14 abril, 2021

ESCOLA DA BANDIDAGEM

ESCOLA DA BANDIDAGEM 

 “Falta de coerência”, “especulação” e “fantasia” foi assim que tudo terminou numa sexta-feira, perante uma justiça quântica (1), yeah.
    Às vezes dá vontade de enveredar pela brilhante carreira de bandido. 
    Penso imensas vezes nisso, em vez de andar a ensinar aos meus alunos como ser um cidadão activo, honesto, interveniente e sempre com uma postura de respeito pelo outro, deveria ensinar como viver à custa dos outros, como desenvolver a retórica e como passar entre os imensos e estranhos fios condutores que existem no mundo da justiça, para gamar e não ser condenado. 
     Fazer-lhes ver que podemos sempre contar com um amigo rico que nos pode sustentar e bem, e que se estudarmos muito, podemos ainda melhorar o nosso conhecimento sobre bandidagem. 
    Ensinar-lhes a verdadeira História que interessa, queimando as pestanas a partir do Barrabás símbolo do mal, adoptado no cristianismo, Al Capone, D. Corleone, Bonnie and Clyde, Ma Barker, Carlos o Chacal, Alves dos Reis e todos os mais famosos que se seguem… não faltam exemplos de sucesso. 
     Ensinar-lhe a diferença entre furto, roubo, assalto, desvio de capitais, corrupção, para que eles percebam de uma vez por todas, que é demasiado arriscado furtar um chocolate no Lidl; quando se “retira”, deve ser à grande, após estudar bem os caminhos da justiça. 
    Os alunos devem perceber muito bem o que é o crime de colarinho branco, se possível fazer trabalhos de pesquisa, usando aquelas metodologias pedagógicas que reforçam a aprendizagem e o conhecimento, para a “coisa” entrar na cabeça e permanecer ao longo da vida – ou seja, o método cientifico ao serviço da vilanagem.  
    Os futuros vilões devem perceber que se podem especializar, a um nível superior… nem sempre pegar no revólver e sacar guito no comboio, roubar o telemóvel dos incautos ou pegar de esticão a bolsa da velhinha, são as melhores opções, isso é como roubar o pirolito do colega, no tempo em que ainda usava calções! Pegar numa pá e abrir um túnel até à Caixa Forte do Tio Patinhas, só mesmo os Irmãos Metralhas nas histórias de quadradinhos, porque a malta fica a suar, cheia de pó, chateia-se, respira mal, fica com falta de ar, lesiona a coluna vertebral e no final tem que se ir para a fisioterapia… Por isso há aquela palavra, “ESTUDASSES”, quando é evidente a ingenuidade transformada em má opção. É preciso estudar muito e pôr os neurónios a trabalhar – para escrever sobre isto, também tive que fazer a minha pesquisa rudimentar, porque nem sabia quem eram os maiores, os mais famosos, e quem foi preso mais vezes, já que não aprendi nada disso, na escola tradicional.
     Agora não se veste fato de macaco para abrir túneis, agora veste-se Armani, Valentino, Gucci, Dior, Versage, Prada… marcas que não se vendem na feira de Lordelo, e sim na loja mais cara do mundo, na Bijan que fica em Rodeo Drive, Beverly Hills e onde se poderá cruzar com algumas figuras mediáticas. 
     Sejam ambiciosos, meus alunos!
     Há todo um aprendizado bem estruturado e holístico a realizar na escola, urgentemente, capaz de dar luz às gerações do futuro. Desenganem-se é preciso estudar línguas, matemática, física, filosofia, TIC, desenho… para de facto entender, ingressar e estabelecer-se com sucesso no mundo da vilania. Quem não o fizer, fica pelos chocolates do Lidl, ou outros pequenos furtos que podem dar pena grave e pesada. Sem estudo nunca poderá ser um bom traficante, e nunca retirará a fisga do bolso das calças. 
     Não vale a pena arriscar acto pequeno e ridiculo de subtrair aos outros. 
     Aquela ilusão romântica de roubar aos ricos para dar aos pobres, está absolutamente ultrapassada! Roubar aos pobres, de forma camuflada, para viver à rica, isto sim, isto deve ser o foco das aprendizagens, do desenvolvimento de competèncias, na verdadeira Escola da Bandidagem do século XXI. Seguir modelos do Robin dos Bosques ou do Zé do Telhado isso é leiturinha infantil, joguinho para os que estão ainda a iniciar a sua alfabetização, ou seja, as criancinhas do pré-escolar. 
     É urgente substituir os cenários de aprendizagem bonzinhos por cenários da canalhice real, que existem na sociedade, e são muitos, para que os futuros bandidos não se queixem que lhes foi imposto na Escola um saber demasiado académico. É preciso pensar, criar estratégias de burla para depois, aprender a sacar, desviar, lavar, branquear, abusar da confiança, falsificar e dominar os media – estas são as literacias do gamanço sofisticado, que todos os meliantes devem ter e desenvolver. 
     Atenção aos prazos, para quem se desagrada pelos números. Fazer pisca e conseguir ultrapassar os prazos pela direita, é uma manobra fantástica. 
     Preparem-se, porque também é preciso dominar alguns truques de magia – como transformar crimes em erros judiciais, corruptos em mártires, fraude fiscal em contabilidade organizada, empréstimo em saldo positivo, e uma prova em não prova – mas isso a justiça portuguesa dá uma ajudinha.

 “Eles comem tudo, eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada” (Zeca Afonso) 
                    ou 
É sexta-feira | Suei a semana inteira | No bolso não trago um tostão | Alguém me arranje emprego | Bom Bom Bom Bom!”(Boss AC)

Publicado em NVR em 14/04/2021
(1) Ricardo Araújo Pereira.

1 comentário:

vitor r. disse...

Muito bom.