Estou em espera no aeroporto de Lisboa, vinda não interessa de onde e vou para o Porto. É inquietante pensar,
que antes do 25 de abril, eu teria que usar passaporte, a Pide já me teria
revistado, teria que mostrar autorização do marido ou do pai para viajar. Como
não tinha, já teria ficado retida para interrogatório. Neste aeroporto se quisesse comer, teria q me
dirigir a um único restaurante que servia ovos mexidos e caros. As hospedeiras
eram lindas e não podiam casar, porque eram elementos de instabilidade
familiar. Os wcs eram reduzidos, porque reduzido era também o número de
passageiros, os autoclismos ainda tinham uma corrente para puxar. Os aviões em
vez de se chamarem Nadir Afonso ou Amália, chamavam-se Sra da Conceição ou
Divino Espírito Santo. Nesse tempo eu teria pelo menos, 4 primos com 21 anos,
na guerra colonial, com metralhadora às costas a matar pessoas indefesas, em
territórios desconhecidos. Cuspia-se no chão, fumava-se muito e as periscas
deitavam-se no chão. Não havia liberdade de expressão, cada um comia e calava.
Alguém conhecia alguém preso por pensar diferente. Humberto Delgado, nome de
figura ilustre atribuído ao aeroporto, não se podia sequer evocar. Não havia
Coca-Cola, livros e músicas eram censurados ou proibidos. Havia crianças
descalças e esfomeadas, na rua. Era hábito, os homens baterem nas mulheres e o
analfabetismo era um sucesso. Hospitais, poucos, enfermeiras também não podiam
casar, SNS eram apenas 3 letras maiúsculas, divórcios nada, filhos ilegítimos
muitos, habitação pouca e fraca. Monopólios vários, corrupção disfarçada em
negócios para o desenvolvimento do país. Euros não existiam. Tinhamos uma moeda
própria, o escudo, que valia pouco, e nem sequer era a mesma, das colónias. Nas
aldeias, uma sardinha dava pelo menos para duas pessoas. Rezava-se pelo Salazar
como se fosse o único esclarecido do mundo. Ai dormir com o namorado!!... Nem
pensar! As mulheres só depois de 70 é que começaram a usar calças. As grandes diversões eram o cinema, teatro,
censurados, as festas populares, o futebol, o fado do aleijadinho e viajava-se
até a praia mais próxima, por causa do iodo, com pouca pele visivel. Muitos,
nem férias tinham!
A maioria das aldeias não tinha
água, nem electricidade e muito menos esgotos.
Telemóvel e internet? Esqueçam!
Algumas pessoas tinham aquele telefone arcaico de números às rodelas.
Eleições eram de partido único,
para não haver confusões. Nem pio! Caso contrário, teria dois senhores de
chapéu a perseguirem-me.
Mal por mal, melhor assim como
estamos em 2023.
Abril fez a diferença. Sociedades
perfeitas não existem, mas ainda ninguém inventou nada melhor do que a
democracia.
Facebook 25 | 04 |2023
Sem comentários:
Enviar um comentário