3 dias e 3 meses
De 13 a 16 de março, a Escola Portuguesa,
conseguiu mudar completamente de registo, passando da Escola que muitos ainda classificavam
como tradicional, para a Escola do século XXI.
Deu-se uma revolução em 3 dias à custa,
por incrível que pareça, daqueles que andam há anos a reclamar o tempo de
serviço a que têm direito, os professores, e que maioritariamente possui mais
de 50 anos, a quem não foi fornecida formação adequada.
Em 3 dias, os professores com o seu espírito
resiliente e capacidade de se adaptar a novos contextos, pensaram apenas nos
seus alunos, disponibilizando equipamentos, a internet pessoal e o conhecimento,
adquirido muitas vezes nas horas que não têm, para se dedicar à investigação, para
se manterem atualizados e se auto-formarem, movidos apenas pela sua missão, muito
digna, de ensinar. Em 3 dias os professores criaram uma rede de interajuda
entre todos, que lhes permitiram estar sempre presentes, junto dos seus alunos,
atenuando inseguranças, isolamento, medos e os desvios consequentes. E o
Ministério da Educação fez um brilharete, mais uma vez à custa do esforço e da
bolsa dos professores mal remunerados, com imagem “encardida” por sucessivas
lutas que os têm trazido a terreiro. Os professores são a classe profissional que
melhor entende o proverbio, “quem não tem cão, caça com o gato”. No seu
exercício profissional, sempre tem um plano B, para quando algo falha na sala
de aula (o projector, a internet, falta de material, os dramas de cada aluno,
…) porque têm à sua frente 30 alunos que confiam em si e esperam o melhor dele.
É importante que se sublinhe quem suportou a revolução digital e a mudança
de paradigma tão apregoada por Tiago Rodrigues, foram os professores.
Decorreram 3 meses e a opinião pública assume-se
com imensas contradições, sobre este assunto.
A sociedade surpreendeu-se com o
desempenho dos professores no ensino à distância, capazes de dar continuidade à
aprendizagem, sem paragens. Então, começou a crítica do excesso – os
professores martirizavam os alunos com excesso de tarefas, diziam os pais. Os
pais e o resto da sociedade não perceberam que, de facto, os alunos, passam
muito tempo na escola, e o tempo ocupado em casa com tarefas escolares, terá
sido apenas 50% do tempo da carga horária normal. Este, sim, deveria ser tema para
reflexão e para mudança no Ministério da Educação.
Houve pais que acompanharam a
aprendizagem dos filhos, outros estabeleceram regras para que tudo funcionasse
bem, outros realizaram tarefas pelos filhos, como se o professor fosse muito
burro, e houve aqueles que desvalorizaram a acção da Escola, expondo críticas constantes,
na presença dos seus filhos, desmotivando a sua participação e aprendizagem,
através das novas tecnologias. Não
perceberam que a maioria dos professores deu todo o tempo que tinha e o que não
tinha, para estar sempre conectada e disponível para apoiar os seus alunos. Não
perceberam também, que na mudança de suportes na aprendizagem, o que muda são
os suportes e não as pessoas envolvidas, mas podem acentuar a fragilização dos
mais vulneráveis. Percebeu-se que afinal a Escola que
temos, não é a Escola do século XIX. As mudanças de 3 dias significam que as
novas tecnologias são já prática rotineira na escola e passarão a ser efectivas
na ligação entre a Escola e a família, goste-se ou não.
O professor é insubstituível. O
professor tem o papel de facilitador da aprendizagem, e a sua interacção
presencial com os seus alunos, é essencial, especialmente para os alunos mais
novos. Sabendo-se que o Ensino à Distância pode tornar-se numa opção muito mais
económica, irá potenciar uma solução mista para os próximos anos, com ou sem
COVID.
O mau professor, continuará a ser mau,
professor, o mau aluno ficará pior, e os pais não cúmplices com a aprendizagem,
continuarão não cúmplices e bloqueadores. E os bons, continuarão a ser bons, os
preocupados e empenhados, também. As
fragilidades surgirão, não por culpa da Escola, mas pelas assimetrias sociais
que aqui se desnudam e distanciam, ainda mais, a Escola, daqueles que integram
as famílias socialmente desfavorecidas, em particular as famílias numerosos e
sem rendimento para investir em equipamentos e internet.
Aquela ideia optimista, “Não podemos
deixar ninguém para trás”, aqui não se aplica. Apesar de todo o empenho da Escola
e dos professores, o acesso à tecnologia, na sociedade portuguesa não é homogénea
e, por vezes, até ultrapassa a situação financeira das famílias. Refira-se a
questão territorial, o rural e o urbano em confronto através da rede de
telecomunicações, em desfavor obviamente, do primeiro.
Lamentavelmente, em tempo de guerra, há
sempre quem fique para trás. Pensemos que é melhor ficar para trás do que
perder a vida. Amanhã será um novo dia.
Publicado em NVR,
1/07/2020
1 comentário:
Grande verdade
J. A.
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