Christos Sandalakis
Hoje
vou falar-vos de uma publicidade que passa na televisão sobre uma operadora de
telecomunicações.
Fiquei
absolutamente emocionada ao ver um invisual a descer uma montanha pedalando
numa bicicleta. Tive curiosidade e fui investigar sobre aquele atleta. Descobri
ser um atleta grego, para-olímpico, Christos Sandalakis. Nasceu com uma doença
rara e perdeu 99% da visão e como é um lutador e um entusiasta, converteu-se
num atleta de paraciclismo em pista.
O
seu último desafio foi descer uma montanha, sozinho, pedalando uma bicicleta,
orientado pelo seu parceiro desportivo e piloto, Sotiris, utilizando a tecnologia
5G, em tempo real.
Chamo
a isto um exercício de segurança e de confiança. Nunca a expressão “confiança
cega” fez tanto sentido. Christos Sandalakis, cego, confia completamente no
seu companheiro Sotiris que vê… é que se algo falha, é tombo pela certa a alta
velocidade, podendo ser mortal. Quem confiaria assim em alguém?
O
companheiro desportivo assume a função de orientador com a maior segurança do
mundo, consciente da grande responsabilidade que isso implica; tem a vida do
companheiro nas mãos, outra expressão que faz aqui todo o sentido.
Com
uma câmara de vídeo do telemóvel aplicada no seu capacete, com ligação áudio e
vídeo através da tecnologia 5G ao seu parceiro, que consegue ver a estrada no
centro de controlo instalado numa carrinha e emite instruções claras e
rigorosas, como se pensasse alto e estivesse a pedalar.
vai,vai,
vai, trava, trava, trava, curva para a esquerda, vai, vai
Christos
sendo o receptor, converte as instruções na sua condução, em equilíbrio e em
velocidade. Parece fácil, mas não é, a tecnologia torna possível o quase impossível,
mesmo assim envolve um grande risco. A falha de um segundo pode correr mal para
o atleta. Inicialmente pensei que se tratava de um evento virtual, mas estava
enganada. O percurso tem pendente acentuada, onde a força de gravidade acelera
a bicicleta, e possui curvas todas diferentes umas das outras, onde o ciclista
tem que contar com a sua postura para contrariar a força centrífuga. Apesar de ser
uma leiga no assunto, foi isto que li nas imagens que já correram o mundo.
A
deficiência visual é algo que me sensibiliza imenso e foi muito bom ver o rosto
do jovem a cruzar a chegada, o sorriso de felicidade vitoriosa que testemunha
muitos anos de treino e a confiança plena nos olhos, no raciocícnio, nos
reflexos e nas palavras do seu companheiro. A principal dificuldade de um
invisual é exactamente a locomoção em autonomia.
Às
vezes, experimento aqui em casa, caminhar às escuras ou de olhos fechados e
consigo perceber como é difícil o equilíbrio, a orientação, a noção das
distâncias entre aquilo que nos rodeia, o conhecimento do piso onde caminhamos,
e o efeito do som que passa a ter outro timbre. Quem nunca o fez experimente
durante trinta minutos. O tacto passa a ter outro valor e dimensão no meio da
escuridão da nossa visão, permitindo detectar obstáculos e evitá-los. Gerir
toda esta informação sem o auxílio da visão é um cocktail emocional e racional,
que neste caso é bem-sucedido graças ao empenho e a muitas horas de treino
desta dupla de atletas, que merece a nossa atenção e interesse, porque novos
desafios se seguirão.
“A sensação
era indescritível quando cheguei sozinho à linha de chegada! Percebi que o que
passei não foi só a finalização, mas o início de um amanhã cheio de novas
possibilidades ”, disse
animado o atleta Christos Sandalakis, após a conclusão do percurso (Janeiro de
2021).
Publicado em NVR 28/04/2021
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