Anita brinca aos aeroportos
Anita gosta de criar os meus próprios jogos, daqueles que se lançam dados e se avança de casinha em casinha, denominados jogos de percurso, jogo cobra ou mesmo jogo de dados. Gosta de um em especial, denominado “À procura do aeroporto”, que cria um desafio constante aos jogadores, que se vão revezando e substituindo.
O percurso tem a casa da partida na data de 1969 e não tem fim. Anita adiciona uma casa por ano para o jogo estar sempre atualizado. Fazendo contas, tem 53 casas, e a “cobra” já está de bom tamanho, já não cabe em mesa de centro da sala de estar, necessitando de mesa de maior dimensão.
Há as casas normais e
as especiais. As normais são aquelas em que não se passa nada, e as especiais
são as que nada se passa, excepto estudos, projectos e promessas de mais
estudos e mais projectos. O estímulo é conseguir encaixar num território tão
pequeno, tantas ideias para a localização de um aeroporto.
Os jogadores em vez de
ganharem pontos consoante avançam no jogo, é ao contrário, vão perdendo pontos,
porque se os dados os remetem para as casas especiais, tem o azar de pagar
projectos e estudos complexos. Os jogadores partem com mil pontos cada, e ganha
aquele que chega ao fim com menos pontos perdidos.
As casas especiais
designam-se por Rio Frio, Alcochete, Ota, Montijo, Portela, Sintra, Beja, Figo,
Maduro, Santarém, Margem Sul… Quem estaciona nessas casas tem que justificar
porque ali é um mau sítio para o aeroporto, mas mesmo assim, perde pontos para
pagar os estudos e projetos. Se não souber justificar porque é um mau sítio,
fica lá no “choco e pronto”, não sai de lá, mas pode argumentar contra os
outros jogadores. Não joga, mas desabafa, como se fosse ao psicólogo.
Se calha na casa
“Margem Sul Jamais” volta à casa da partida, mas não lhe adicionam mais pontos.
Este é um jogo de
elevado risco, porque tem algumas saídas falsas, com casas que dizem, Porto,
Coimbra, Faro e Viseu e penalizam os jogadores, obrigando-os a recuar casas.
Tem ainda uma casa jóquer, dourada, que diz: eu sou um ponto equidistante de
todas as capitais de distrito. Nesta casa, o jogador duplica a sua
pontuação. E tem um lembrete que serve para reflectir: “El debate sobre las
razones que llevaron al rey a trasladar de forma permanente su corte a Madrid
ha llenado muchas páginas. Uno de los motivos más evidentes es la centralidad
geográfica de Madrid respecto el resto de la península.(1561)”
Este jogo da Anita é
activado na noite de S. Martinho, vivida em família, para preencher as horas de
ruminação da castanha, evitando que jovens e menos jovens, adormeçam e façam
más digestões. Abrem-se inscrições e começam a jogar. Os mais novos são mais
entusiastas, os elementos mais velhos, cedem o lugar aos mais novos, pois já
sabem como tudo isto termina, todos falidos, menos um, que também não chega em
bom estado ao final do jogo, porque teve que esgotar todo o seu argumentário.
Todos discutem e o que vale, é um favaios, uma jeropiga, uma água-pé ou um
vinho fino para entorpecer os sentidos.
Este ano a Anita já
está a desenhar uma nova casa especial, e prometeu que será a última…, talvez
mais complexa, com tantos pontos fracos como todas as outras, mas a
última. Já disseram à Anita:
- Para lá com isso, já
ninguém quer jogar esse jogo. Ou tu estendes o percurso para fora de Portugal,
ou então já perdeu interesse. Está a ficar claustrofóbico e ultrapassado. Pensa
mazé numa plataforma espacial numa zona entre Cáceres e Castelo Branco, para
ser a casa BigBang!
Publicado em NVRem 05/10/2022
Imagem - recriação
https://www.fnac.pt/Anita-de-Aviao-Gilbert-Delahaye/a527959
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