O C-17
As
imagens transmitidas pela televisão e web são aterradoras.
A
fuga desesperada aos talibans que ocuparam pela força, Cabul, tiradas no
aeroporto chegam a ser surreais.
A
terra é deles, mas o terror gera solidariedade que deve falar todas as línguas
e ser transversal ao universo.
Apesar
de se apresentarem agora 20 anos depois, como mais moderados e respeitadores,
não queria estar na pele daquela gente, especialmente sendo mulher.
O
aeroporto abarrotava de gente e o que mais me impressionou, foi a invasão da
pista e as pessoas subirem para o avião ou agarrarem-se na parte exterior do
mesmo, em atitude de desespero, mesmo sabendo que do lado de fora do avião
ninguém iria conseguir sair dali. Chama-se a isto a fuga para a sobrevivência. Uns
caíram, outros foram atropelados e outros morreram. Alguns conseguiram levantar
voo e ainda sobrevoar Cabul e caíram. Outros ficaram esmagados na
descolagem.
A
imagem do interior do avião parecer ser fake, mas o drama persiste. 640 pessoas
a bordo deste avião preparado para uma lotação de 100 pessoas, e mais uns
milhares, retiradas noutros aviões nos dias seguintes. O C-17 foi uma amostra
para o mundo.
Neste
conflito, nunca sei qual é o lado da razão, nunca conheço todos os
antecedentes, nem as estratégias da política internacional. Sinto-me pequenina
e frequentemente manipulada, apesar do meu esforço de clarificar questões,
mediante este gigantesco tabuleiro de xadrez. São os americanos, é a Rússia,
são os mujahidins, é o Osama Bin Laden, é a Al-Qaeda, é a revolução
afegã... desconheço quem é a dama, o
rei, os cavalos, os bispos e as torres, porque umas vezes são uns, outras vezes
são outros, oscilam entre as pretas e as brancas e o tabuleiro quadriculado é
um espaço ilusório e disforme, cheio de buracos negros, armadilhas e
diplomacias internacionais trilhadas em caminhos miméticos e violentos. Cada um
tem o seu valor e o seu movimento, ora em ataque, ora em defesa...só reconheço os
miseráveis peões, as mulheres e as crianças, seres considerados menores e sem
direitos, que sofrem abusos constantes, sem poderem ter uma vida digna e livre,
ou melhor, se podem, na verdade, resistir e sobreviver – um drama humanitário.
Por vezes tudo parece tranquilo e equilibrado até que um xeque-mate surpreende
a nossa inércia boçal, sempre com a tradução em sofrimento dos peões.
Cada
vez mais gosto de viver onde vivo, onde tudo se poderá resumir, se a avenida
tem árvores ou não, se temos um rego com vaporzinhos e qual a sua função, para
que servem passeios tão largos na minha rua, onde não passa ninguém, as
reclamações do condutor do carro dos bombeiros contra a rua larga, de acesso
estreito, o muro do tribunal, o banco corrido que parece a espera da
“carreira”, a calçada à portuguesa que foi à vida...
Ufa,
gosto mesmo disto, desta paz tão pouco problemática e destes confrontinhos de
cacaracá, que não matam, nem ofendem ninguém.
Não
quero outra vida!!! Como sou feliz!
Publicado em NVR, 25/08/2021
1 comentário:
Muito bem, para já só temos pequenos problemas. Bj
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