28 abril, 2021

CHRISTOS SANDALAKIS

 


Christos Sandalakis

 

            Hoje vou falar-vos de uma publicidade que passa na televisão sobre uma operadora de telecomunicações.

            Fiquei absolutamente emocionada ao ver um invisual a descer uma montanha pedalando numa bicicleta. Tive curiosidade e fui investigar sobre aquele atleta. Descobri ser um atleta grego, para-olímpico, Christos Sandalakis. Nasceu com uma doença rara e perdeu 99% da visão e como é um lutador e um entusiasta, converteu-se num atleta de paraciclismo em pista.

            O seu último desafio foi descer uma montanha, sozinho, pedalando uma bicicleta, orientado pelo seu parceiro desportivo e piloto, Sotiris, utilizando a tecnologia 5G, em tempo real.

            Chamo a isto um exercício de segurança e de confiança. Nunca a expressão “confiança cega” fez tanto sentido. Christos Sandalakis, cego, confia completamente no seu companheiro Sotiris que vê… é que se algo falha, é tombo pela certa a alta velocidade, podendo ser mortal. Quem confiaria assim em alguém?

            O companheiro desportivo assume a função de orientador com a maior segurança do mundo, consciente da grande responsabilidade que isso implica; tem a vida do companheiro nas mãos, outra expressão que faz aqui todo o sentido.

            Com uma câmara de vídeo do telemóvel aplicada no seu capacete, com ligação áudio e vídeo através da tecnologia 5G ao seu parceiro, que consegue ver a estrada no centro de controlo instalado numa carrinha e emite instruções claras e rigorosas, como se pensasse alto e estivesse a pedalar.

            vai,vai, vai, trava, trava, trava, curva para a esquerda, vai, vai

            Christos sendo o receptor, converte as instruções na sua condução, em equilíbrio e em velocidade. Parece fácil, mas não é, a tecnologia torna possível o quase impossível, mesmo assim envolve um grande risco. A falha de um segundo pode correr mal para o atleta. Inicialmente pensei que se tratava de um evento virtual, mas estava enganada. O percurso tem pendente acentuada, onde a força de gravidade acelera a bicicleta, e possui curvas todas diferentes umas das outras, onde o ciclista tem que contar com a sua postura para contrariar a força centrífuga. Apesar de ser uma leiga no assunto, foi isto que li nas imagens que já correram o mundo.

            A deficiência visual é algo que me sensibiliza imenso e foi muito bom ver o rosto do jovem a cruzar a chegada, o sorriso de felicidade vitoriosa que testemunha muitos anos de treino e a confiança plena nos olhos, no raciocícnio, nos reflexos e nas palavras do seu companheiro. A principal dificuldade de um invisual é exactamente a locomoção em autonomia.

            Às vezes, experimento aqui em casa, caminhar às escuras ou de olhos fechados e consigo perceber como é difícil o equilíbrio, a orientação, a noção das distâncias entre aquilo que nos rodeia, o conhecimento do piso onde caminhamos, e o efeito do som que passa a ter outro timbre. Quem nunca o fez experimente durante trinta minutos. O tacto passa a ter outro valor e dimensão no meio da escuridão da nossa visão, permitindo detectar obstáculos e evitá-los. Gerir toda esta informação sem o auxílio da visão é um cocktail emocional e racional, que neste caso é bem-sucedido graças ao empenho e a muitas horas de treino desta dupla de atletas, que merece a nossa atenção e interesse, porque novos desafios se seguirão.  

            “A sensação era indescritível quando cheguei sozinho à linha de chegada! Percebi que o que passei não foi só a finalização, mas o início de um amanhã cheio de novas possibilidades ”, disse animado o atleta Christos Sandalakis, após a conclusão do percurso (Janeiro de 2021).

Publicado em NVR 28/04/2021

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