Era uma vez uma
aldeia
Era uma vez uma aldeia
de um Reino, em que os professores eram muito invejados, por serem funcionários
públicos, mas aos olhos dos aldeões, os mestres do saber tinham muitos
privilégios – 3 meses de férias, ganhavam muito sem serem avaliados, faziam
pontes, podiam faltar 2x por mês, e ainda o pior é que se aposentavam antes dos
outros, aposentavam-se entre os 55 e os 58 anos – era preciso limar-lhes as
arestas!
Sabiam ensinar? Alguns
diziam que sim, outros que não, mas para serem professores tinham 5 anos de
estudo na universidade ou semelhante e 2 anos de profissionalização, que
equivalia quase a uma pós-graduação e em outras aldeias equivalia a um
mestrado.
Mas sabe-se lá, só
trabalhavam 22 horas por semana!!! Diziam trabalhar em casa, mas ninguém estava
lá para ver! Por vezes tinham pena deles, por andarem todos os anos com a mala
e os filhos às costas, porque não tinham nem escola, nem residência fixa.
Nessa aldeia a inveja e
a ignorância conduzia facilmente a opinião dos aldeões, que achavam ser
necessário evitar que os professores se convertessem em madraços.
Até que um dia um dos Reis começou a
querer agradar aos aldeões das várias aldeias e percebeu que se seguisse a
linha de pensamento contra esta classe privilegiada, ficava bem visto e ainda
arrecadava uns dinheiritos para os cofres reais.
Os Reis foram
inventando medidas – obrigaram a 36h de trabalho, congelaram salários, roubaram
tempo de serviço, inventaram avaliações que travassem a evolução na carreira, e
para que eles se desentendessem entre eles, criaram muitos papéis inúteis para
preencher e reduzir-lhes as férias escandalosas e… tomem lá, só se aposentam
quando os outros se aposentarem – 66 anos e mais uns meses! Os professores
sempre tolerantes carregaram uma carga crescente, colocando sempre o interesse
dos alunos em primeiro lugar, chegando até ao ponto de alterar o ensino
presencial para o ensino à distância, em poucos dias, gastando a sua internet
e utilizando o seu computador pessoal, e ainda de serviço 24h por dia.
Os problemas foram-se
acumulando, os Reis conseguiram escondê-los por algum tempo (12 ou 15 anos),
sustentando a situação, com outros professores deslocados por doença ou apoio a
familiares, que iam servindo de muleta e aliviando a carga destes professores
cada vez mais velhos e desgastados.
Até que um belo dia o Rei
ainda quis apertar mais os parafusos do poder. E para provar que afinal não
havia falta de professores e tudo estava muito bem na escola, alterou leis e
carregou de novo nos horários dos professores mais velhos, porém, retirou-lhes
a muleta. Esqueceu-se de que muitos têm mais de 60 anos. Esqueceu-se das
artroses, dos esgotamentos, dos problemas da voz, das hérnias, das falhas de
memória, da paciência esgotada, dos cancros, das consequências das menopausas
(a maioria são mulheres), e das múltiplas maleitas que surgem na 3ª
idade,… e então percebeu que? …. que? os
professores mais velhos não aguentavam a dar aulas a turmas grandes e que os
seus médicos lhes passavam baixa médica.
Os aldeões começaram a
ficar inquietos. O Bardo já pouco tocava, o peixeiro escamava o peixe
violentamente, espalhando escama para todo o lado.
- Então quando os Reis
juntaram as escolas de várias aldeias, não era para tudo ficar melhor?
O Rei voltou a fazer
contas de cabeça e nunca lhe dava a prova de noves de fora, nada…
- Oh Gervásio,
afinal em muitas aldeias não há professores madraços daqueles que andam sempre
com o computador às costas e usam o telemóvel na sala de aula. Parece que são
mais novos e pagam-lhes o triplo da jorna lá nas empresas da capital do Reino.
O problema são os velhos que não querem trabalhar, mas querem ganhar muito
dinheiro. Diabo os leve! Dizem que estão doentes, com 60 anos! e que parecem os
avós ou bisavós dos alunos.
- Oh e para que os
nossos gaiatos precisam da tal da informática? Para nada! Desde que tenham
dinheiro no banco!..., aprender a levantar dinheiro na caixota? basta ter um
cartão e saber contar até 10. E o resto aprendem no Facebook do telemóvel.
O Druída ouvia estas
conversas de raspa-socos e suspirava, Ai meu Deus, vou mazé aos míscaros e
às urtigas, porque brevemente vou precisar da poção mágica para juntar ao caril
e às chamuças.
O Rei despiu o seu ar
fanfarrão e começou a sentir o aroma de peixe podre. Colocou o lápis na orelha
e fez contas de novo, telefonou ao Rei anterior para tirar satisfações, afinal
faltavam ou não faltavam professores?! ….
- Quem fez as contas foste
tu, porque eu tinha mais o que fazer!
Entretanto, os aldeões
souberam através do bardo, que iriam receber 125€ cada um, em Outubro, o que
sossegou as hostes. O Bardo era solteiro e sem filhos iria derreter os 125€ em
bejecas e ameijoas vietnamitas!
- Bem, 125€ sempre
dá para pagar a explicação ao nosso rapaz, nos primeiros dias, causo o madraço
do professor resolva juntar as férias, ao feriado do 5 de Outubro. _ disse o ferreiro à mulher.
O que, na verdade,
irritava o Rei daquele Reino é que os badamecos dos madraços, não faziam greve,
nem nada, para o ajudar a tirar o ranço do problema.
- Ó Victória, não
acabou a história!
Publicado em NVR 14/09/2022
2 comentários:
Continuo a gostar da’stória.
Espero os novos desenvolvimentos
Temos que deixar acontecer a realidade.
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