milhares de
contas, teses de mestrado, doutoramentos, ajudados pelos ciclos da noite e do
dia, da luz solar e da vela e sempre referenciados pela Lua, que também parecia
brincar com eles, ora gorda, ora magra, ora invisível.
Nós, neste lado do
mundo, levámos com o calendário inventado pelos Romanos; não foi fácil, depois
de milhares de contas, sobravam sempre 6 horas em cada ano, para grande
frustração destes. Copiavam anfiteatros gregos, inventavam coliseus, pontes e
aquedutos, mas eram incapazes de resolver o calendário, devido a umas míseras 6
horas. Repetiram-se contas, e as 6 horas continuavam, e não dava jeito nenhum criar
um dia com apenas seis horas, porque isso significaria baralhar o Sol e a Lua, o
sono das crianças e os horários dos hipermercados.
O Calendário criado em
Roma no século VI foi aprovado 10 séculos depois – não nos podemos queixar da
demora da aprovação do local do novo aeroporto de Lisboa. Levaram 10 séculos
para resolver as 6 horas a mais.
No século XVI, o Papa
Gregório XIII (Ugo Boncompagni), conhecido como bom mediador de conflitos, deu
um murro na mesa e disse:
- Alto e para o baile,
vamos resolver definitivamente o problema das 6 horas, já estou farto disto!
Reuniram-se os
especialistas mais descomplicados da cabeça e nasceu finalmente o primeiro “Compendium”,
contendo a proposta dos anos bissextos, que constava na ideia simples de juntar
as 6 horas acumuladas em 4 anos, ao fim de 4 anos, adicionando mais um dia no
calendário, resultando nesta conta dificílima, 6 horas x 4 anos = 24 horas – enigma resolvido
que passou a denominar-se por Calendário Gregoriano, hoje utilizado em quase
todo o mundo.
Para os que ainda não
entenderam como saber se o ano é bissexto, façam a seguinte divisão: escrevam o
ano como dividendo, as 6 horas no divisor, os 4 anos no quociente, e depois é
fazer as contas, se der resto zero, significa que é ano bissexto, se não der,
não é:
- Não percebeste as
contas? Estudásses!
Publicado em NVR, 28|02|2024
24 fevereiro, 2024
22 fevereiro, 2024
21 fevereiro, 2024
SINTA COMO É GRANDE O UNIVERSO
Estávamos a tentar resolver o problema de umas canalizações cá em casa. O meu interlocutor é um homem que vai resolvendo problemas destes a quem eu vou solicitando sempre que a máquina de habitar resolve avariar sem aviso prévio. Conhecemo-nos há alguns anos e vamos conversando durante o trabalho. Por vezes rimos, de situações caricatas ou porque eu mando umas broeiradas no ramo das canalizações, propositadamente, para aligeirar trabalhos complexos e nem sempre bem cheirosos.
Ele
sabe de todas as fofocas da Bila, conhece meio-mundo e uma parte do outro e
acho-lhe piada, porque a conversa flui fácil e quase sempre bem-humorada, mas hoje
o diálogo foi ensombrado por uma nuvem cinzenta.
- Oh
sra. arquitecta, como é ter a sua idade?
- É
mau e bom, todos os dias dói alguma coisa, mas desvalorizo muitas situações,
penso sempre que depois da tempestade virá a bonança e rejeito tudo o que me
aborrece para depois tentar ser feliz todos os dias. Seria melhor voltar a ter
20 anos e saber o que sei hoje, para não cometer erros que cometi e não gastar
tempo com pessoas que o não mereciam… mesmo assim, é melhor chegar à minha
idade do que ficar pelo caminho. Chama-se a isto experiência de vida.
-
Tenho andado tão cismático, sou mais novo que a sra. arquitecta, mas os
cinquenta anos põem-me velho e isso não me sai da cabeça.
Fiquei
surpreendida, pareceu-me que o optimismo deste colaborador cedeu à depressão.
Ele não estava bem. Precisava de conversar.
- Até
andei na net e percebi que a maioria dos suicídios dos homens são na minha
idade.
Fiquei
cada vez mais preocupada e fui perguntando, se tinha algum problema de saúde,
financeiro ou familiar.
- Vivo
bem com a minha filha e tudo está bem com ela, mas ando com uns pensamentos sombrios.
Tentei
conversar aligeirando o seu desconforto, com aquela racionalidade que nos podem
recolocar no alinhamento da vida e com uma pitada de humor.
- É
religioso?
-
Quase nada?
- Se
acredita em Deus e na vida após a morte, tem imensa sorte, porque se pode
projectar em 2 vidas, e sabe que a outra lá estará à sua espera, portanto não é
necessário ter pressa, quanto mais tarde melhor, vamos ganhando experiência
nesta.
- E não
acreditando?
- Se
não acredita, então só tem esta vida para viver, e é melhor não a desperdiçar,
porque depois da morte nada existe, é o vazio. A vida é feita de coisas boas e
más, ignore as más, viva cada momento, como se fosse único, e tente aproveitá-lo
o melhor possível. Não desperdice tempo com pessoas que não merecem, e pense
que vivemos, com ou sem companhia, num sítio espectacular. Sabe-se lá se o Céu da
religião tem só nuvens e nuvens, sempre de dia ou sempre de noite? Como
cheirará por lá? Pelo menos aqui temos variedade de sítios e de gentes, o que é
desafiador, portanto é melhor aproveitar o sol, a chuva, o frio. Se tem um
desgosto de amor, aprenda a dar valor a si mesmo. Nós somos sempre a nossa
melhor companhia. Todos nós temos a mania de colocar sempre os outros em
primeiro lugar, mas tudo tem limites. Nós nascemos sós e morreremos sós, no
intervalo da vida também devemos aprender a gostar de nós e pensarmos muitas
vezes em nós, em primeiro lugar. E não é pecado, nem censurável. Se não
estivermos bem connosco, não poderemos estar bem com os outros. Aprecie a vida,
faça aquilo que gosta, ofereça um bom presente a si mesmo. Se tiver dinheiro,
facilita. Olhe à sua volta, veja como o mundo é grande, e nós estamos aqui
metidos numa cozinha a limpar um sifão, como se o mundo fosse este lava-loiças.
- A
sra. arquitecta fala bem e com razão, por vezes nem sabemos porque andamos
chateados.
-
Falar com alguém é sempre bom. Viver é tão bonito, vou recomendar-lhe uma
coisa, sempre que possa vá assistir ao maior espectáculo do mundo.
- Como assim? Onde?
- Vá assistir ao pôr-do-sol. Escolha um bom sítio virado para o Marão ou no curso do rio Douro. É diferente todos os dias, sinta como é grande o Universo e tem oportunidade de assistir a toda essa grandeza, gratuitamente. Drama, drama é estar doente, ou ir comprar covilhetes quentinhos e já não haver, ou um dia o Sol cansar-se e desaparecer pelo tubo da canalização, o resto, é o resto.
- Eheheh a sra. arquitecta tem cada uma!14 fevereiro, 2024
Partilhando Pessoa
Partilhando Pessoa
Escrevi o meu texto
desta semana e perdi-o nas gravações apressadas e ensonadas, no final de uma
noite a chocar a gripe. Pastas e arquivos revirados, não o encontrei. Texto dedicado
às matrafonas do Carnaval, que encantam todos os que pretendem valorizar as
tradições do Carnaval das gentes de Portugal, tentando contrariar escolas de
samba e afins, que surgem muito ridículos no nosso território, de clima frio e quase
900 anos de História e Tradição, que se amplia para além da nacionalidade.
Não há nada que chegue
a um careto e uma boa matrafona, de mamas grandes, maquilhagem exagerada que
contrasta com barbas e bigodes, permitindo aos homens inverter a sua
personalidade durante o Carnaval, expressa através da “feminilidade” de umas
pernas musculosas a usar meias de vidro pretas, com costura perna abaixo,
rematando com uns sapatos ou sandálias maiores do que o número 42, onde lhe
caibam os pés.
Tive preguiça em
reescrever e regressei às minhas leituras.
Decidi partilhar Pessoa, num poema
que refere uma máscara, a sua, sobre a antiga e sempre atual questão «Quem sou
eu?», tão familiar a este poeta:
“Aquela
falsa e triste semelhança
Entre quem
julgo ser e quem eu sou.
Sou a
máscara que volve a ser criança,
Mas
reconheço, adulto, aonde estou,
Isto não é o
Carnaval, nem eu.
Tenho
vontade de dormir, e ando.
Ironia e
metafísica se misturam, num outro poema de Campos:
Estou morto,
de tédio também
Eu bato, a
rir, com a cabeça nos astros
Como se
desse com ela num arco de brincadeira
Estendido,
no carnaval, de um lado ao outro do corredor,
Irei vestido
de astros; com o sol por chapéu de coco
No grande
Carnaval do espaço entre Deus e a vida.”
E adiciono
mais este dedicado à vida:
“A vida é
uma tremenda bebedeira.
Eu nunca
tiro dela outra impressão.
Passo nas
ruas, tenho a sensação
De um
carnaval cheio de cor e poeira…”
07 fevereiro, 2024
Viver melhor depois dos 60, significa trabalhar?
Viver melhor depois dos 60, significa trabalhar?
Não consigo ficar passiva perante
aqueles que defendem que se deve adiar a idade da aposentação, porque a
esperança de vida aumentou, e é preciso conferir qualidade de vida aos mais
velhos através do trabalho.
Apresentam-se argumentos financeiros
disfarçados e algumas ratices para ver se a coisa pega. Apela-se à vida
saudável, à mão-de-obra experiente e especializada, ao saber desperdiçado, às
aspirações e à realização pessoal /profissional depois dos 60, desenvolvendo o
conceito de que trabalhar dá saúde e faz crescer.
Penso que querem fazer de nós totós!
Querem fazer crer à malta que os aposentados ficam sentados numa cadeira
pasmados para o infinito, e isso deve-se a não terem trabalho, horários,
responsabilidades e a não darem o corpinho ao mundo laboral.
Tadinhos dos velhinhos que não lhe
permitem uma realização profissional após os 60 anos! Durante mais 40 anos de
trabalho, não se realizaram, mas depois dos 60…
Este discurso altamente tendencioso e
demagógico é vergonhoso e ofensivo. Estes peritos em envelhecimento, não se
preocupam com os problemas dos trabalhadores na vida activa – se são bem
remunerados, horário semanal respeitado, estabilidade no emprego, competição saudável,
salários pagos a tempo e horas, gratificações, progressões nas carreiras, pausas,
respeito pelas mulheres grávidas, formação e outros assuntos do mundo laboral
pouco focados e respeitados, mas depois dos 60, os indivíduos no trabalho, estariam
em condições para lhe comerem a pele, a chicha e os ossos. Haja vergonha!
Na idade da aposentação, em Portugal
tardia, as pessoas querem descansar, não ter grandes responsabilidades, não ter
horários para cumprir, fazer o que lhes apetece e ter uma aposentação que lhes
permita ter uma final de vida despreocupado e de qualidade.
Esperança de vida maior não significa
que o ser humano deixou de ter problemas de saúde. A maioria, a partir dos 60,
tem problemas físicos e aqueles que tiveram uma vida profissional activa, mesmo
activa e desgastante, chega aos 60, arrasada. Sabemos que os idosos não são
todos iguais, por isso a generalização é perigosa.
Quem lava escadas durante 40 anos,
quer continuar a trabalhar?
Os trabalhadores da saúde, a fazer
horários irregulares, a tratar sempre de doentes, com grandes níveis de stress,
querem continuar?
Os policias com a vida em risco
diário, querem continuar?
Os professores que tentam educar os
filhos dos outros durante 40 anos, de mala às costas numa parte da sua
carreira, sendo alvo frequente de má educação por parte de alunos, querem
continuar a trabalhar?
Os empregados de café, cozinheiros,
todo o dia em pé, os primeiros a aturar as esquisitices dos clientes e os segundos
todos os dias a cheirar a alho, óleo fula e a estrugido, querem continuar?
Os agricultores, sempre dependentes
do tempo e dos agentes atmosféricos, todos os dias a cavar a terra, querem?
Os lixeiros, os advogados, os
militares, os operários, os arquitectos, os pescadores, os motoristas…
independentemente da profissão, há um desgaste progressivo e saturação, incompatível
com as condições físicas que se vão degradando.
Morremos mais tarde, mas morremos
doentes. A medicina, felizmente, evoluiu, mas a carcaça é a mesma, ou seja,
agora é possível estar doente mais tempo.
Curiosamente, os que defendem o
trabalho para os idosos, são pessoas com vida activa muito passiva, passam pelo
mundo do trabalho de forma confortável e pouco stressante. Ir trabalhar é como
ir tomar café, nem se questionam se os jovens precisam entrar mais cedo no
mundo do trabalho e auto-avaliam-se por excesso, sobrevalorizando o seu saber e
a sua experiência, não percebendo, por vezes, que o tempo deles já passou e que
estão desactualizados a fazer figurinhas deprimentes. Há algo denominado
voluntariado, para onde podem ir dar o litro, porém, não queiram arrastar os
outros para este caminho.
Sobre aposentação considero 3
questões:
- Os 60 anos deveriam ser a idade
limite ou 35 anos de descontos;
- É urgente criar a longo prazo um
plano sério de sustentabilidade do sistema que contrarie aposentações tardias;
- É fundamental apoiar a 3.ª idade ao
nível do conforto e da tranquilidade – contrariar e condenar todo o tipo de
violência contra idosos, criar lares com boas condições e acessíveis para
todos, assistência médica gratuita, apoio domiciliário, formação, criar
oportunidades para viajar, conviver e, obviamente, para quem quer trabalhar
mais, poder fazê-lo desde que isso não crie vícios no mundo laboral,
nomeadamente reduzindo oportunidades de trabalho para os mais jovens. O
voluntariado referido atrás também é um cenário possível, mas perigoso dentro
de certas circunstâncias, quando se transforma em mão-de-obra gratuita.
Vivemos uma sociedade com exigências
crescentes sobre os indivíduos. Descansar passou a ser considerado um obstáculo
ao sucesso. Os momentos de lazer entram nessa lógica: existe uma pressão para
se diminuir o máximo possível do tempo livre em todas as idades e a aposentação
é algo que complica esta lógica sombria do que é viver, desumanizando-nos.
É urgente democratizar o ócio. Isto
já era tema nas sociedades gregas e romanas antigas. Para Platão e Aristóteles,
“o ócio era visto como condição necessária para que alguns, designadamente os
filósofos, pudessem, livremente, dedicar-se à procura da verdade, encarada,
essa, sim, como “prática” autenticamente nobre.” O ócio não pode ser associado ao tédio, à malandrice, à
depressão, à inutilidade e ao vazio. Penso que não há registo de que o ócio
tivesse sido causa de eventual exaustão e, por esse motivo, dando origem a
qualquer tipo de síndrome de Burnout!
Deixem viver os idosos como querem,
sem pressão, sem compromissos e sobretudo abram-lhes portas para novos voos,
novas oportunidades, novos saberes, para o mundo da criatividade, sem
interferir no mundo do trabalho e facilitem a convivência com a família e com
os amigos, de forma DIGNA e HUMANA.
Os idosos são mais frágeis, mas não
são tolos! E se eles quiserem ser pasmados e inactivos, têm o direito de o ser.
Respeitem a sua liberdade e conforto!
Publicado em NVR 07|02|2024