a coisa aqui está preta
Um caso, o Brasil.
Quando
era jovem achava que o Brasil seria o sítio ideal para eu viver, já que não
poderia viver na terra onde nasci. O Brasil parecia-me bem, pelo calor, pela
língua, pela gastronomia, por Jorge Amado, por Chico Buarque de Holanda, por Augusto
Boal, por Óscar Niemeyer, pelo movimento Tropicalismo, pela praia, pela fruta
tropical, pelo Carnaval, pela Amazónia, por Manaus, por Pélé, por Brasília,
pelo Rei, pelo samba, pelo forró, pelo chorinho, pelo artesanato, pelas
telenovelas, pela água de côco, pelas redes para dormir, por Juscelino Kubitschek,
pelas sandálias prateadas de salto alto, pelos batuques, pelas baianas, pelos
terreiros, pelo Zé Carioca, pelo sotaque doce, por Salvador da Baía, pela
simpatia de alguns malandros, pela garota de Ipanema, pelos candomblés, pelos
bolos de fubá, pela Gabriela, pelo Mundinho e pelo Tuísca, pela capoeira, pelo
Sr. do Bonfim, pelos discursos dirigidos ao povo de Sucupira… achava que o
“design” daquele país encaixava como um puzzle em Angola, o que reforçava a meu
favor a divisão da Pangeia.
…. E o meu pai, afirmava: Brasil nem pensar!
… dizia: O
Carnaval do Rio é o espectáculo mais perigoso do mundo, são assassinadas (não
sei quantas)??? pessoas por dia!
Mesmo
assim, achava que o meu pai tinha prazer em me contrariar.
Ao
Brasil só lhe encontrava um defeito: o mar ter nascer do sol e não ter pôr-do-sol,
pois um pôr-de-sol sobre o oceano é o melhor e maior espectáculo do mundo. Dura
poucos minutos, mas mesmo assim, é o top.
Percebi
quem era o tal Militar João Figueiredo, a ditadura, o tempo dos coronéis, os
jagunços, a violência gratuita, as clivagens e as desigualdades sociais, a
corrupção, os cartéis da droga, os índices de analfabetos, as favelas, a
desvalorização da vida, o desconforto das denúncias do PT, o desmatamento da
Amazónia, o Collor de Mello, o Michel Temer, os milhões de pobres…
…
encantei-me com a Rosa de Hiroshima de Ney
e dos seus Secos e Molhados, gargalhei com o Caco Antibes e Ribamar, trauteei
os Mamonas Assassinas, Gabriel o Pensador, admirei Lula e Dilma, surpreendi-me
com Millor Fernandes, descobri Augusto Cury e a “Saga de um pensador”.
Percebo
todos os dias a manipulação da opinião pública através dos media, vivo sempre
na dúvida e preocupada em separar a mentira da verdade, ou a quase verdade da
inverdade incompleta. Não é tarefa fácil.
Um
caso, o Brasil, com o melhor e com o pior – uma situação explosiva num país,
onde se jogam inúmeros interesses. Aparecem na TV comentários lúcidos,
esclarecedores e coerentes, outros que denunciam pouca cautela para com a
situação
“Aqui na
terra tão jogando futebol
Tem muito
samba, muito choro e rock'n'roll
Uns dias
chove, noutros dias bate o sol
Mas o que eu
quero é lhe dizer que a coisa aqui tá
preta
Muita mutreta
pra levar a situação
Que a gente
vai levando de teimoso e de pirraça
E a gente vai
tomando que também sem a cachaça
Ninguém
segura esse rojão (…)
(Meu caro
amigo – Chico Buarque)
Escrito às 21h de 6/04/2018, preocupada, aguardando
os acontecimentos.
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